Violência & In-segurança - (1ª Parte)

"Abolir a violência humana é uma utopia que nunca se concretizará em nenhum futuro." Manoel Damasceno

A insegurança é o contexto, a violência é o fato. Esta página apresentada aos leitores não tem a ousadia e nem a intenção de analisar, mesmo superficialmente, a complexidade do fenômeno da violência humana e nem criar conceitos, pois isto exigiria um necessário e vasto conhecimento com embasamento científico, até porque cada cabeça é uma sentença, e todas as pessoas têm identidades diferenciadas entre si, cada qual com sua origem, com sua conduta própria, com seus hábitos, com sua cultura e seu cabedal de conhecimento, com conceitos, visão e pontos de vista intrínsecos, com personalidade e caráter peculiares de cada um, com vicissitudes muito particulares, com seu credo, com problemas distintos, portanto, por este somatório que individualiza a todos e como ninguém é igual a ninguém, o comportamento humano ainda continua deveras desconhecido, surpreendendo a todos, sendo um universo quase indecifrável e o seu entendimento passa por uma interpretação ética e uma análise tridimensional exploratória no campo bio-psico-social, que dizem respeito à filosofia e às ciências médicas, de forma a identificar o comportamento de um grupo, a partir do conhecimento da conduta de uma pessoa em relação às demais. Aqui, apenas pretendemos despertar para a existência de dois fenômenos intrinsecamente relacionados, que, para melhor entendimento, torna-se importante conhecer a duração de um ato ilegal enquanto só violência e, sem perder suas características originais, quando esta violência passa a caracterizar um estado de insegurança pública, cujo domínio dos conceitos, pode concorrer para o equilíbrio da segurança de todos. Compreendendo suas reais diferenças é mais fácil concluir por uma adequada resolução, portanto, como colaboração e fazemos a nosso modo, numa visão exclusivamente policial, para efeito de prevenção da violência e da promoção da segurança pública, aqui analisaremos a distinção entre um ato de pura violência humana e quando esta se transforma em insegurança pública, com suas graves repercussões para a população, afetando o cotidiano de todos, causando medo e prejuízos de toda ordem, além de desacreditar as instituições. Agora, por segurança entendemos ser o estado de satisfação que a população experimenta em toda extensão das suas funções urbanas como sendo o lar, o labor e o lazer, promovido também pelos atos e procedimentos policiais e judiciários, entre outros equipamentos e iniciativas que possam conduzir a um mínimo de tranquilidade, com boas repercussões na ordem pública.

Intangível, porém, perceptível. A violência humana que tem caráter hereditário, não se anula, mas se minimiza, estando sempre latente no homem e na mulher. Mesmo assim, a violência não se mostra como uma atividade plenamente espontânea, a sua ocorrência passa por alguns estágios e carece sempre de outro estímulo para eclodir, ainda que ela esteja em potencial em qualquer ser humano. Como ela está sempre orbitando às mentes, é possível aflorar quando são alinhados os ingredientes da criminalidade, principalmente, com o aparecimento de um agente indutor ou cúmplice de uma ação delituosa, compartilhando atos e consequências. Se não houver autodomínio, isto é, o indivíduo perdendo o próprio controle, sem autoridade sobre si, prevalecendo o instinto, às vezes deturpado pelos maus exemplos auferidos, ou se inibe por uma forma de prevenção iminente, ou, ela logo se manifesta, exigindo reparação eficaz. Se o controle da violência é necessário, a promoção da segurança é compulsória. Não é a violência que cresce, é a atividade de segurança que diminui. A violência está nas pessoas, mas, a eclosão depende dos métodos de sua criação ao longo dos anos, do processo de inclusão social, do equilíbrio da concessão dos direitos com a necessária cobrança dos deveres, do grau de vulnerabilidade do indivíduo, do ambiente, do momento, do fato, das circunstâncias e da in-eficiência dos mecanismos de controle.

Violência ou Insegurança? Genericamente, as duas palavras violência e insegurança têm o mesmo entendimento para significar desmandos que afetam as ordens jurídica e social da população. Os dois vocábulos são empregados indistintamente para designar o descaso para com a segurança do cidadão, física, moral e social. Ainda que não sejam sinônimos perfeitos, os dois termos exprimem e expressam a mesma preocupação e provocam os mesmos desgastes, igualmente, afetando a todos. Uma ou outra realidade provoca males e pavor nas pessoas, consumindo-as, deixando marcas indeléveis e irreversíveis, destruindo sonhos, causando medo e horror, retrocedendo. A diferença é que, no sentido estrito, a Violência se caracteriza por práticas antissociais restritas entre os mesmos agentes ou dentro de um mesmo espaço cultural, enquanto a Insegurança, que é a extensão e o desdobramento da violência ou uma sequência desses atos, configura-se quando estas ações ultrapassam as pessoas dos executores entre si e as fronteiras dos seus territórios ou as fazem de forma organizada, deliberada, estabelecendo objetivos, causando intranquilidade pública. Basicamente, o diferencial é uma sequência de atos configurados como violência. Enfim, violência é a prática restrita dos atos, enquanto a insegurança é a generalização dessas ações. Exemplificando: uma desordem numa praça de esporte envolvendo os possíveis atletas é uma violência e uma atitude ilegal, enquanto que a insegurança é quando as ações delinquentes saem da quadra, estendendo-se, e atingem a plateia que é a amostragem da população, portanto, preocupando a todos.

Na prática, é fácil estabelecer a diferença entre violência e insegurança. A princípio é necessário que se identifique a manifestação de uma violência real praticada por um determinado indivíduo ou segmento, que, por si só, já caracteriza o comportamento anômalo e ilegal, depois, verificar a hipótese de que a sequência desses atos se estendeu ou possa se estender noutras direções e contra outras pessoas, logo, configura-se a existência de uma insegurança. Não se pode falar em insegurança, quando não se conhece o estágio e a qualidade da violência praticada. Ao nosso ver, em algumas graves ocorrências, a simples prática isolada de certos delitos já prediz a existência da iminente insegurança, a exemplo de todos os crimes organizados, os de formação de quadrilha e os crimes em série entre muitos, tais como tráfico de drogas e armas, a pistolagem, o terror e tantos outros congêneres, pois qualquer pessoa pode ser alvo desses criminosos abjetos, inclusive, podem ser incluídos alguns delitos praticados contra o ecossistema, carecendo apenas de uma boa ilação, isto como regra geral para avaliação de todos os fatos.

A violência, como uma das características humanas, não é provável que se possa erradicar, até porque ao longo dos tempos ela tem caminhado com as diversas civilizações sem que ninguém tenha interrompido o curso deste fenômeno do comportamento humano, no entanto é necessário que se mantenha sempre sob controle, em níveis aceitáveis.

