A lenda do homem desconstruído

Não gosto e nem queria escrever sobre isso de modo generalizado, mas tenho pensando muito comigo e meus botões sobre meus relacionamentos e de algumas amigas também com os tais “homens desconstruídos” e os “pró-feministas” e não tenho conseguido achar muitas exceções que me façam pensar diferente sobre os privilégios masculinos e como seus discursos tem diferido abismalmente de suas práticas.

Algumas de nós mulheres (heterossexuais e bissexuais principalmente) feministas e defensoras das pautas da esquerda, temos tido uma enorme dificuldade em nos relacionar afetivamente com os homens, e o pensamento mais constante é que “ele ainda não desconstruiu seus privilégios”, principalmente os que são afastados do mundo da militância política. Isso nos faz por várias vezes abandonar namorados, relacionamentos abusivos e paqueras machistas e sempre buscar pessoas que sejam “compatíveis com as nossas ideologias”.

Mas além dessas relações conturbadas com os que ainda não entendem nossas demandas tem aparecido uma figura muito peculiar e curiosa, e pessoalmente muito decepcionante, o “esquerdomacho”, e é esse o tipo que tem me deixado extremamente irritada por vários motivos que gostaria de debater com quem quiser me acrescentar mais, porque até agora não tenho conseguido enxergar muito além de uma figura patética.

Os “esquerdomachos” são aqueles caras que falam em “poliamor” e “amor livre”, mas só abrem seu relacionamento com outras mulheres apenas para si mesmo (provavelmente essas mulheres nem sabem que isso acontece, ou não entendam bem como lidar com essa forma de relação). Tenho minhas dúvidas quanto a esse tipo de relacionamento, mas acho muito estranho um cara dizer que não existe problema nenhum nisso porque “ela também pode fazer o mesmo”, mas aprisiona uma ou mais mulheres numa relação de submissão porque ela(s) tem afetividade pelo mesmo e aceita a situação por medo da solidão.

Eu nem preciso falar o quanto isso é problemático: submissão, chantagem emocional, abuso psicológico além de em muitos casos colocar a mulher no lugar de “louca” por não compreender uma coisa tão linda como “amar livremente”, sem considerar que historicamente os homens sempre tiveram esses privilégios, enquanto a mulher livre sempre foi a Geni.

São esses homens que se dizem “pró-feministas” que na primeira oportunidade de agem como qualquer pessoa sem o mínimo conhecimento sobre as pautas feministas faria, os que abusam sexualmente de amigas alcoolizadas, o que usam discursos de “homem desconstruído” para conquistar mulheres militantes, o que simplesmente se esquecem que estão numa posição social de destaque na sociedade. O que me incomoda enormemente é que nos colocamos ao lado desses homens em várias lutas para defende-los também, mas na prática somos levadas sempre para a cozinha e para a cama, mas nunca a sério. Nossos interesses, nossos pontos de vista e nossas aspirações são colocadas de lado, afinal ainda somos mulheres e mulheres são apenas um tipo de “diversão” e “alento”. E eu nem vou falar da mulher negra e da periférica, já me enojei o suficiente.

Até onde consigo enxergar esse homem que supostamente desconstruiu seus privilégios e quer até mesmo participar do movimento feminista ainda é uma lenda, porque ainda não vi sua manifestação verdadeira.

Ruana Castro
Enviado por Ruana Castro em 01/02/2017
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