MULHERES ABORTADAS

Há algum tempo eu estava querendo escrever esse texto, mas a correria dos dias engessava meus dedos. Dia das Mulheres senti-me na obrigação de desengessá-los.

Nos últimos dias, meses, vi várias postagens de mulheres grávidas (amigas, desconhecidas, artistas...) combatendo o aborto. Vamos conversar um pouquinho sobre essa questão tão séria.

Primeiro é preciso questionar-se: o que significa ser contra o aborto? O aborto no Brasil é proibido, no entanto, mais de 800 mil mulheres cometem abortos todos os anos, menos de 2% desses casos são legais. Uma a cada cinco mulheres já cometeu aborto uma vez na vida. Isso significa um gasto aos cofres públicos de 142 milhões ao ano. O fato de o aborto ser proibido não impede a mulher de cometê-lo, só coloca as mulheres pobres em condição de risco, pois as que têm dinheiro vão às clínicas bem equipadas, higienizadas e saem saudáveis, enquanto as mulheres de baixa renda, em sua maioria, tomam remédios abortivos em casa e chegam às maternidades morrendo para fazer a curetagem, muitas vezes, atendidas de maneira desumana ou seguem para as clínicas de fundo de quintal. Em 2012, o número de mulheres mortas por aborto de risco no Brasil foi de 200 mil.

São números alarmantes e o que a sociedade faz? Crucifica a mulher! Abortam essa mulher de sua liberdade, de sua dignidade, tratando-a como criminosa!

Desde dezembro de 2012, as mulheres no Uruguai podem interromper uma gravidez indesejada de maneira segura, com o suporte dos hospitais público e privados legalmente. É interessante questionar-se por que motivo o Uruguai – país que legalizou o aborto – registra menos de 7 mil abortos ao ano? (lembrando que o Brasil são 800 mil casos/ano). O Uruguai agora possui taxa zero de morte materna por motivo de aborto.

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Aborto é um caso de saúde pública! Ou o governo intervém nessa questão ou os números brasileiros só aumentarão. Quem paga com a vida e a saúde é a mulher, quem paga com o financeiro é o governo e as igrejas não perdem um real.

É preciso refletir se as pessoas e instituições que são contra o aborto querem realmente que os números de abortos diminuam ou a luta é apenas por valores e conservadorismo! O fato de ser legal ou ilegal não faz uma mulher desistir de abortar! A maioria das mulheres que resolve abortar está sentindo-se só, desamparada, com problemas emocionais, financeiros. Decidir abortar não é fácil para boa parte dessas mulheres. Quando elas procuram uma clínica clandestina (que ganha dinheiro com isso), jamais terá alguém para conversar sobre o assunto, para analisar se é isso mesmo o que ela quer ou não. A legalização do aborto significa dar o direito a essa mulher de conversar antes com psicólogos, assistentes sociais e abortar só se a certeza for plena, com toda garantia de não colocar sua vida em risco.

Mas a grande preocupação da sociedade é culpabilizar a mulher! Abortá-la de sua liberdade, de sua dignidade, tratando-a como criminosa.

Primeiramente, esquecem de que essa mulher não fez esse filho sozinha e antes de ela desistir dessa criança, ela já foi abandonada pelo genitor ou tem o seu apoio, uma vez que as casadas aumentam a lista de mulheres que abortam diariamente, planejamento familiar! O discurso de que “ela engravidou porque quis” também poderia ser estendido para “ele fez porque quis”. Diariamente homens abortam os filhos, mas a culpa só cai sobre a mulher!

Um fator principal é sempre esquecido: o corpo é da mulher! Ela empresta a uma gestação se desejar, se sentir-se bem para isso, preparada para isso. Todos querem mandar no nosso corpo! Parem! Quem deve decidir se quer continuar ou não com uma gravidez é a mulher!

No lugar de culpabilizar as mulheres, deveríamos refletir sobre esses números e mudar de postura. Enquanto fotos são postadas contra a legalização do aborto, fetos são retirados de maneira inconsequente e mulheres morrem.

Diariamente... mulheres são abortadas de sua liberdade e de sua dignidade, tratadas como criminosas.