Quando se fala em violência, logo vem a ideia de agressão. Não é bem assim, ela tem seus matizes. A violência não é só lesão física nem só dano material, ela pode se apresentar de várias formas e intensidades, com ou sem o emprego de força física e, dependo do grau de cultura e social de cada agente e daquilo que o elemento está sempre desejando alcançar, a violência pode se manifestar ora por um ato ou uma obra, ora demanda pela omissão, por uma palavra ou por um gesto, por uma assinatura, enquanto uma pode ser ostensiva, muitas são reservadas, umas são de consequências atuais ao passo que outras são remotas, ocorrendo fatos até com passividade, enquanto há quem violente a si próprio, podendo tudo se estabelecer no campo tático ou no estratégico ou se concentrar no plano virtual. Suas vítimas podem estar presentes ou não, inclusive serem desconhecidas ou pertencerem a uma geração futura. De qualquer forma, todos, sem exceção, têm seus tipos próprios de violações, onde algumas transcendem a aceitabilidade de alguém ou da sociedade e se inserem no conceito da criminalidade. Isto não se pode contestar. Alguns praticam violência até com pensamentos e sonhos, enquanto muitos deixam de cometer delitos por questões puramente religiosas, pois dos Dez Mandamentos da Lei de Deus, a maioria é crime, ainda que pecaminosa pela tradição cristã. Que todos tenham fé, a providência divina agradece. Qualquer forma de violação é demasiada preocupante. E a prova disto é que a violência está cada vez mais ocupando espaço na mídia e na consciência de todos, requerendo elevadas discussões, pois envolve pessoas de todas as classes e idades, desafiando indistintamente a todos, causando vítimas, globalizando-se, corroendo o erário, contrariando o crescimento do País, alterando comportamentos e preocupando as autoridades, a despeito de todos os métodos e procedimentos de toda ordem, desenvolvidos para melhorar a conduta humana ao longo de toda a história da humanidade, mesmo assim, o avanço tem se mostrado muito lento, ainda que seja em países considerados desenvolvidos, dada a existência de uma fatia que se mostra refratária às mutações, pois sempre são desencadeadas atitudes selvagens que remetem aos nossos longínquos antepassados, com todo respeito às nossas origens, chocando a opinião pública mundial, comportando-se como tudo estivesse voltando ao ponto de partida, como se não existissem leis e nem sentimento de fraternidade, quando então o espaço era só geográfico. Portanto, a violência que é inerente às pessoas, sempre caminhou com as civilizações em grau compatível com a condução ao longo dos tempos. Abolir a violência humana é uma utopia que nunca se concretizará em nenhum futuro. Nem mesmo o conhecimento e a educação nos bancos escolares por seguidos séculos vêm se mostrando eficientes para tornar essa característica que se mostra dominante em um caractere recessivo, estando sempre latente num ou noutro indivíduo e quando estimulada vem à tona, logo, podemos aceitar que ela é realmente intrínseca à pessoa humana. Portanto, em qualquer estágio da evolução social, ela tem demonstrado fartamente que continua sendo um caractere dominante. A propósito, é bom frisar que, mesmo nos países considerados como primeiro mundo, até as pessoas da elite dominante têm praticado atrocidades, deixando a sociedade e a comunidade internacional perplexas, enquanto a onda de violência mostra-se sempre crescente. A chamada “tolerância zero”, não é sinal de harmonia nos locais de aplicação, ela deriva da existência de uma absoluta insegurança que é entendida como sendo quase sem controle por métodos menos ortodoxos, apesar do grau de desenvolvimento tecnológico alcançado por aquela população de quem já se podia imaginar a inversão da ascensão da curva da violência.

A violência comum, com característica mais sedentária do que nômade, em muitos casos, normalmente ocorre em campo limitado, em áreas restritas, em ambiente fechado, em quaisquer espaços comuns comunitários, locais de reunião e festejos diversos com frequência restrita ou pública, no ambiente familiar, etc; são exemplos: residências, escolas, restaurantes, bares, clubes, boates, quadras esportivas, etc. Enquanto só violência, normalmente, as partes mantêm uma aproximação física, um certo contato, um conhecimento anterior, ou, qualquer outra forma de relacionamento, interagindo de algum modo, ou ainda pertencem a um mesmo grupo com certa identidade comportamental entre os envolvidos. Uma boa estratégia de prevenção é mapear a violência por área física, por qualidade e quantidade, o modus operandi, estabelecendo os níveis e incidências das ações preventivas necessárias equivalentes. Para o estudo é necessário estabelecer a relação vital entre o elemento ou o grupo e o fato cometido, e, observada a estatística, prescrevendo o tratamento conforme os males, seus autores e as incidências. A polícia deve ter a consciência de que a violência é factível em qualquer lugar e a todo tempo, mas sempre combatida e sem trégua.

O ato de violência também permite a ilação de que os praticantes ainda permanecem muito aquém da fronteira da sociabilidade e da civilidade de seu tempo, muito semelhante aos nossos primitivos aborígines, desempenhando um papel presumivelmente distanciado das práticas humanas cultivadas na sua época, estando sempre em retrocesso, quase sem objetivos e sem ideia de futuro, sem religião, sem ideologia e sem Deus, sendo incapazes de praticar um ato de afabilidade e de perdão, enquanto que desconhecem a auto censura, não havendo interesse para encontrar uma via pacífica de liberação de seus traumas e das pressões como forma de altivez e sensatez. Ao contrário das pessoas civilizadas, os elementos dominados pela violência estão sempre se esforçando para descarregar toda a sua amarga carga contra as pessoas que lhes cercam e principalmente contra sua prole e outros familiares, em razão destes se encontrarem mais próximos e mostrarem-se mais flexíveis e ponderados, oferecendo a estes violentos o perdão como melhor saída, sendo indiferentes quanto à intensidade das agressões recebidas, pouco importando àqueles violentos, as danosas consequências de qualquer ordem, ainda que as vítimas sejam sangue do seu sangue. Como elementos inconsequentes, os indivíduos violentos são capazes de praticar qualquer desatino radical. Tudo isto prediz a possibilidade de uma inexistente oportunidade social ao seu alcance para ingressar nos caminhos da educação como a única via da transformação, do desenvolvimento, da civilidade, do exemplo, da cidadania e do futuro, afinal de contas, o homem quando condicionado pela Educação é um ser mutável, afável, refratário às reações diante de certos desafios e das provações, sendo capaz de ser influenciado e de influenciar positivamente, assim, algo nada interessante consegue lhe tocar. Preferentemente, que todo este processo educativo deva começar ao brotar a concepção, porém, embora com atraso, a todo tempo é hora de se começar, ainda que de difícil correção, porém, podem-se minimizar as trágicas consequências.

