Liberdade na Matrix

"... Liberdade é pouco;

o que eu desejo ainda não tem nome."

C. Lispector

Liberdade...

O mundo tornou-se tão politicamente correto, o que de fato é bom, em parte... É fácil incorrer no risco de ferir suscetibilidades, além de doloroso; tanto pela constatação da própria falta de tato, no trato, quanto pelas fragilidades dos egos que nos cercam...

Difícil encontrar alguém que não deseje a Liberdade. Mas, ela existe de fato? Ou, o quê é exatamente "liberdade"?

Ao analisarmos alguns desejos simples, chegamos à conclusão que o que o indivíduo deseja na verdade, é uma vida satisfatória... em sociedade. É claro que o convívio social pressupõe a necessidade de se fazer concessões, que, querendo ou não, tolhem a liberdade natural.

Hoje em dia é comum a ocorrência de manifestações populares que abrangem uma enormidade, entre artistas alternativos, homens e mulheres seminus, gays, jovens de todas as classes sociais, baderneiros, vândalos, etc., em nome das liberdades individuais, principalmente, a de expressão. Por vezes se torna risível, por vezes trágico, que esses mesmos manifestantes se insurjam contra o que consideram expressões de discriminação, preconceitos e racismo; ou seja, exige-se liberdade de expressão, porém é terminantemente proibido expor opiniões ou sentimentos que vão contra o establishment...

Obviamente, liberdade social não significa ser livre de fato. Índios que, aparentemente têm uma forma de vida bem mais natural, ainda se veem obrigados a obedecer às regras impostas ao convívio tribal.

Mas, e se o homem realmente desejasse uma liberdade total, sem vínculos sociais, será que conseguiria? Sozinho em lugares inóspitos, num barquinho no meio do oceano ou vivendo de caça e colheita... Será que seria feliz nessa solidão advinda de sua liberdade? Sem ter com quem dividir, sejam pensamentos, sentimentos, alegrias, tristezas, vitórias; existe em nós essa capacidade psicológica para enfrentar tanta "liberdade"?

A queima de sutiãs parecia ser o ápice das liberdades femininas. Passados os anos, percebemos que a "conquista" da dupla, quando não, tripla jornada para manter a casa, não é nem de longe, a sonhada liberdade. Os homens que, aparentemente ficaram mais livres podendo buscar e experimentar de tudo, parecem sentir-se cada vez mais presos num sistema onde a concorrência é insana e as mulheres, cada vez mais exigentes e "antenadas" com um ideal masculino; status, poder e masculinidade bem dosada com sensibilidade. Não ficou fácil para ninguém...

Nessa sociedade, qual é o nível real de liberdade feminina?

É natural às meninas que, mal aprendam a andar já passem a se enfeitar, por prazer, criatividade, gosto, enfim, feminilidade.

Quando adultas e acompanhadas, podem se dar ao luxo de se esbaldar nessa arte, porém, sozinhas, e pior, a pé, é quase loucura ou risco de morte. Sainhas curtas, botas de cano alto, saltos, maquilagem, enfim, acessórios chamativos são socialmente entendidos como convites, inclusive, à violência sexual. Alguns podem dizer: nem tanto assim...

Mas, será que não?

O gênero masculino sabe com certeza que a moça indefesa não é louca para agir dentro desse propósito, contudo, pelas convenções sociais e no seu papel de macho, observa o entorno, calculando o quanto o gênero feminino obedece à essas convenções; no que considera um ato falho, provoca, quando não, ataca.

Isso numa sociedade desenvolvida, ocidental!

Pelo noticiário se percebe o quanto o estado islâmico deseja sua manutenção, quando não, maior rigorosidade! Enquanto o mundo pede clemência para seus condenados, sua própria sociedade espera que se cumpra ao pé da letra, sua lei. Nesses estados a liberdade é algo altamente indesejável e condenável.

No Japão, onde a tecnologia e a ordem imperam, não se vê e nem parece desejável a manifestação por liberdades individuais. Está implícito que o bem-estar da coletividade garante toda a liberdade necessária, ou seja, a liberdade relativa, dentro da sociedade. Os indivíduos vigiam-se e, como se uma maior liberdade de um ou de outro pudesse afetar o grupo, acabam por repudiá-los e os isolam.

No ocidente desenvolvido, nossa busca e luta pela liberdade continua; debatemos entre vigiar, ampliar e restringir, como se a relativa liberdade social fosse de fato, a preciosa liberdade real.

Assim como alguns animais vivem aos bandos, sob uma liderança, também o homem busca a vida social.

Parece que a única diferença entre viver livre socialmente ou encarcerado nalguma prisão, está no nível de recompensa derivado de um ou outro estado...

Será que em pensamentos conseguimos criar uma liberdade de fato, ou, até na mente, ao criar a paisagem quadro a quadro de repente nos deparamos com uma parede invisível, um escudo que nos impeça de prosseguir; até podemos ver além, mas, seguir se torna impossível.

Feliz é o cão que no passeio, na corrente, caminha olhando para o rosto do tutor, pronto a obedecer a qualquer comando, se sentindo tranquilo e seguro...

Seríamos "geneticamente" também, predispostos à vida social e à necessidade de vigilância de alguma Matrix?

Allba Ayko
Enviado por Allba Ayko em 02/01/2015
Reeditado em 15/07/2022
Código do texto: T5087956
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