Pitágoras (3)

Pitágoras (3)

“Tu trazes em ti mesmo um amigo sublime que não conheces. Pois Deus reside no interior de todo homem, mas poucos sabem encontrá-lo. O homem que faz sacrifício de seus desejos e de suas obras, ao Ser de onde procedem os princípios de todas as coisas e por quem o Universo foi formado, obtém a perfeição. Pois aquele que encontra em si mesmo sua felicidade, sua alegria e em si mesmo também sua luz, é alguém com Deus.”

BHAGAVAD-GITA

Pitágoras era um iniciado, portanto, o significado desses versos do livro sagrado dos hindus era-lhe familiar, já que a doutrina é a mesma em qualquer idioma.

Vários autores negam a existência do Mestre de Samos e a justificativa para isso está na ausência de documentação “apropriada” sobre ele. Ocorre o mesmo com Shakespeare...

Para outros, a “força mística do grande filósofo e reformador religioso vem influindo poderosamente o pensamento ocidental há 2.600 anos”. Já o minhocário sobre as idéias pitagóricas raia o precipício da escrutinaçaao sem fim. Descontando os que o negam e os que sorvem parte de sua história e a transformam em “chuva de palavras” com teor filosófico, um caminho que esta série de artigos polidamente evita, colocamos Leibniz a título de amostragem: o exercício de aritmética oculto do espírito que não sabe calcular.

Ou, se preferir, e de um modo mais afeito ao que ele pregava: “A essência das coisas é constituída da soma de pares e ímpares, noções opostas (limitado e ilimitado)”.

Dá para lotar um biblioteca na dança dos números pitagóricos e suas representações/interpretações, todavia, o Pitágoras aqui enfocado é antes de mais nada o sacerdote.

Antes de partir para a Magna Grécia (Itália), especificamente para Crotona, há o encontro entre ele e Teocléia. Motivos não faltaram para sua estada em Delfos. Ele já havia percorrido todos os templos da Hélade, assistira os jogos olímpicos, foi recebido como mestre em todos os lugares e no santuário de Júpiter assumiu o lugar do hierofante para presidir a cerimônia. Teocléia era sacerdotisa de Apolo, Delfos resumia a alma helênica e Pitágoras estava ali para preparar o futuro.

Assim como o Egito caíra, sendo ele mesmo testemunha ocular desse acontecimento, ficara claro que a Grécia mais cedo ou mais tarde ingressaria no movimento descendente de sua civilização, pois tal movimento, que ele percebera nos astros, também se repete na história humana, individual ou coletiva. Ninguém pode frear esse fluxo. Mas os heróis podem ser preparados. Teocléia, enfim, foi reconhecida pelo mestre como uma perfeita receptora da doutrina, que por sua vez seria espalhada ali mesmo e assim se tornando mais um foco radiador. Dentro em breve ele partiria para a cidade onde existia o “Conselho dos mil”. Vejamos, porém, mais um pouco de seu encontro com Simônides, sob os auspícios da licença poética:

- E quanto a Teoclécia? – teria indagado Simônides.

- Nasceu numa família cuja dignidade de sacerdote é hereditária – respondeu Pitágoras – imagino-a como uma dessas jovens que tem aversão inata e instintiva pelo que atrai os outros. A pesada atmosfera terrestre a inquieta e o simples vislumbre do amor físico lhe parece um estupro da alma. Tem ojeriza às superstições e às idolatrias populares do culto. Por outro lado, é estranhamente sensível às influências astrais e às vezes julga não mais sentir os limites de seu corpo e de se dissipar no infinito.

Simônides indagou então sobre Zamolquis.

“- Se estiver vendendo, e quiser um comprador para seu escravo, gostaria de saber o preço. Não pretendo destiná-lo a trabalho pesado. Sei que ele está acima disso. Prometo que o tratarei bem.

- Não duvido – disse Pitágoras – mas vou dar a Zamolquis sua liberdade para que possa voltar a seu povo. Ele tem sido um bom aluno, está na hora de começar a ensinar. Além disso, tenho certeza de que já cumpriu sua pena.(...) Há dez anos ele partilha dos meus estudos. Em todo esse tempo, jamais derramou o sangue de qualquer criatura viva. Sabe que são almas que já foram homens ou que um dia o serão. Assim, como em sua vida anterior trouxe morte e trevas, nessa trará vida e luz.”

Pitágoras ficou um ano inteiro em Delfos. Instruiu os adeptos e preparou Teoclécia para seu ministério como pitonisa. A Magna Grécia estava à sua espera e lá seria fundada a primeira universidade do mundo, que teve o nome de Templo das Musas.

Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 21/10/2009
Reeditado em 14/02/2013
Código do texto: T1878813
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