De um modo geral, a violência que causa pânico é um comportamento humano de caráter mais ativo do que omisso, que se relaciona mais intimamente com a manifestação condicionada de cunho emocional que se rebela, negligencia quanto aos resultados, que reage veemente, levada a efeito de forma acéfala, individual ou coletiva, com ou sem palavras de ordem, silenciosa ou com alvoroço, mas que tudo denuncia um quadro de opressão e declínio da sociedade ou de um ou mais segmentos populares. Quando praticada por elementos isolados estes representam um conjunto, com ação localizada e sedentária, normalmente sem cumplicidade de delinquentes externos, rompendo com os padrões legais e éticos da família e do contexto comunitário, com uso da força física e/ou de armas, com expressão lesiva, atos agressivos e delituosos contra o público alvo, com possibilidade de insídias, praticados nas vias públicas ou em ambiente de uso privado, tirando ou não proveito material, medindo ou impondo poder, conquistando e dominando espaços, locupletando-se materialmente e transmitindo uma mensagem de intimidação e de medo a todos que lhes cercam. Na violência, via de regra, não existe a previsão de alcançar um objetivo além do território e das circunstâncias que cercam seus agentes, exceto a difusão dessa sórdida mensagem para todo o universo, funcionando como um grito no silêncio do poder, tudo como se fosse mesmo um pedido de socorro, para que as autoridades despertem, saiam da imobilidade e possam decifrar os fatos e direcionar medidas e iniciativas adequadas de toda ordem. Normalmente tudo acontece entre os mesmos.

A criminalística moderna, segundo sua crítica, considera inconsistente e inaceitável a Caracterologia então defendida por Cesare Lombroso (1835 – 1909), criminologista e psiquiatra italiano, o qual relacionava as características físicas de um ser humano, sobretudo, faciais ou sua própria fisionomia, com o seu eventual comportamento criminal, como assim se pudesse concluir, sumariamente, pelo caráter de uma pessoa, a partir da sua formação craniana entre outras partes do corpo, isto é, os sinais da violência já estariam estampados e identificados na fisionomia do indivíduo, mesmo antes de cometê-la, cuja teoria, com sabor de racismo e preconceito social, consistia na criação de padrões para estigmatizar certas pessoas, inclusive, atingindo vultos da história. Aquele que apresentasse má formação craniana ou rosto fora de simetria, já tinha por certo uma sentença preconcebida, era um criminoso em potencial. Enquanto acatadas como verdadeiras, dispersando ideias preconceituosas, aquelas teorias causaram grandes constrangimentos e julgamentos precipitados, e, mesmo anacrônicas e rejeitadas pela ciência, elas ainda continuam sobrevivendo e que podem ser responsáveis pelas expressões como “mal encarado”, “boa apresentação” entre outras que só servem para estigmatizar e deixar as pessoas desapontadas. Não se pode avaliar uma pessoa por aquilo que ainda não cometeu, apenas presumindo por seus traços fisionômicos. Essas teorias por serem inconsistentes caíram em descrédito no campo jurídico, ainda que estes preconceitos lombrosianos, nos bastidores, continuem estigmatizando as pessoas, sobretudo, pobres, os quais estampam semblantes de amargo sofrimento. Modernamente, os sinais da violência devem ser definidos como sendo uma demonstração exterior real do que se é, ou seja, como alguém foi capaz de agir ou reagir diante de situações adversas, que envolvia o indivíduo ou era do seu interesse, tornando um fato simples qualquer, de extrema dificuldade de resolução para os que atuam precipitadamente, com solução agressiva, quando a situação exigia uma atitude responsável, ponderada, ainda que desafiadora, mas, relacionando a autoria. Ao contrário das pseudoteorias lombrosianas e de outras teorias anteriores também cientificamente desacreditadas, e, em razão da excelsa valorização humana e dos modernos conceitos adotados pela criminologia, juridicamente, sinaliza-se uma nova conotação, pela qual só será possível se encontrar evidências de violência, quando estampados nas manifestações que existam de fato, e contra o direito, independente da sua aparência, da sua cor ou da sua raça, da sua indumentária, do seu sexo, do seu grau cultural, do seu estamento social ou do seu status econômico. Mesmo assim, estas ações devem estar efetivamente materializadas, devidamente caracterizadas conforme as leis e com a apuração devida e mediante sentença de autoridade competente, por serem ilegais e que podem ser identificadas nos gestos, atitudes, palavras e outras formas de conduta que se exteriorizam causando prejuízo a outrem, com diversificadas expressões peculiares a cada elemento ou grupo, imaginadas por eles talvez como uma forma de comunicação mais audível pelos dirigentes, urgente, urgentíssima, atitudes como ações, omissões, movimentos paredistas radicais e outras reações pouco convencionais que se externam como linguagem, isoladas ou não, casuais e até organizadas, individuais ou coletivas, cruéis, sempre comprometendo a ordem pública e que podem ao mesmo tempo confundir polícia, governo, poder e delinquência. Em síntese, com referência aos precipitados ajuizamentos preconceituosos de outrora, inclusive, à época do escravismo no Brasil em que um senhor de escravo tinha direito de vida e morte sobre seus servos, então ocorrendo alguns julgamentos feitos a partir dos caracteres fisionômicos ou de status, aqui vale exibir o texto da sábia manifestação da nossa Carta Maior (1988), no seu inciso LVII do art 5o –“ ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Tudo isto acima descrito são exemplos de violências, digamos lícitas para a época, de um passado já distante, contudo, praticadas sob a proteção do Estado, que podiam ir desde o espancamento até a morte de um escravo a um julgamento impiedoso, embasado em investigação sumária, pelo fato da pessoa ser portadora de algum defeito físico congênito que já induzia ao entendimento de uma conduta criminosa, sem que houvesse a menor censura aos autores daqueles poderes e avaliações tortuosas, ainda que abomináveis a qualquer tempo.

