A VERDADE ESTÁ LÁ FORA

“Existem coisas escondidas, muitas delas ignoradas por filósofos e cientistas, que não passam de pessoas ingênuas e ignorantes. Outras são conhecidas, mas voluntariamente ocultadas por estes, a mando do governo. Não podemos confiar na autoridade de ninguém, devemos nós mesmos buscas a Verdade. Eles foram comprados pelo governo para nos enganar, ou seu conhecimento sobre o mundo é restringido pela sua pobreza espiritual e pela visão reducionista. Nós, os iluminados, que temos uma visão holística do universo, estamos mais aptos para responder à pergunta ‘O que é verdade?’. Os cientistas são pagos para mentir sobre vida extraterrestre e sobre os fatos históricos. Não sabem nada sobre o que permeia o universo, sobre magnetismo, sobre o poder dos astros, dos cristais, dos elementos, sobre Deus… de fato, temos muita pena deles…”

O pensamento acima ilustrado parece o de algumas pessoas que dizem “sábias” no nosso tempo, que preferem a opinião de um guru que a de um filósofo. Eles acreditam seriamente que os cientistas são pessoas ingênuas, que ignoram poderosos mecanismos do universo, ou que são mentirosos a serviço do Estado, com o intuito de nos esconder a verdade. Cientistas são pessoas pobres de espírito e com uma grande má vontade. Para estes “sábios”, as informações científicas, quando não são intencionalmente enganadoras, são incompletas. Não sabem eles que existem mais mistérios entre o céu e a terra do que imagina nossa vã filosofia.

O mote da série Arquivo X, “A verdade está lá fora” (The truth is right here) parece reproduzir, em vez de estimular, fielmente o pensamento paranóico das pessoas deste tempo. Embora ela seja usada, na série, para insinuar que os eventos terrenos têm ligação com extraterrestres, também podemos interpretá-la como uma desconfiança em instituições “fechadas”, no governo, nas ciências... A descrença nos efeitos e na “benevolência” da ciência acabou por se tornar também uma desconfiança nos seus métodos e suas conclusões. A ânsia de Verdade, que jamais foi dada pela ciência, levou muitos a adotar métodos irracionais para alcançá-la. Agora, qualquer coisa é verdade, desde que você acredite nela. Hoje em dia, a verdade está lá fora, fora do âmbito das ciências, e dentro de cada indivíduo. Cada um é capaz de forjá-la em sua própria casa ou no laboratório ametódico do seu crânio. A descrença na conjecturas científicas levou as pessoas a uma confiança irracional de que a verdade é autoconhecimento – de fato, a introspecção é o conhecimento mais confiável que podemos ter, mas ele não ajuda muito quando tentamos nos relacionar com o mundo exterior.

É neste espaço de extrema paranóia, insegurança e desilusão que (re)surge o esoterismo, o relativismo preguiçoso, o irracionalismo, o subjetivismo, a introspecção... Ninguém é dono da verdade, e a verdade de todos é válida. Todas as religiões, no fundo dizem a mesma coisa, segundo estas pessoas. Todos os caminhos levam a um só lugar. Eles ignoram as claras contradições existentes entre as diferentes religiões, mascarando-as com argumentos pobres e apelando para o simbólico. Escolhem, sem nenhum critério, aquilo que acreditam. O critério é simplesmente o “conforto espiritual”. Catolicismo convive com a crença espírita/hinduísta da reencarnação. Se perguntar a algum deles o que dizer sobre esta clara contradição, eles dirão não ver contradição alguma. Há um crescente afastamento dos tratamentos médicos convencionais, por serem ditos “reducionistas”, e uma constante procura de tratamentos “alternativos”, a fim de sentir-se completamente seguro. As religiões afro-brasileiras tornaram-se um terreno fértil para pessoas sem critério, também conhecidos como sincretistas religiosos, esotéricos, relativistas, New Age, etc. Toda verdade é válida, exceto a dos cientistas, a dos materialistas, a dos ateus, dos céticos, dos racionalistas... Estes são os vilões da história, são pobres de espírito, que querem tirar a magia do mundo, tornar nossas vidas mais pobre e cinzas, que querem nos impor uma verdade única – mesmo que a verdade, para ser verdade, tenha que ser uma.

Igor Roosevelt
Enviado por Igor Roosevelt em 03/07/2009
Reeditado em 03/07/2009
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