DEPRESSÃO INFANTIL

Nesse mundo de hoje, no qual os diversos estímulos das tão rápidas transformações sociais agitam todo o funcionamento da vida e das relações pessoais, nem mesmo as crianças estão imunes às doenças psicossomáticas, aquelas nas quais a alteração do processamento das emoções no complexo funcionamento da psiquê afeta de forma drástica o bem estar físico e social.

A depressão, uma tão prevalente doença da esfera psiquiátrica tão incidente na vida adulta dos tempos modernos de todo o planeta, entidade muito bem definida na sua manifestação clínica, vem acometendo assustadoramente e de forma muito prevalente também as crianças, inclusive as de tenra idade, sendo impressionante como o meio atua de forma facilitadora e negligente para o estabelecimento do distúrbio, nem sempre identificado a tempo de se proteger os pequeninos.

Neste contexto, o presente artigo tem por objetivo alertar os pais e os educadores, bem como os domésticos cuidadores infantis, que hoje em dia se tornaram referência no acompanhamento e na percepção do status e das nuances do desenvolvimento de muitas crianças e adolescentes, sobre algumas mudanças de comportamento que devem ser valorizadas para que uma ajuda especializada possa ser buscada a tempo de se impedir a progressão e a gravidade da doença, bem como seus graves danos ao "funcionamento" infantil.

Primeiramente é importante ressaltar que os pais ou responsáveis quebrem os paradigmas mitológicos existentes no entorno da doença, aceitem o diagnóstico quando ele se fizer imperativo e confiem nas orientações dadas pelas equipes multidisciplinares da saúde.

Não é incomum que as crianças rodem tempos com o diagnóstico feito por especialistas, sem que os pais resolvam aceitá-lo, posto que não há com se resolver o problema fugindo dele, ou o escondendo dentro das íntimas paredes do lar.

É preciso pró- atividade dos responsáveis para o enfrentar tanto a resolução dum evento depressivo como o posterior controle e seguimento da doença, que muitas vezes pode ser indicativa de futuros problemas psiquiátricos maiores.

É preciso também que as resistências culturais em torno das medicações sejam superadas porque o tratamento foca cientificamente a gênese química da doença e, em alguns casos, ainda que possa não curá-la, muda totalmente a história de vida da criança, que se não devidamente tratada tem sua qualidade de vida extremamente deteriorada pelo intenso sofrimento, inclusive o da família.

Sintomas e sinais como irritabilidade, agitação, baixo rendimento escolar, esquiva das aulas (inclusive pelos bem pequeninos), choro fácil alteração do biorrítimo do sono, sinas de ansiedade como "terror noturno", choro fácil, falta de concentração, apatia, desligamento, quietude, isolamento, agressividade, enfim, tudo aquilo que aparece de forma estranhamente nova alterando o todo do antigo comportamento infantil merece ser valorizado e investigado com acuidade e zelo.

Sintomas físicos vagos e persistentes e que não se ancoram em diagnósticos orgânicos, tampouco nas angustiantes provas laboratoriais sempre normais, são fortes fatores de alerta, preditores da possibilidade diagnóstica.

Assim, as tão comuns dores de cabeça, as dores de "barriga", as tonturas, os desmaios, as dores nas pernas, a fadiga fácil, o desânimo, todos inexplicáveis, devem ser valorizados como "a voz do corpo" que declama o oculto "sofrimento da alma" infantil.

Os fatores ambientais também são de extrema importância para que se possa identificar as causas deflagradoras do episódio depressivo: alterações nas dinâmicas familiares, excesso de compromissos (tão comuns na vida infantil de hoje em dia), inclusive os compromissos que "a priori" poderiam significar lazer como, por exemplo, os excessos de atividades desportivas e de estímulos eletrônicos.

Hoje sabemos que a tela do computador, em demasia, altera o padrão do sono repousante e a má qualidade do sono gera um terreno propício à instalação da ansiedade a outra face da mesma moeda depressiva.

Assim, estabelecido o episódio depressivo o sono se degenera criando-se um círculo vicioso à manutenção da fase ansiosa e de seus efeitos deletérios à saúde das crianças.

A escola é também um compartimento social de fundamental importância na suspeita do diagnóstico, no qual a coexistência de muitos fatores pode contribuir para o aparecimento da doença e hoje o Bullying, mesmo nos pequeninos, é uma arma potente de degeneração da estrutura emocional normalmente provida dos recursos egóicos de defesa psíquica.

Portanto, é de fundamental importância que "escola e família" trabalhem a mesma língua de observação , percepção e orientação das atividades de vida das crianças.

É deveras salutar que criança seja criança.

Um ambiente saudável, não estressor, facilitador e incentivador das atividades lúdicas, desportivas e curriculares, todas balanceadamente promovidas com atenção integrada, respeito pelas diferenças e valorização das capacidades individuais, decerto serão uma excelente profilaxia desta tão lamentável realidade que afeta o nosso mundo comtemporâneo, insensivelmente tão competitivo: a depressão infantil.

A infância deprimida e sem norte decerto que haverá de sensiblizar àqueles que trabalham pela instrumentalização dum futuro saudável e feliz.