O processo de violência pode ser o resultado da bioquímica entre os caracteres hereditários de violência comuns a todos, que, atuando em determinadas pessoas desprovidas de qualquer proteção por ausência da compensação social, econômica e cultural, interagem com outros valores não menos defasados e adquiridos do ambiente deprimido em que se desenvolveu e habita, possibilitando, eventualmente, a promoção de uma estupidez, fato que corrobora a defesa de que a teoria da criminalidade pela causa ambiental ou do meio mostra-se dominante fato que ninguém pode desconhecer, pois o ser humano ao passo que pode alterar o ambiente também pode ser deveras influenciado pelo meio, sendo que a eclosão da violência torna-se fortalecida e mais factível pelo fraco desempenho do sistema estatal de apoio, de controle e de justiça. Como decorrência, neste processo, geralmente são envolvidas pessoas aparentemente moderadas e de todas as faixas etárias, homens e mulheres, crianças, jovens e adultos, sobretudo, sofridas e desiludidas, desesperadas, quase sem esperança, à beira de um estado de plena necessidade, de um colapso, digamos, falimentar, tudo decorrente de uma pressão radical de ordem político-administrativo, sem a mínima reparação e sem estímulos planejados, sobretudo, quando o sistema é ineficiente, aético e conturbado pela corrupção, permitindo uma liberdade sem a menor fronteira, cujo fenômeno poderia se chamar de violência reacionária, face aos descasos governamentais, em razão de políticas no mínimo equivocadas. Por outro lado, também despontam pessoas violentas que cometem assaltos, praticam homicídios, usam drogas e traficam, praticam o contrabando, fraudam concorrência pública, remarcam preços de produtos fora dos índices autorizados, sonegam impostos arrecadados, formam cartéis para manipular preços, adulteram a qualidade de produtos, exercitam fraudes e corrupções de toda sorte, cultivam práticas preconceituosas, produzem insídias e agressões de toda ordem, etc, sem motivo aparente para cometer sequer o menor desatino e ilicitude e, paradoxalmente, pertencem às classes sociais mais privilegiadas, ferindo toda lógica de quem advoga que a delinquência tem relação direta com o processo de exclusão social, ainda que esta defesa reúna vários fundamentos e que devem ser considerados. Diametralmente, encontram-se pessoas dominadas por necessidades materiais, sem o mínimo para melhor sobrevivência da sua família, postadas à beira de um pleno estado de necessidade, mas que resistem a toda sorte de tentação e praticam ações inteiramente exemplares, ignorando as “prerrogativas” que as disposições legais contidas na figura da exclusão de ilicitudes lhes conferem, ainda que passível de investigação e julgamento, preferindo a ética como a melhor atitude, a despeito de qualquer fracasso. O fato em si é penoso mas o exemplo é lindo. Na verdade, a violência é desencadeada a partir de um conjunto de fatos que se agregam e reagem, envolvendo o indivíduo com suas circunstâncias e alterando sua identidade, sobretudo para aqueles que se encontram sem governo, sem controle, sem fé e afastado de Deus. Em tese, poderíamos atribuir a este processo preocupante, como sendo o resultado do desequilíbrio entre si dos fatores social, cultural e financeiro, sinceramente crônico, qualquer que seja o status social, sobretudo para quem valoriza a lei do menor esforço, quem de tudo quer tirar vantagem, ou, simplesmente, aqueles que vivem na ociosidade, indiferentes à origem das cousas essenciais e de consumo necessárias. Normalmente, a violência reacionária que é uma forma de alerta, revela e leva a concluir pela existência de um estado de necessidade grave, a falta de oportunidade e de afirmação dos elementos de um segmento, a cisão do tecido social que os marginaliza, deprimindo, reprimindo ou libertando demais, que, por outro lado, mostra a carência e a ausência ou insuficiência dos chamados direitos da cidadania ou dos indicadores sociais, nutrindo a luta de classes e entre pessoas, sempre tendo relacionamento direto com o estado de pobreza miserável irreversível desse estamento, com as grandes desigualdades entre as classes sociais, ressalvadas exceções localizadas no tempo e no espaço, apesar das suas lutas e das suas mobilizações comunitárias. Mesmo assim, o fenômeno da violência é sempre fortalecido pelo desencadeamento de uma linguagem própria e pelo modismo os quais geram uma identidade preocupante, pela unicidade comportamental e por um momento emocional dissipado por todo o contingente em estado de exclusão ou entre aqueles com os ânimos exaltados ou junto aos que se tornam inocentes úteis, a serviço de um suposto poder paralelo. Em alguns casos, a exclusão poderá ser a gota que falta para transbordar o mar de violência. E este fator parece não aflorar às consciências das administrações públicas, acumulando riscos e criando oponentes, portanto, negligenciando quanto aos resultados, os quais têm se mostrado preocupantes, e, em muitos casos, essa violência que deveria ser abordada como fato pontual já no seu nascedouro, tem sido tratada em caráter de urgência e com remédio muito amargo, como se a rotina fosse a explosão de uma crise, mas, pouco tem respondido a estes tratamentos, isto em razão da cronicidade do mal instalado, pois se tornou resistente às várias terapias sem diagnósticos antecipados. É bom que se saiba, que os excluídos ou outros em condições semelhantes estão sempre mais coesos e mais solidários, pois o sofrimento sempre uniu fortemente mais as pessoas, mostrando-se cúmplices equivalentes. Em síntese, exclusão e desencadeamento da violência, de alguma forma, tudo se relaciona diretamente a fraqueza humana, com o meio e com a ausência do Estado como um todo e não só no campo policial. A fúria que é um sinal de incerteza passa a ser uma linguagem, um grito, um instrumento, uma arma, uma defesa, a sobrevivência, cujos resultados comprometem a segurança, mas não se relaciona com a idoneidade policial, ainda que deponha contra as instituições públicas e privadas, pois todos têm responsabilidades sociais. Quando as ações de violência são praticadas por grupos formados por pessoas diversificadas, ainda que aparentemente anônimos, via de regra, seus componentes têm procedência facilmente detectável, de pronta identificação e com rápida localização, portanto tudo leva logo ao pleno conhecimento, fazendo concluir que, praticamente, seus agentes se expõem às investigações e assumem essa possibilidade, pois são eles que mais desejam solução para seus problemas imediatos, como tal, não se camuflam com falsas aparências. Coesos, assumem seus atos em troca de respostas concretas, mesmo que haja sacrifício de alguns para o benefício de muitos. Esse procedimento diverge dos atos que produzem insegurança, onde seus autores procuram se manter no anonimato e os fazem com estratagemas e astúcia, a exemplo da prática do vandalismo deliberado entre outros crimes igualmente perniciosos e insidiosos, cujos autores agem com surpresa, empreendem fuga, mostram-se agressivos, inclusive, todo desempenho obedece a um projeto previamente elaborado ou articulado mediante plano mental, o que normalmente não ocorre numa violência natural, que tem prática mais moderada e com rara ocorrência de disfarce, tudo quase espontâneo, via de regra, casual.

A violência quando excessivamente frequente em uma determinada pessoa ou num grupo considerado poderá expressar que os espaços reservados à cultura e existentes em cada indivíduo, ainda não foram devidamente preenchidos com fatos adquiridos da civilização contemporânea que tanto caracteriza o homem moderno, ainda predominando, uma forte conservação de caracteres do homem animal, hoje inútil, pois a defesa agora está no poder da comunicação, da informação e da tecnologia, ele, com cultura de civilização decadente, sem vontade própria de mutação, cultivando apenas o que adquiriu como herança genética, atávica, refletindo traços hereditários primários, isto é, conservando a identidade daqueles atributos legados da nossa ancestralidade. O atavismo é definido como sendo o reaparecimento, em um descendente, de um caráter não presente em seus ascendentes imediatos, mas sim em remotos. (Aurélio Buarque). Como esses caracteres se conservam dominantes carecem de tempo e tratos culturais técnicos adequados e muita força de vontade de cada um para que os traços de violência se mantenham sempre em estado latente ou ocorra a mutação, acreditamos, nem sempre serem irreversível. Muitos desses fatores que tornam uma transformação mais refratária foram assimilados vagarosamente, são de concepção lenta e da mesma forma se dissipam pausadamente, conservando-se fortemente arraigados, bem absorvidos e foram inoculados ao longo de várias gerações, portanto, mostram-se geneticamente resistentes às mudanças, e para inversão, exigindo novos parâmetros, paradigmas saudáveis e exemplares, evidentemente, prevalecendo os fortes matizes do ambiente em que cada elemento foi criado, o grau de fraternidade familiar e a prioridade que os governantes estabelecem como políticas para o engrandecimento da pessoa humana como ser social. De um modo geral, o berço de tudo encerra-se na qualidade do ambiente familiar que também é a base genética de cada elemento descendente. À medida que alguém absorve integralmente uma prática urbana e se esforça para conquistá-la, exercitar e manter este conhecimento como atividade útil, logo vão sendo preenchidos aqueles vazios ou espaços reservados à cultura atual, pela inserção de ações oportunas, que em alguns indivíduos as lacunas até então eram ocupadas por ocorrências naturais, não trabalhadas e não direcionadas, até decorrentes do atavismo que é o reaparecimento de um caractere ancestral em pessoa distante, mas que se manteve adormecido e desconhecido por gerações imediatamente anteriores, mas geneticamente explicável. Portanto, em razão das peculiaridades de cada episódio, é provável que estudando detalhadamente o tipo de violência cometida, com análise de possíveis autores, relacionando os fatos, é possível se chegar à identidade do indivíduo que a praticou, alcançando com menores esforços.

