GRANDE PORCARIA!!

É proposital o título chocante.

Esta minha reflexão de hoje baseia-se no capítulo 3 da carta de Paulo aos filipenses. O apóstolo é um verdadeiro pastor, preocupado com as ovelhas do Senhor chega a este capítulo orientando-os a serem muito cuidadosos com os falsos mestres, que aqui ele chama de cães, é bom saber que cães naquela época não tem nada a ver com a imagem de hoje. Hoje os cães são verdadeiros xodós, a figura de um cão hoje, inspira carinho e afeição, mas naquela época os cães viviam em matilhas em busca de comida, sempre latindo e agredindo. Era uma imagem muito negativa.

Paulo foi duro? Certamente, pois era necessário, muito diferente dele, os judaizantes a quem ele chama "carinhosamente" de cães, não pensavam como o apóstolo. Não devemos confundir judaizantes com judeus, estes mantêm sua esperança na Lei, aqueles haviam se unido aos cristãos na fé em Jesus, mas, qual o problema? O problema é que apesar disso, estes não abriam mão da sua "valiosíssima" herança, e o orgulho de serem os herdeiros da promessa, da Lei, dos profetas e até do Messias. Para eles não bastava ser apenas povo de exclusiva propriedade de Deus, mas o próprio Deus era visto como sua propriedade, assim como seu Cristo, o Messias. Sendo assim só havia uma maneira dos gentios receberem a Cristo, tornando-se judeus, obviamente. Daí a insistente necessidade de circuncidar a todos. Tanta arrogância, irritou Paulo grandemente. Pois, não lhes bastava serem rigorosos entre eles, queriam levar o rigor a todos, desta forma, os afastava totalmente da graça de Cristo.

O apóstolo aos gentios jamais aceitaria inerte tal investida destes legalistas fanáticos. Por isso, admoesta-os a entenderem que a verdadeira circuncisão não era a feita na carne, mas a do coração. Ou seja, não são as regras que os tornariam merecedores da vida eterna, não existe nada mais carnal que confiar em si mesmo, em seus próprios méritos para ser aceito por Deus. O cristão que compreende o Evangelho sabe que nada o torna mais próximo de Deus que andar no Espírito, e este andar nada mais é do que uma total entrega e dependência de Deus.

Onde estava a confiança dos cães? Justamente naquilo que Paulo era expert, doutor e herdeiro. Tais homens se achavam especiais por sua herança étnica, religiosa e moral. E é aí que o apóstolo entra com sua biografia da mais alta patente, cheia de "pedigrees" e reputações. Quem mais que ele poderia orgulhar-se por sua herança nobre, por sua educação, por seu favor e zelo religioso? Paulo superava a todos, era muito mais zeloso e fervoroso, além de ser um legítimo descendente da sua nação.

Contudo, Paulo, que tinha antes grande rigor, zelo e admiração por sua religião e herança, ao ponto de ter se tornado um grande perseguidor dos primeiros cristãos, encontrou-se com Cristo a caminho de Damasco, um encontro dramático que levou o fariseu de Tarso a refletir seriamente sobre sua fé, e depois de compreender por obra do Espírito Santo em sua vida, não teve outra decisão a tomar, senão a de reconhecer que tudo o que antes era extremamente valioso para ele, agora não passava de "skubalon" - "a porção não nutritiva dos alimentos refugada pelo organismo", ou seja, bos..., bom você já sabe. É claro que nenhuma das traduções bíblicas traz esta palavra, todos os tradutores procuraram usar um termo mais fácil de ser assimilado por todos, assim nós vamos encontrar os termos: "lixo", "refugo", ou "esterco", este último o mais próximo, mas que ameniza bastante a palavra de Paulo, afinal, esterco é algo útil. Mas, a realidade é que o ex-fariseu não alisou nenhum um pouco. Sua intenção era ser bem claro, até mesmo duro, totalmente inequívoco.

Há ainda uma questão a ser esclarecida, nós geralmente não conseguimos compreender objetivamente por que Paulo teve de considerar como perda sua herança, afinal de contas, nós tivemos experiências completamente diferentes da dele. E mais, ele afirma que sua herança era para ele lucro. Nós, geralmente não consideramos lucro nosso passado obscuro e sujo, contudo, o irrepreensível e zeloso fariseu tinha uma vida exemplar. Eu não posso orgulhar-me de meu passado, Já, em termos de justiça religiosa, Paulo era um exemplo, entretanto, foi exatamente este zelo que o impedia de conhecer a Verdade, até que Cristo revelou-se gloriosamente a ele. Aí sim, não lhe restava mais dúvidas, "a sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus" era para ele agora uma nova e muito mais valiosa herança, muita acima de sua irrepreensível religião, que agora passou a ser vista por ele como uma "grande porcaria", sem valor algum, pois ele compreendeu que não passava de um mero e inútil esforço humano, completamente infrutífero.

