O amor, um sentimento tão emblemático, nem sempre é modelo de virtude, tem seus momentos de fetiche, de interesses escusos e, principalmente, de mercantilismo. A Internet permitiu a exposição das veias necrosadas, que antes ficavam ocultas dos nossos olhos. Foi pela Rede que surgiu um tipo de site que chamam de fórum.
 
Os fóruns são domínios eletrônicos que abrigam as mais variadas temáticas, agrupam pessoas que compartilham conhecimento e relatos em torno de um assunto chave. Os mais fascinantes são fóruns frequentados por clientes de prostitutas. Sim, eles existem há mais de uma década. São visitados por desempregados, profissionais liberais, cientistas, sociólogos, engenheiros, etc. A princípio, não há distinção de classe ou gênero. No Rio de Janeiro, prevalecem dois sites do gênero (o mais antigo está em decadência). Em São Paulo, mantém-se em atividade o mais famoso de todos eles.
 
Com a curiosidade do investigador, me infiltrei com todas as camuflagens possíveis no universo dos seguidores fanáticos por garotas de programa. O esquema é muito simples, você se cadastra com um “nick” (apelido); observa as regras, que geralmente constam na página principal; se apresenta e começa a postar. A estrutura é dominada por uma espécie de cadeia hierárquica, formada por administradores, moderadores e níveis inferiores de diversos de usuários comuns. Promoções de status são efetuadas a partir da intensidade do participante ou por simpatia dos membros de maior patente. Administradores e moderadores não costumam ter vínculo com os donos do site, são apenas títulos que indicam a concessão de ferramentas que permitem editar e excluir postagens.
 
O jornalista Pedro Dória abordou, superficialmente, o tema dos fóruns sobre o sexo remunerado no livro Eu gosto de uma coisa errada(Ed. Nova Fronteira) e chegou a entrevistar alguns membros que escrevem neles. Como escritor, estou elaborando um volume mais detalhado a respeito do assunto.
 
Não fica difícil constatar que a maioria dos que acessam os fóruns de sexo são homens casados que tentam compensar alguma frustração sexual do matrimônio. No entanto, o mais interessante são os muitos clientes da prostituição que estão ali fantasiando a busca de um amor. Acredite, o mercado que vende a promiscuidade também é um traficante de devaneios românticos. Convivendo com os sujeitos mais atuantes desses fóruns, percebe-se, imediatamente, uma carência extrema que só se aplaca na ilusão de conquistarem o afeto da mulher mundana. É o masoquismo como cura.
 
Testemunhei clientes que pagam alugueis de imóveis e oferecem mesadas para engaiolar o objeto do desejo, dando ao benfeitor a prioridade do uso exclusivo; outros não conseguem ultrapassar as promessas materiais, mas fazem uso delas como ferramenta de sedução; vi os mais centrados se comportando como insanos, após serem possuídos pela compulsão por alguma mulher da vida. O sexo pago prova que a obsessão é a paixão dos incautos.
 
Entre os amores comprados e a locação amorosa; entre os relatos sobre desempenho sexual e as inconsistentes amizades digitais; entre os elogios mútuos e um certo clima homoerótico; entre tudo e todos, paira o pecado absoluto: a vaidade.
 
Acompanhando os fóruns sobre o meretrício, logo fica claro que o motor que move todas as engrenagens é a vaidade em todas as suas formas. O fundo emocional relevante é a irrefreável necessidade de exibir o alcance financeiro, o brilho social, um intelecto elevado, o poder de posse, etc. Nessas vitrines virtuais, o sexo é um mero agregador das ruínas humanas. Talvez, por isso, guardei a nítida impressão de que eles reúnem muitos dos piores exemplares da espécie.
 
Os “foristas” (como se denominam) usam um vocabulário peculiar para identificar algumas de suas ações mais comuns, uma série de referências que coisificam a mulher contratada. O “test-driver” (que eles abreviam como “TD”) é o ato do sexo seguido da avaliação escrita num post; o BOP (sigla para baba-ovo de prostituta) é o indivíduo mais sentimental, que expõe no seu relato uma experiência afetiva. Tais designações se explicam quando compreendemos que os fóruns eróticos foram criados como um ambiente profundamente machista. Com o passar dos anos foram aderindo aos vícios da nossa sociedade de consumo, onde ter é ser. Neste microcosmo, tudo se reduz a produto: a fêmea, o macho, o amor, as narrativas e o sexo.
 
A filosofia inicial dos fóruns não permitia a participação de mulheres, mas com o passar do tempo e a organização de festas de confraternização, cederam à presença delas, fato que alterou o comportamento dos usuários. Antes, discursando sob uma fachada machista e preconceituosa, começaram a adotar um estilo mais afável e meigo. Aquele rosnar de desejo, comungado com os ressentimentos que recheavam as narrativas, foi substituído por um tom declamativo e poético. Infelizmente, não é possível determinar com certeza o que é real e ficção nas milhares de descrições, algumas quase literárias, que compõem o imenso banco de dados desses sites.

 
Os proprietários dos fóruns não demonstram se importar com nada que acontece neles, terceirizam a monitoração. Preferem cuidar daquilo que interpretam como o lado lucrativo do negócio, os anúncios de “modelos” que trabalham como profissionais do sexo.
 
Pela ótica de um site virtual, é mais fácil enxergar as nuances comportamentais dos indivíduos que contratam favores de garotas de programa. Porém, tanto os fóruns sexualistas como as zonas de baixo meretrício funcionam como um balcão de negócios frequentados por alguns homens equivocados, agem como um desequilibrado que vai ao banco pedir romance emprestado. As consequências já foram lidas em diversas ocasiões nas páginas policiais, vão desde o homicídio ao suicídio e até o consumo de drogas. Pecados que a sociedade tolera por conveniência. É temeroso esquecer que em território de cafetões e marafonas há um crime inapelável, que ninguém deve cometer: apaixonar-se.
 
Apesar de tudo, alguém escreveu, se o amor tem um preço, o mundo não está definitivamente perdido, sempre se pode fazer um seguro.
 
Alexandre Coslei
Enviado por Alexandre Coslei em 26/01/2016
Reeditado em 28/01/2016
Código do texto: T5523194
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