Reprodução, alimentação e autodefesa imediata são funções naturais para a sobrevivência de qualquer espécie animal como assim o ser humano se inclui, e, infelizmente, só nesse estágio ainda existem e vagam pessoas e populações por todo o globo terrestre; Este indivíduo diferente no presente é o tipo que caracteriza e remete aos nossos antepassados longínquos, como ressurreição de uma distante ascendência cultural, com pouca evolução humana, fisiológica e mental, os quais ainda pretendem apenas coexistir na atualidade, até conservando-se nos limites de uma linha determinista, em que o homem é produto do meio natural e sem vontade de alterar a si próprio, deixando ser levado, como se quisesse conservar e desfrutar de um desenvolvimento de linha primitiva, sem sociedade, sem lei e sem progresso. Se ao longo dos tempos não forem inoculadas nas mentes outras atividades de uma boa civilização, qualquer elemento vai apenas cultivando aquelas funções instintivas, de fácil imitação, inatas, congênitas, isto é, praticando pouca cousa exemplar adquirida no meio social em que habita, senão copiando fatos muito elementares e defasados, já perdidos no tempo. No atual estágio da civilização caracterizada pelas transformações tecnológicas e científicas e, pela velocidade das comunicações, todo tipo de comportamento esdrúxulo, ridículo, desse ou daquele grupo talvez, hoje, possa ser reflexo mais de uma violência institucionalizada pelo descaso do sistema e pela indiferença da promoção social do que uma variante da violência essencialmente humana herdada de ancestrais. Tudo isto deve ser levado em conta. Não se pode entender, a essas alturas, a razão de qualquer sistema político-administrativo permitir que existam segmentos sociais com hábitos e costumes quase rudimentares e com desenvolvimento incompleto ou imperfeito, tudo confirmado pelos índices da violência pública, com seus membros estacionados no seu estado ainda quase ao natural, como é o caso do percentual de pessoas analfabetas existentes para a vergonha de certos governos, se é que isto os incomoda, como se o mundo estivesse parado no primitivismo da humanidade, sem interesse de reagir, ainda que analfabetismo não seja sinônimo de violência, mas que pode sentir dificuldade de entender o caráter criminoso de qualquer fato ilícito praticado por si e por outrem. Hoje, qualquer ato de violência faz levar pelo menos ao tempo medieval, portanto, contrastando com o atual desenvolvimento humano, pois o referencial é o fator social, mesmo a despeito das fracas iniciativas públicas.

A violência natural isolada e com outras classificações, desde que de natureza leve e com rara incidência, pouco interferem no cotidiano da população como um todo, senão, entre as famílias das partes envolvidas, e, no máximo na área circunscrita aos fatos. Digamos, se ocorre um fratricídio, matricídio, parricídio ou cousa assim, isto não repercute na tranquilidade da população como um todo, senão, no ambiente familiar, no campo moral, mesmo que afete a ordem e a lei, porém, merecendo toda atenção do Estado, sendo por todos, um fato lastimável; se alguém comete um isolado homicídio ou outro delito contra seu cônjuge, isto também não interfere na qualidade de vida das pessoas outras, pois se tratam de fatos restritos, pouco explicáveis, mas factíveis, mesmo entre aqueles que na sociedade também se enquadrem como cônjuges; se dois elementos discutem e se atritam, também não é motivo de preocupação coletiva, quanto à tranquilidade pública. Normalmente, a violência em si é um fato isolado que já aconteceu e que não estabelece qualquer influência ou ligação com o desencadeamento de futuras ocorrências similares, e, mesmo que ocorram semelhantes, não guardam relacionamento uma com as outras, sendo sempre questões pessoais, isoladas, particulares ou próprias de certos estamentos, mesmo que quaisquer deles devam receber o tratamento adequado pelos poderes públicos, inclusive, de prevenção e penal.

Se a violência pode ser admitida por muitos como uma forma de expressão humana pela incerteza de futuro ou um reflexo da ausência de indicadores sociais, no entanto, o que dizer das fraudes, do estupro, do sequestro, da pistolagem, do assalto, de um crime em série, do roubo a um banco ou qualquer delito hediondo, organizado ou planejado para locupletar seus autores, da corrupção praticada por servidor público do alto escalão e bem aquinhoado? Com certeza estas ilicitudes drásticas apenas são exclusivas de poucos para o nosso bem estar, o que leva a crer e sem deixar dúvidas que não se trata de uma violência natural e que também não se pode fazer nenhum relacionamento à conduta humana primitiva, mais sim, caracteriza outro comportamento que transcende ao legado humano, à hereditariedade direta ou ao atavismo, no caso, mesmo que seja patológico, é possível se tratar de um fenômeno característico da insegurança pública, pela ausência de ações policiais e afins que compete aos órgãos de segurança a pronta e necessária atuação, preferentemente, a prevenção e sempre a aplicação da lei, fazendo o quanto antes, urgente mesmo, responsabilizando os já envolvidos, para não se produzir mais vítimas nem mais outros criminosos que passarão para a tutela do Estado, afetando suas finanças, além de comprometer a reputação do povo brasileiro no concerto mundial. É claro que a lei existe estabelecendo os fatos delituosos, suas caracterizações e suas penas, mas isto nunca foi suficiente, é necessário que a polícia continuamente esteja praticando uma ação inibidora do cometimento de ilicitudes, pois o crime é como o mal, ele sempre está orbitando no ambiente, exigindo prevenção.