Nos versos seguintes o apóstolo aos gentios deixa ainda mais claro o motivo de desprezar totalmente seu passado de grande "reputação" e "pedigree", para, por meio da fé, conhecer a Cristo e o poder de sua ressurreição, para também dela participar. E no verso 12 encontramos uma magistral e esclarecedora palavra de Paulo: "Não que já a tenha alcançado, ou que seja perfeito; mas vou prosseguindo, para ver se poderei alcançar aquilo para o que fui também alcançado por Cristo Jesus." - Bíblia JFA Offline. Durante séculos se discute a maneira correta de relacionar harmoniosamente a soberania de Deus e a responsabilidade humana, mas Paulo não foge do tema, para que ninguém esqueça, ou despreze um dos lados e enfatize outro, ele deixa claro que jamais alcançou a perfeição, mas segue em busca de alcançar, o quê? Aquilo para o que foi alcançado por Cristo, em outras palavras, o cristão só pode alcançar aquilo que busca, se Cristo já o buscou. A santidade não é inerte, tampouco é uma busca humana, ela é fruto de uma ação divina em nossas vidas. O cristão deve frutificar, mas só frutifica se estiver na videira. Soberania e responsabilidade sempre andam juntas. O apóstolo compreendeu enfim, que buscava sozinho a justiça, que já lhe estava completamente disponível gratuitamente, bastava-lhe a fé, e Jesus lhe concedeu a caminho de Damasco.

No capítulo 2 Paulo havia escrito a respeito da renúncia do próprio Senhor Jesus, mesmo sendo Deus, o criador de todo este imenso e complexo universo decidiu vir até nós, humilhando-se totalmente, a ponto de depender de humanos para se alimentar, de ser protegido, para poder ser o único e suficiente sacrifício para a remissão dos nossos pecados. O apóstolo seguiu seu exemplo, mas, abriu mão de suas riquezas por outro motivo, por compreender de forma muito clara que, seu tesouro era lixo, refugo, uma porcaria sem valor.

E como isso se aplica a nós?

Muitos acreditam que isso só se aplica somente a religiosos que não largam o osso da religião metódica e legalista. Tal qual os judaizantes, muitos religiosos de hoje crêem ser extremamente necessário que sigamos sua ideologia religiosa. Mas, não é só isso. O texto aplica-se também a todos nós. Quantas pessoas você conhece, e você pode ser uma delas, que dizem: "olha, não sou santo, reconheço, mas nunca roubei, nem matei, pago meus impostos, sou um ótimo cidadão, até faço muita caridade, sou muito solidário, acho até que mereço o céu". São muitos que, não dizem exatamente isso, mas pensam algo bem semelhante. É uma fé toda depositada em si mesmo, em suas obras, mas que deveriam, como Paulo, considerar todas suas elas como grande porcaria, como algo completamente descartável de tão impuro. Sim, nossas obras de justiça, que muitas vezes nos gloriamos delas, são, como Isaías nos revela: "trapo da imundícia" (64:6). E você sabe que trapo é esse? Bom, naquela época as mulheres não tinham supermercados para comprarem absorventes íntimos, então só lhes restava usar pedaços de tecidos, trapos, que se tornavam imundamente asquerosos, claro. Percebem a relação das palavras de Paulo e Isaías? Toda religião humana que se baseia em atos de justiça própria é repugnante, por isso figuras tão pesadas são apresentadas, não é para chocar e causar uma simples comoção, é para nos alertar o quanto é inútil e perigoso, e até mesmo vergonhoso, confiar em si mesmo. "Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus" Rm. 3:23 - Bíblia JFA Offline

Assim como Paulo, devemos nos lançar na graça, nos colocar sob a cruz de Cristo, só nela podemos nos gloriar, pois nos gloriamos nos seus méritos e não nos nossos, aliás, que méritos temos? Muitos ainda parecem acreditar que no juízo final haverá uma balança em que se colocarão nossos pecados de um lado, e nossas "Boas obras de justiça" do outro. A boa notícia é que está redondamente enganado quem pensa assim (eu estaria perdido). Graças a Deus que "nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus". Rm. 8:1.

Sola gratia!

EJF ÁZARA

Edson Ázara
Enviado por Edson Ázara em 10/02/2017
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