Pasárgada, welcome Mr. President

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

... (Manuel Bandeira)

Esse trecho do poema do nosso nobre poeta Manuel Bandeira sempre me deixou a pensar quem seria esse rei, do qual ele se diz amigo. Após uma pesquisa concluí que deve ser Ciro, o Grande, que fundou o Império Persa em 539 a.C, ao conquistar a Babilônia.

Após a conquista, seu primeiro ato foi liberar os judeus escravizados mandando-os de volta a Jerusalém, dando-lhes dinheiro, inclusive, para que construíssem seu templo. Caracterizou-se por sua tolerância religiosa e cultural, englobando em seu Império mais de 23 etnias que conviviam sob o Governo Central, originalmente assentado em Pasárgada e depois em Persópolis, ambas localizadas ao sul do atual Iram.

Ciro mandou fazer um cilindro de barro cozido semelhante a uma espiga de milho, com inscrições em letras cuneiformes de um decreto que se pode chamar a primeira Carta de Direitos Humanos da História, anterior em quase 2.000 anos à Carta Magna inglesa. Seu decreto é um chamamento à liberdade religiosa e cultural, que proíbe todo tipo de opressão e escravidão, assim como a expropriação de bens pela força e sem compensações, além de outorgar aos estados membros liberdade para incorporar-se ao seu reino. Dizia ainda: "Nunca utilizarei a guerra para reinar". Este cilindro está hoje exposto no Museu Britânico de Londres e tem uma cópia na sede da ONU.

Devido à sua situação estratégica e sua riqueza, o Império Persa nasceu, findou e ressurgiu diversas vezes antes de desaparecer definitivamente no século VII, com a invasão dos nômades árabes impulsionados por uma nova religião, o Islan. Entre os invasores destacam-se ainda os mongóis de Gengis Kan e Alexandre Magno que, dizem, "persificou-se" casando-se com Roxana.

O subsolo do atual Iran possui a segunda maior reserva de petróleo do mundo - perde apenas para a Arábia Saudita. Detém ainda grande reserva de gás natural, inferior apenas a Rússia. A isto se pode acrescentar que o Iran se limita ao sul com o Golfo Pérsico, o Iraque, o Kuwait, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes. O estreito de Ormuz, no Golfo Pérsico, é a via de navegação de maior parte do petróleo do mundo, o que sugere uma posição única para ameaçar a produção e sequestro do mesmo, podendo vendê-lo a outros mercados, à parte do Ocidente. "Te suena algo?"

A atual República Islâmica do Iran foi fundada em 1979 após uma revolução, em parte inspirada por líderes religiosos conservadores e com o apoio da Cia e da Inglaterra. Depuseram o primeiro ministro Mohammad Mossadegh, que havia sido eleito democraticamente, para entregar o poder ao Xá Reza Pahlevi, que outorgou os direitos de exploração do petróleo às companhias britânicas e norte-americanas, enquanto Mossadegh foi encarcerado e logo posto sob regime domiciliar até sua morte em 1967. Esta operação, denominada TP-Ajax assentou as bases para as posteriores décadas de opressão e fundamentalismo islâmicos.

Voltando aos persas, ressaltamos em sua cultura o Zoroastrismo, uma das religiões mais antigas do mundo, surgida em torno do ano 1.000 a.C. através do profeta Zaratustra (Zoroastro em grego) que predicou uma revelação segundo a qual entre todos os deuses havia uma divindade suprema. O Zoroastrismo, basicamente monoteísta, com preceitos de bem e mal, céu e inferno e um Deus único e Todo-Poderoso influíram muitas religiões, incluídos as três maiores monoteístas do mundo: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.

A língua oficial dos persas e ainda utilizada pelo povo Iraniano é o farsi. Quando chegaram os árabes, foi proibida de se falar em público durante 300 anos. Os que eram pegos falando o farsi tinham suas línguas cortadas. De todo modo, os iranianos seguiram falando farsi, que se "arabizou" um pouco, mas o antigo persa segue presente em suas raízes. Do hedonismo persa resta ainda o apreço pelo vinho, o amor, a poesia e a música, em contrapartida à abstinência, a pregação religiosa e ao fatalismo que se associam ao Islan.

O homem a quem se atribui o mérito de haver salvo a língua farsi do esquecimento é o poeta Firdusi, considerado o Homero Iraniano. Os iranianos idolatram seus poetas, cujas obras são mais consultadas como guias para a vida e o amor do que o Alcorão. Dizem ainda que qualquer pessoa escolhida ao azar, nas ruas, seja qual for seu nível de educação, sabe recitar versos de Firdusi. Seus poemas são apresentados quase sempre com ética e moral superior à dos reis a quem servem, afrontando o dilema do homem honesto sob um governo malvado ou incompetente. Diz ainda que as pessoas mais capacitadas a governar sejam precisamente as que preferem não fazê-lo, já que se dedicam a aprofundar-se em questões mais essenciais como a natureza do conhecimento, o destino da alma humana e a impossibilidade de compreender os desígnios de Deus.

Os iranianos da atualidade mantêm a nostalgia de voltar a ser uma superpotência e as ambições nucleares têm relação direta com esse desejo. Continuam enriquecendo urânio e insistem que querem apenas produzir combustível para suas centrais nucleares. É a primeira teocracia constitucional moderna do mundo, o que supõe um grande experimento. A grande pergunta é: até que ponto um povo impregnado da rica tradição persa possa ser governado com êxito por alguns líderes religiosos que impõem uma interpretação estrita do Islan? Se se pergunta a um Iraniano o que gostaria que o mundo soubesse a seu respeito, a resposta é sempre a mesma: "Não somos árabes, não somos terroristas."

Os iranianos são orgulhosos de sua flexibilidade cultural e de sua capacidade para adaptar-se e assimilar os costumes dos invasores sem perder seus próprios costumes.

Ao novo presidente eleito dos EUA, Mr. Barack Obama, respeitada a sua origem multicultural e racial, sua transparência como homem público (penso que o primeiro presidente eleito que assume em seu livro ter usado drogas na juventude), considerando suas raízes africanas, parte de sua infância na Indonésia e votação maciça e fundamental de latinos, rogo que, em relação ao Iran, leve em consideração não os últimos 30 anos , mas sim, os últimos 2.500 anos de uma linda História, fazendo todo o possível evitar uma nova guerra.

Lembre-se senhor presidente, que a similaridade de seu nome com o nome Osama (Bin Laden) quase o extirpou da vida pública após o fatídico 11 de setembro. Lembre-se ainda que o senhor ressurgiu politicamente quando manifestou-se publicamente contra a guerra do Iraque. Como os iranianos, é hora de provar que o Senhor de chama Obama e não Osama. Tens em suas mãos a oportunidade de criar uma grande nação, de fato, não com o uso da violência e da soberba demonstrada por alguns de seus antecessores e sim, respaldado, quiçá, no cilindro de Ciro. I hope you are not to miss that oportunity and so I say: "Welcome Mr. President".