A insegurança, que não deixa de emanar dos diversos tipos de violência humana, herdada ou adquirida, sobretudo, deriva do conjunto de atos e violações diversas, com ou sem causa social a reclamar por seus agentes, portanto, independente ou não da exclusão social, o mecanismo que move suas execuções é pura delinquência dolosa, acentuando elevado grau de arbitrariedade, pela ausência de objetivos de vida e falta de compromisso, o imediatismo, inexistência de planos para o futuro, múltiplos e deliberados desrespeitos às leis, pela ganância, pela fraude, pelo oportunismo ou ocasião especial súbita que surge e sabe tirar proveito criminoso, pela ambição, pela astúcia, pelo anonimato, pelo espírito aventureiro inconsequente, por não valorizar a liberdade e nem a própria vida, pelo estilo nômade que sabe assumir, pela cumplicidade criminosa, pela impunidade estabelecida e, sobretudo, motivada pela função policial aparente e indiferente e até por quem se submete a protegê-lo, inclusive pela própria lei que, mesmo depois de cometer tantas atrocidades, as disposições legais, ainda asseguram o direito a uma ampla defesa, concede redução de pena privativa de liberdade, etc, como se exista algo que possa justificar tanta barbaridade. Dura lex sed lex. A prática de um ato ilícito que possa caracterizar uma insegurança pública é aquele que prediz a possibilidade do desencadeamento de outros semelhantes ou relacionados. Portanto, uma simples ação criminosa não será suficiente para determinar um estado de insegurança preocupante em toda a sociedade, senão para as suas possíveis vítimas, logo, carece da probabilidade de sua multiplicação numa mesma região ou com possibilidade de imigração iminente para causar pânico numa população, caracterizando a insegurança. Os exemplos mais clássicos e de grande repercussão, aterrorizando mesmo, são os chamados “crimes em série” que são praticados ao longo de um tempo, aqueles cognominados de “chacinas” e os denominados juridicamente de latrocínios, os atos ilícitos praticados pelas gangues nos seus arrastões, entre muitos, todos factíveis a qualquer tempo, contra qualquer pessoa, enquanto seus autores não forem devidamente capturados de direito e de fato. Alguns crimes, mesmo que a princípio praticados isoladamente, induzem a um estado de intranquilidade e insegurança pública, por exemplo, as ondas de assalto, os delitos praticados pelos justiceiros ou pelas milícias delinquentes, o terror, entre várias outras selvagerias. Em não sendo prevenida, ao menor indício de qualquer insegurança, antes que afete a consciência, a integridade física e o patrimônio das pessoas, tudo pode e deve ser imediatamente rechaçado a altura, pela polícia, pela opinião pública e pela imprensa como uma força viva, cada qual à sua forma, sobretudo, com a cobrança devida.

A princípio, os atos que podem gerar insegurança provocada por grupos ou elementos criminosos mesmo que alguns não sejam primários, que também podem ter suas raízes numa histórica violência herdada, ainda que esteja atuante nas pessoas ascendentes próximas, cuja herança genética se transmite às gerações, ou até eclodir num descendente distante, e, independente do legado social ou do grau de favorecimento econômico de cada um, portanto, todo este caráter delinquente pouco se relaciona com atavismo, pois cometem crimes com a vontade deliberada de praticá-los. Assim, o desencadeamento de suas atividades criminosas sempre está muito mais intimamente identificado com o distanciamento dos órgãos de segurança do contexto da prevenção à delinquência, divorciados mesmos de suas funções policiais preventivas objetivas, negligenciando quanto aos acompanhamentos das ações pré-delituosas que neste estágio ainda são de poucas proporções e de fácil controle. Essas violências sempre são produzidas de forma deliberada pelos delinquentes, com dolo, como se não existissem barreiras morais e nem fronteiras legais e cometem sem censura, e as fazem de maneira generalizada e constante, sendo mais ou menos intensa quanto menor ou maior for o poder de articulação da polícia, seu desempenho ao desvendar os fatos em tempo hábil e sempre mais abreviado, seu conceito profissional na sociedade, o grau de condescendência em relação aos crimes e aos criminosos, o domínio das informações precisas e procedentes e o poder de mobilização de seus arsenais bélicos operacionais, inclusive, os recursos humanos e o capital intelectual, estes, como armas essenciais e principais, com emprego desde o início do combate à “vitória” necessária. Convenhamos, há necessidade premente de uma Polícia de Inteligência Preventiva. Prevenir é a melhor receita.

A insegurança é um comportamento anômalo, grave, levado a efeito contra segmentos da sociedade sendo caracterizado por uma sucessão de práticas voluntárias e generalizadas de delitos, sempre consumadas por um elemento ou mais indivíduos ou mesmo por bandos, quadrilhas e seus seguidores que dissipam suas atrocidades contra o patrimônio material, a honra ou a integridade física ou moral das pessoas, configurando-se pela existência de um objetivo malévolo imediato, com dolo, organizado ou apenas planejamento mental, inconsequente, frio e calculista, normalmente, com boa dose de agressividade, com ou sem conexão com alguma cadeia criminosa, persistente, global, sem trégua, com cumplicidade e corrupção, e, com a benevolência daqueles que, à distância, dão suporte ou alimentam os fatos, onde todos objetivam locupletar-se a qualquer custo, a despeito de qualquer resultado ou consequências, inclusive, prevendo a possibilidade de produzir vítimas a esmo ou seletivas, sobretudo, vitimar-se, até de ser capturado em flagrante ou resistir à repressão policial de forma imoderada, inconsequente. Não existe bandido mais perigoso, todos têm o mesmo grau de periculosidade, apenas é uma questão de oportunidade, e a polícia se engana quando assevera que prendeu o criminoso mais perigoso ou mais procurado. Todos são iguais na escala de desvalor. Todos devem receber o devido castigo legal, pois são igualmente nocivos. A insegurança se caracteriza pela sensação ou efetiva incerteza que domina o íntimo das pessoas de uma população, em razão de uma sucessão de atos delituosos generalizados ou de uma mesma espécie e com muita repercussão ou de crimes em série, com elevado potencial de novas práticas, diante de uma tímida ação policial, sedimentando o medo e o pavor, deixando a sociedade bastante intranquila e, consequentemente, insegura. Via de regra, a insegurança, que é por todos abominável, atinge contingentes populacionais consideráveis, ante as inócuas reações da polícia; por conseguinte, a população sempre relaciona os fatos com a possibilidade da morosidade policial, fraco desempenho governamental, emergindo interpretações que depõem contra a eficiência das instituições de segurança pública, discutindo suas substituições, desacreditando-as, propugnando por medidas radicais, policiais e penais, portanto, exigindo melhor postura e uma posição eficiente dos órgãos de prevenção e repressão para urgente inversão da situação.

O ato de insegurança, no mínimo é premeditado, enquanto a violência em si é instintiva, às vezes, putativa, que se encerra pela preterintencionalidade, podendo ser um reflexo condicionado em cada pessoa, ocasionada pelo medo em alguns, uma defesa natural do indivíduo ou simplesmente uma reação àquilo que lhe oprime ou que lhe massacra, ferindo valores morais que o impulsionam a alguns fatos impensados e até imprudentes, quando muito, a violência natural não ultrapassa à figura legal do “estado de necessidade” ou da “legítima defesa”, ressalvadas exceções. Como premeditada e como insegurança, alguém sai para a prática desse ou daquele delito, a exemplo quando um bandido imagina um assalto e ruma à sua execução, seleciona sua vítima, elege os melhores locais, estabelece a rota de fuga, elenca seus apoios, as armas necessárias e tantos outros meios e diligências que entram na composição de um crime quase que perfeito, ensejando uma crise e uma preocupação. Aquilo que for planejado mesmo pelos criminosos sempre acontece, pois o mal para se estabelecer dispensa certas formalidades, até porque nada resiste ao fator surpresa. A insegurança começa com um trabalho em equipe. Quem pratica um delito assim, sempre imagina estar fazendo um crime perfeito; isto é impossível, pois tudo deixa rastro, esquecendo que a Polícia sabe caminhar por ele no sentido inverso ainda que, às vezes, claudicando, já que não soube se antecipar aos fatos.

