A SEGURANÇA DA CERTEZA

Considerando-se que todos nós contamos com alguma atividade que demanda certo período de tempo para ser executada, entende-se que diariamente, muitos de nós acordamos em um horário pré-estipulado para trabalhar ou estudar. A partir do momento em que o despertador – ou até mesmo o galo – marca o início de um novo dia, a programação começa – sim, porque a existência humana, ao longo dos milênios, vem sendo marcada por “scripts”. Acordar cedo, realizar a higiene pessoal, vestir uma roupa adequada, deixar o ambiente seguro e tranquilo do lar para buscar o progresso em uma arena de perigos e incertezas, repleta de outros seres humanos também plenos de expectativas, anseios e dúvidas.

Somos padronizados. Existe um conceito geral e inconsciente a respeito do que é bem aceito como moral e ético. Deixar a atmosfera doméstica em uma constante procura por uma recompensa. É com este fim que impingimo-nos o estudo e o trabalho. O ato de estudar fornece o conhecimento; com este conhecimento, estamos aptos a praticar algum tipo de trabalho, que por sua vez constrói. Porém o quê exatamente? Um mundo mais justo, talvez? Um ambiente onde todos os seres viventes cooperam com o progresso alheio? Ou é simplesmente uma maneira de garantir o piso e o teto de cada dia?

Outras perguntas, de semelhante teor, poderiam ser feitas ao sistema educacional. Por que precisamos das informações adquiridas nos bancos escolares? Quem definiu as matérias que devem ser estudadas? Por que estas e não outras? Por qual motivo o sistema professor/aluno funciona de modo que, teoricamente, uma pessoa detém o total conhecimento com a incumbência de iluminar mentes imersas em trevas?

Não me atreverei, neste artigo, a discutir questões tão complexas que demandam o entendimento de aspectos histórico-culturais da trajetória do homem. Aqui, a constatação particular foi dita no segundo parágrafo: somos padronizados. Dificilmente nos atrevemos a tentar responder perguntas como essas porque estamos respeitando um roteiro, um manual de instrução, um regulamento. Basta observar como o homem se sujeita a sempre o mesmo cotidiano ou, pelo menos, semelhante.

O que é o conforto? É criar um mundo de certezas absolutas. Saber responder a tudo, a fim de evitar a neblina do que é apenas deduzido ou estimado. Existem rótulos previamente impressos e prontos para aderir em todas as diferentes nuances do comportamento humano. São os nossos estereótipos. Os moldes que usamos para explicar a própria diversidade. Estão disponíveis para todos os gostos: homens, mulheres, adultos, adolescentes, crianças, brancos, negros, magros, gordos, altos, baixos... Ao se deparar com tais características, o cérebro humano trabalha de modo a encaixar todos em fôrmas. A razão deve explicar. Não admitimos simplesmente enxergar como está.

Por isso, o novo incomoda. O novo é um desafio. É a antítese do que já se foi compreendido, estudado e analisado. Mas esta novidade requer, muitas vezes, uma mudança de paradigma. Será que vocês estão convictos como eu de que nós estamos sempre a resistir a uma quebra da percepção como já nos acostumamos? Quem sabe, a convicção também seja uma qualidade extremamente humana, pelo seu caráter recusativo de dúvidas.

Não questionamos convenções como trabalho e estudo porque não queremos incertezas. Em nossa cultura, vacilar é negativo; ideal é ter experiência e saber o que fazer em quaisquer situações. Mesmo aquelas nunca vividas. Além disso, somos todos frutos de uma linha de produção. O questionamento ao que é aceito por todos não é praticado porque simplesmente ninguém o faz. Tomar a iniciativa para isso significa implantar o novo e desconfortável paradigma.

Trabalho e estudo são as variantes que citei. Todavia, podemos pensar no comportamento humano como um todo. Uma mudança de cidade, um novo relacionamento, uma nova orientação... Todos são fatores que fogem do “script” a que nos adaptamos. E, por mais que o progresso transcorra velozmente, o tal “novo” sempre representará um enigma de difícil solução para criaturas tão complexas como nós. Afinal de contas, menos autocompreendidos ficamos justamente no momento em que mais tentamos arrazoar tudo à nossa volta.

Andre Mengo
Enviado por Andre Mengo em 27/07/2012
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