O monstro em nossa sociedade

Se perguntarmos às pessoas, que têm a mínima ideia do que foi a Segunda Guerra Mundial, sobre o fenômeno do nazi-fascismo na Europa, certamente a maioria responderia, chocada, que foi uma das maiores barbáries da história da humanidade?

Esta pergunta, eu teria dito há alguns anos, sem pestanejar, que o povo sentiria desconforto e vergonha pelo o que ocorreu. Por tudo o que líderes como Mussolini e Hitler representaram, as atrocidades cometidas contra aqueles que não se encaixavam nos padrões estabelecidos por uma ideologia que pregava a pretensa superioridade de um povo, os campos de concentração, a Solução Final, a eugenia etc., são horrores que cogitaríamos evitar que acontecessem novamente. No entanto, tenho percebido, com o passar dos anos, que muita gente tem aderido, ou já estava impregnado nela (?), toda sorte de pensamentos e comportamentos que se assemelham ao que ocorreu na primeira metade do século XX, que teve o seu "ápice" com o início da Segunda Guerra Mundial.

O fascismo ganhara força quando parte da burguesia e da classe média, temendo o avanço das ideias socialistas, aderiram aos seus princípios como forma de superar a crise provocada pelo liberalismo, o qual levou a economia mundial ao caos. E, uma vez que a democracia não atendia às suas necessidades, os fascistas não encontraram muita resistência ao propor um Estado que fortalecesse uma nação, em especial sob o comando de um grande líder (duce/führer), o ultra-nacionalismo, a ideia distorcida do que é ser um grande povo. Sem falar do autoritarismo e da importância de uma "pureza", que, afinal, significava eliminar toda e qualquer forma de oposição e daquilo que fosse considerado degenerado. Com isso adeptos do liberalismo, comunistas, socialistas, judeus, ciganos, negros, testemunhas de jeová, homossexuais, deficientes físico e mental... enfim, tudo que não fizesse parte do ideal defendido pelo nazi-fascismo deveria ser extinto.

Bom, a História nos dá também outros exemplos, anteriores a esse episódio, do que a intolerância é capaz de fazer a certos grupos sociais indesejados por outros grupos que se consideram padrões a serem seguidos.

Quanto ao conflito que levou a derrota do fascismo na Europa, talvez o que mais simbolizou essa incivilidade, sejam os campos de concentração, dos quais o mais conhecido foi o de Auschwitz. Dali, como exemplo, o pensador da Escola de Frankfurt Theodor W. Adorno em sua obra "Educação e emancipação" nos alerta sobre a importância de se evitar episódios dessa natureza:

"Qualquer debate acerca das metas educacionais carece de significado e importância frente a essa meta: que Auschwitz não se repita. Ela foi a barbárie contra a qual se dirige toda a educação. Fala-se da ameaça de uma regressão à barbárie. Mas não se trata de uma ameaça, pois Auschwitz foi a regressão; a barbárie continuará existindo enquanto persistirem no que têm de fundamental as condições que geram esta regressão”.

Neste sentido, pode-se afirmar que Adorno nos convoca a entender os mecanismos que levaram a "barbárie", para que ela não aconteça novamente? Não tenho a resposta pronta. Mas o problema que vejo é que nossa sociedade parece não ter dado muita importância às reflexões de Adorno. Talvez não veja muita relação entre o que aconteceu na Alemanha nazista com as práticas que demonstram intolerância em nosso país: racismo, misoginia, homofobia, discriminação religiosa, dentre outras, que são naturalizadas, tratadas como coisas normais. O interessante é que, anteriormente, tais práticas eram veladas, tratadas com uma certa sutileza. Entretanto, há uma estratégia de negar qualquer forma de discriminação, afirmando que se trata de ações isoladas ou que não passa de mi-mi-mi de determinados grupos minoritários.

Seja como for, uma educação humanizadora é necessária em todos os âmbitos de nossa sociedade. Não só na escola, é também importante em todas as instituições que agregam pessoas ou formam opiniões, tais como: igrejas, partidos políticos, associações, sindicatos, mídias. Se não houver esse comprometimento, ou seja, formar pessoas que respeitem as diferenças, continuaremos a fabricar monstros em nossa sociedade.