Mesmo que os atos de violência passem pelas características genéticas da pessoa humana e que a ação possa representar uma denúncia ou um indicativo das condições sociais, em qualquer caso, se não houver uma oportuna prevenção, carece de uma pronta repressão e responsabilização dos autores, antes que um pequeno delito se transforme num estado de insegurança, implicando na adoção de atitudes policiais compulsórias eficientes, eficazes e constantes; nada pode ficar impune, porém, não vamos deixar que o mal se mantenha em rota de expansão, para que mais tarde alguém possa dizer que a situação está insolúvel e que carece de pronto enfrentamento, como se tudo fosse um estado de guerra, agravando mais ainda o quadro, ou que ardilosamente alguém possa tirar proveitos politiqueiros, trazendo a solução na ponta da língua. Enquanto isso, o infanticídio, o aborto, o crime passional, o estupro conjugal, o castigo físico aos filhos, o embate entre familiares e tantos outros atos de comportamento similar, mas circunscrito, ainda que possam causar um choque, uma perplexidade e uma desaprovação geral, não são suficientes para causar um clima de insegurança junto à população, ao contrário de um único assalto, por menores que tenham sido suas proporções, logo toda população sente-se ameaçada, atingida, insegura. Enquanto que um ato de violência isolada pode causar dano a uma pessoa ou a um segmento específico, aquele que produz insegurança, mesmo que a ação tenha atingido apenas uma única pessoa, logo causa repercussões diretas contra o público, vitimando emocionalmente a todos, ou seja, abala a segurança pública, até então incólume.

A violência isolada, como atitude humana e antijurídica, esbarra e se encerra exclusivamente entre as pessoas de uma mesma concepção e afinidades ou nos limites das fronteiras do território de seu ou seus agentes, que, mesmo assim, deve ser estudada, analisada, prevenida e, se for o caso, combatida. A insegurança se instala, quando essa violência transcende aos limites destas fronteiras, evolui, amplia-se invadindo território não enquadrado nos domínios dos agentes ou envolve ou atinge outras pessoas e circunstâncias diversas daqueles, preocupando a todos.

Podemos aqui, fazer uma comparação prática para exemplificar o exercício de uma violência em um anfiteatro e a possível instalação de uma insegurança real, mesmo em ambiente tido como de certa esportividade e tradicionalismo, mormente, em territórios de cultura milenar. Tomamos um possível “esporte” como amostragem, se é que podemos chamá-lo de esporte, em que praticamente um só esportista vai competir como centro das atrações. Trata-se de uma arena qualquer, onde se desenvolve um espetáculo medieval sangrento, violento, mórbido, absurdo e reprovável, que é um sacrifício quase macabro, para a satisfação de um grande público, cuja diversão é chamada de tourada. Ali, logo se coloca um touro devidamente furioso pelos maus tratos que lhe oferecem para condicioná-lo à luta, pelo sofrimento ainda mais cruel a que se submeteu nos bastidores da arena minutos antes de entrar em cena e pelas suas qualidades genéticas conservadas para esta triste e covarde disputa. Ao entrar já começa perdendo. Para alguns é puro lazer. Antes de ser satisfação é puro sadismo. À sua frente, um homem chamado de toureiro que já o esperava e envolto em uma justa e elegante indumentária colorida e reluzente, com sua capa protetora, ao som de uma música, este, com formação e treinamento ao longo dos tempos e até por linhas de herança, sempre aplaudido, apresenta movimentos estudados e teatrais que impressionam aquela plateia ávida por uma sessão de tortura. O animal que logo avança enfurecido por um sofrimento continuado e muito anterior, sem opção e já em desvantagem, assaz debilitado e assustado, busca seu adversário que se safa. Prontamente, inicia-se uma duvidosa batalha e ali são desenvolvidas lutas desiguais, nas quais o touro não tem escolha e dispõe de pouca defesa, o toureiro se disfarça ao lado do seu manto vermelho ou capa de defesa, esforça-se pelo entusiasmo da torcida, glorificando-se, enquanto pratica movimentos performáticos com uma coreografia tida de inegável beleza, ainda que não haja unanimidade. Enfurecido pelo sofrimento, o animal já ferido avança e logo recebe uma estocada, seguidamente, outra e outras. Em cada estocada no corpo do animal são encravados farpas ou arpões, enquanto toda a plateia se esforça em aplaudir o herói da tortura, que pode culminar com a morte do animal para o deleite de muitos que pagaram para assistir um ato de crueldade extrema, até um prazer sádico, que, conforme a tradição do lugar, o sinistro divertimento é finalizado com a chegada do matador ou ‘‘bandarilheiro’’ que põe em prática seu ritual de crueldade, cuja plateia delira com a matança do touro e com as partes cortadas que são arremessadas ao público que se diverte. A violência sangrenta chega ao fim. Aqui termina o possível espetáculo deles, que, para nós, podemos chamar aquela prática esportiva de “violência coletiva” ou simplesmente violência sem causa. Naquele terreno ou simplesmente praça de touros, epicentro do tal espetáculo vergonhoso, em local limitado e protegido por belos alambrados, todas as atitudes ali praticadas são, essencialmente e sem discussão, atos de pura violência. Enquanto a luta de tortura permanece no espaço que lhe é reservado, a plateia se deleita e o clima de satisfação é mesmo contagiante. É o culto ao sacrifício de animais. Em casos, não muitos raros, o touro bastante provocado e impulsionado pelas dores das estocadas e até em busca de um picador ou do toureiro que salta e se evade como defesa covarde fugindo da arena, o animal também salta o picadeiro e corre a esmo por onde o espaço permitir, enquanto alguns procuram abatê-lo impiedosamente. Os fanáticos ou aficionados sentindo-se inseguros, logo entram em pânico, alvoroçam-se, clamam por proteção e entram em desespero. Todos buscam uma saída mais segura. Gera um grande conflito. A multidão estoura, entra em pânico. Esta visível ansiedade coletiva pode ser admitida como sendo a caracterização da insegurança. Note que a violência no centro da arena se desenvolvia e evoluía sem causar constrangimento aos que assistiam, e sim uma sinistra satisfação, mesmo que estivesse sendo insuportável para o touro e até para o intrépido toureiro. Até aí era uma violência qualquer que, mesmo inaceitável, não causava intranquilidade pública. Agora, quando o animal rompe os limites da praça de guerra sangrenta e salta na direção das arquibancadas ou cousa assim, gera um clamor, instala-se uma generalizada insegurança em todos. Era como um fato violento estivesse saindo de seu nicho e do seu território, para vitimar qualquer um, a qualquer tempo e lugar por onde o animal passar, preocupando toda a plateia presente com repercussões externas. Configura-se aquilo que podemos chamá-lo de in-segurança. Como se nota, iniciada a insegurança, os atos de violência não se acabam, pelo contrário, ampliam-se, em qualidade e quantidade, independente da sua origem, sem uma perspectiva de iminente controle. Na verdade, essa tauromaquia que é a arte de torturar e matar nunca foi esporte e nem arte, muito menos glamour, não é tradição e nem cultura como muitos propalam, pode até ser um culto macabro de sabor medieval, cuja violência teatral remete aos rituais de sacrifício da antiguidade, outrora, igualmente condenável. A tourada não é deleite, não é colírio, não é espetáculo, não faz bem, não é lazer e nem hobby, não é ponto turístico, é desnecessária, em resumo, trata-se de uma tortura, uma covardia, uma atrocidade, portanto, uma violência para os violentos, estimulando atrocidades.

