Futebol e patriotismo

Vivemos um período de intenso “patriotismo” que se estendeu desde o dia 12 de Junho até hoje, 08 de julho de 2014. Foi um período em que quase todos diziam com o peito cheio “tenho orgulho de ser brasileiro” para cada canto que se olhava, tremulavam bandeiras ou simples trapos com as cores do país. Sim, a Copa do Mundo fez todos patriotas.

Mas, calma: Patriotismo e torcedor futebol são sinônimos? No dicionário Michaelis temos a definição de patriota:

patriota - pa.tri.o.ta

s m+f (gr patriótes) 1 Pessoa que ama a sua pátria e procura servi-la. 2 Pessoa que é da mesma pátria de outrem. sm 1 Partidário das revoluções pernambucanas de 1817 e 1824. 2 Nome dado, no Rio Grande do Sul, aos soldados das forças irregulares do governo na revolução federalista de 1893. adj m+f pop 1 Diligente, esforçado. 2 Respeitador, delicado. 3 Diz-se da mulher que tem seios avantajados; mamalhuda.

Conforme se vê, não há nenhuma definição que demonstre que torcedor de futebol é necessariamente patriota ou que ser um dos requisitos do patriotismo seja torcer pela seleção do país.

Ser patriota é amar a pátria e procurar servi-la. O verdadeiro patriota é aquele professor que acorda cedo para dar aula em colégios públicos super-lotados, é o voluntário que doa horas do seu dia para cuidar de um problema social que os governantes deveriam resolver (mas não resolvem). Patriota é o estudante que se dedica a construir um futuro melhor, ainda que aparentemente tudo tente lhe dizer que estudar é bobagem e que o que vale a pena mesmo é tentar conseguir dinheiro fácil.

Nada impede que um estudante dedicado, um professor, um médico, um voluntário, um policial, um soldado, um ator, um cantor, enfim, nada impede que as pessoas torçam pela seleção de seu país. Futebol é uma diversão. O problema é a pessoa que vive num país como o nosso e acredita que tudo está bem. O problema é a pessoa ter no futebol o único e maior motivo para se orgulhar do país em que vive. O problema é sentir vergonha pelo país apenas porque a seleção foi derrotada. Sinta vergonha pelos analfabetos funcionais, pelos que passam fome, pelos que não trabalham e vivem de programas sociais. Sinta vergonha pelos corruptos impunes, pelas leis que não funcionam. Pelos hospitais lotados, pelo judiciário lento. Sinta vergonha pelos que vaiaram o Hino Nacional do Chile durante uma partida de futebol, mostrando ao mundo a decadência da educação de uma nação. Um país onde se concorda em modificar as obras de seu maior escritor porque os jovens “não entendem a maioria das palavras”, ao invés de incentivá-los a ler e aprender. Mas não venha com essa conversa de sentir vergonha porque a seleção perdeu uma partida de futebol. No esporte, ora se perde, ora se ganha! Isso é motivo para queimar a bandeira do país que até momentos atrás você dizia amar? Isso é motivo para se envergonhar pelo seu país? Se isso é ser patriota, desejo que o país tenha menos patriotas e mais cidadãos sensatos que estudam, trabalham e procuram progredir e fazer qualquer coisa útil. Não sou exemplo para uma nação, mas tenho certeza que, mesmo tendo torcido pela Alemanha desde o primeiro jogo da copa, sou mais patriota do que muitos torcedores e espero um dia poder dizer que tenho orgulho do Brasil, de sua natureza, de suas conquistas científicas, de sua cultura e arte. Infelizmente, no momento, tudo que posso dizer é que sinto vergonha por ver que no país onde nasci samba e futebol são símbolos nacionais e o principal motivo de felicidade de tantas pessoas, vergonha por ver queimarem a bandeira que deveria representar milhões de cidadãos lutadores, batalhadores, construtores de um futuro. Mas, onde estão esses cidadãos? Esconderam-se atrás de onze jogadores e uma bola e o único futuro que se pode prever diante de tal alienação é uma estrada mal pavimentada em meio a miséria financeira e moral.

Bob Regina
Enviado por Bob Regina em 09/07/2014
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