CONFRATERNIZAÇÃO DE DEUSES

CONFRATERNIZAÇÃO DE DEUSES

Irmanados pelas suas próprias virtudes, eles só aceitam a convivência com seus semelhantes e consideram estranho tudo que seja diferente deles. (EPICURO)

Essa epígrafe conclui o pensamento do filósofo grego referido à existência dos deuses.

Hoje, decorridos aproximadamente 2.260 anos de sua doutrina, se o crítico se pusesse a imaginar o Congresso como um céu, “veria” seus “deuses” passearem serenos, a consciência alegre, cheios de boas intenções, boas vontades.

Porém, num olhar mais atento, veria que, no passar dos últimos tempos, muitos deles vêm procurando amoldá-lo a seus interesses. Comprova isso, recente estatística do Congresso em Foco: 33% dos integrantes do Congresso brasileiro estariam sendo processados, certamente, por agirem assim, preterindo os interesses do Povo. Não obstante os processos, e em se considerando que abrangeu apenas aqueles que não conseguiram se safar, ela ameniza; a ser criteriosa, possivelmente, estarreceria.

Entra, então, neste ponto, o pensamento de Epicuro. Em tempos de “reforma política”, permite ver ao Brasil que as medidas que se anunciam e aprovam, não se constituiriam em aspirações populares autênticas. Elas não impediriam “que se considerasse estranho tudo que seja diferente deles”. É o caso da propalada fidelidade partidária: talvez o Brasil conheça exemplos de políticos que, não havendo migrado nunca, não são fiéis à honestidade. Eis a questão.

Igual forma, possa ocorrer com o financiamento público de campanha: a origem dos recursos não viria a exercer influência sobre seu comportamento; no máximo, facilitaria ou dificultaria a angariação de fundos, segundo a capacidade de cada um. Ademais, parece ser sensato que não se invista o dinheiro dos salgados impostos em campanhas de políticos “que estão na boca do povo”. Também, regras como listas preordenadas, federações partidárias, cláusula de barreira etc., se requeridas como medidas de moralização, parecem resultar inócuas. Assim, e tratada a reforma nesses termos, a médio prazo, o Povo brasileiro continuará vendo reduzidas suas esperanças de paz.

“E consideram estranho tudo que seja diferente deles.” Embora os haja, os diferentes são poucos. Vivesse hoje, Epicuro poderia ensinar: "Irmanados por seus defeitos, os deuses brasileiros só aceitam a convivência com seus semelhantes, consideram estranhos todos os que são diferentes deles e tentam afugentá-los."

Parece que irão conseguir. Caso não, a pauta da reforma proporia alguns outros temas, como, por exemplo, listas judicialmente pré-aprovadas, fim da imunidade parlamentar, extinção do foro privilegiado, inelegibilidade definitiva etc., coisas que, nas ruas, se ouvem da bocas brasileiras.

E, ainda ao que parece, a tendência é a de esses “deuses” com suas reformas deixarem tudo como está. Tome-se a recente aprovação parcial da fidelidade partidária, que, não obstante seja medida pouco significativa, é, ainda, fogo de pouca lenha.

Para evitar estado que tal, frear esse comboio e imprimir rumos que restaurem a dignidade brasileira, bem como que melhorem a imagem do país, é preciso atenção por parte do Povo, dos segmentos sociais e dos outros setores do Poder. Ora, o que se quer, é reforma com capacidade de colocar em seus devidos termos a segurança dos cidadãos nos lares, nas escolas, nos hospitais, nas ruas e estradas, bem como, em seus devidos termos, aquela que mais recentemente se esfacelou: a segurança no ar.

Por isso, uma medida a se esperar na reforma, salvo melhor juízo, seria aquela que abrigasse condições inequívocas de se exigir que a confraternização dos representantes do Povo ocorresse por meio de suas virtudes.

izidro.jim@hotmail.com