Por fim, insegurança é todo ato ou tudo aquilo que aconteceu em série ou que se generaliza ou de forma análoga e que pode ocorrer novamente ou continuamente, a qualquer tempo e em qualquer lugar, contra quem quer que seja ou por qualidade do indivíduo, causando danos pessoais e/ou materiais. É aquilo que deixa a população temerosa, intranquila, portanto, insegura. É o caso de assalto aos coletivos urbanos ou rodoviários, cujas ações deixam os usuários destes transportes com medo de utilizarem para suas viagens; é a explosão de uma agência bancária; é o tiroteio polícia versus bandidos; são as balas perdidas; são os assaltos nos cruzamentos que fazem com que os motoristas fechem os vidros dos seus veículos e não queiram ficar parados aguardando a mudança do semáforo ou farol evitando correr risco; é tudo aquilo que sugere a blindagem de seus carros ou colocar películas com um mínimo de transparência para cruzar incólume os espaços no trânsito; são as armas contrabandeadas e outras vendidas na feira; são as armas roubadas dos quartéis e de quem as possuem legalmente; é a lei do silêncio que obriga a uma comunidade a se manter calada e quase cega; é o fechamento do comércio em obediência ao chamado poder paralelo; são os atos terroristas; são os fatos delinquentes que forçam aos moradores a permanecer mais trancados em suas residências e cerrem suas portas e janelas com grades de ferro e instalem sistemas eletrônicos, enquanto outros põem suas casas à venda, mas em vão, além daqueles que mudam de cidade. Em fim, é tudo aquilo que o povo com medo clama por segurança, enquanto os bandidos fazem suas vítimas, protegidos pela impunidade. Geralmente os atos delinquentes que promovem a insegurança pública, instalando-se em cada pessoa, seus autores buscam locupletar-se materialmente, sobretudo, pelo lado financeiro, político ou ideológico, e, em algumas regiões, com cunho religioso, enquanto os objetivos os tornam inconsequentes ao extremo, sendo, em qualquer caso, capazes de causar a mais fria atrocidade contra suas vítimas, principalmente, quando ocorrem reações ou imaginam terem sido identificados; quando não financeiras, suas intenções buscam uma satisfação bestial de cunho íntimo ou de poder delinquente, como é o caso de estupro e outros crimes afins ou quando algum elemento com ressentimento interno passe a molestar algum tipo, gênero ou qualidade de pessoa em razão de algum trauma, preconceito ou desvio, como as discriminações raciais, regionais, religiosas ou quanto ao sexo, entre outros constrangimentos que é comum chegar à prática de agressões morais e físicas com qualquer dimensão, com alvos seletivos ou escolha aleatória.

Nos casos de violência pura ou natural, normalmente, os fatos não são movidos por interesses materiais e financeiros, exceto quando se estabelece o estado de necessidade em um elemento ou num grupo, portanto, tudo pode ser encerrado como violência isolada, ao acaso, mesmo que não se possa ignorá-la; por exemplo, se alguém revida drasticamente uma agressão verbal, fato que ocorre rotineiramente em todos os lugares do mundo, no entanto não constitui grandes preocupações junto à população que possa intranquilizar os habitantes de uma cidade ou de uma região de qualquer porte, salvo se o comportamento passe a se generalizar, envolvendo qualquer pessoa, indiferentemente da qualidade da vítima.

Ainda existe um tipo de violência que não se externa tão ostensivamente, logo, surda, mas que afeta a todos ao mesmo tempo, é um tipo de violência silenciosa, às vezes virtual; ela se caracteriza por ações sórdidas, lesivas e dissimuladas, levadas a efeito nos bastidores, que avançam numa escala de valores assimétricos, onde a prática se contrapõe às próprias teorias dos pregadores, que, além de ferir a lei penal, também abala o campo da ética e o plano moral, com graves consequências para o espaço estrutural e social, ao mesmo tempo, depondo contra o Estado e outras administrações igualmente passivas e ineficientes. Essas atitudes ilícitas vão desde uma pequena fraude a um ato de grande corrupção, envolvendo tanto o poder público como setores de domínio privado, formando quadrilhas compostas por servidores, colaboradores e grandes agentes financeiros, contribuindo para o avanço do descontentamento da população, desacreditando as instituições e concorrendo para a decadência da grandeza humana, com implicações de toda ordem, afetando decisivamente a estrutura familiar, social e política de um povo, por consequência, a segurança pública, evidenciando toda sorte de violência e insegurança generalizada, pois a corrupção corrói a estrutura social de todos os segmentos sociais, causando exemplos de nível subalterno.

Urge que as instituições de segurança pública passem a incluir nas suas estruturas orgânicas, profissionais especializados em estudos da violência humana e as formas de neutralizá-la com um mínimo de esforço policial para que haja menos desgastes, antes que ela decomponha a ordem jurídica de uma comunidade ou de uma sociedade transformando uma simples violência numa in-segurança irreversível.

Por fim, de tudo que foi avaliado, pode-se dizer que a simples Violência ela se manifesta mais como forma de Reação que é uma defesa iminente, enquanto que na Insegurança, a Violência se desencadeia como uma Ação, que é um ataque. Reação é um fato instintivo e uma consequência, enquanto Ação é um ato imaginado; portanto, agir é pensar é calcular é planejar e é também uma articulação. O criminoso “pensa”, “arquiteta” e “faz”. Afora tudo isto, outra conduta trata-se de desequilíbrio mental, ainda que se configure uma forma excepcional de violência humana e que igualmente se sujeita às imposições legais. Destarte, chega-se à conclusão de que se pode associar a Violência à 3a Lei de Newton que é conhecida como “Lei da ação e reação”, logo, para cada Ação, uma Reação. Também se admite como verdadeiro o entendimento popular de que Violência gera Violência. Também gera violência, o desinteresse pela segurança pública, por via de consequência, dissipa-se a Insegurança.

“Abaixo a Violência”!

... (Continua com o título Violência & In-segurança (2) -continuação.