Um apelo aos irmãos protestantes

UM APELO AOS IRMÃOS PROTESTANTES
Miguel Carqueija



Quando o saudoso Papa João XXIII, idealizador do Concílio Vaticano II, e recentemente canonizado pelo Papa Francisco, promoveu o Ecumenismo, abriu caminho para uma nova e grande época para os cristãos de todo o mundo: uma era de compreensão e ajuda mútua, num mundo cada vez mais hostil ao Cristianismo.
Infelizmente muitos dos nossos irmãos protestantes não souberam ou não quiseram entender o Ecumenismo, dele fazendo mesmo idéias absurdas e estapafúrdias, ou considerando esta grande iniciativa como “coisa do demônio” (!!!). Esta bitola mental vem impedindo em muitos casos uma aproximação maior entre católicos e protestantes e sabotando o projeto de Cristo para que haja “um só rebanho e um só pastor”.
A vida inteira topei com demonstrações de má vontade e preconceito por parte de uma linha dos nossos irmãos protestantes. São aqueles que, sem mais exame, nos acusam sistematicamente de idolatria, de adorar imagens, o que é proibido na Bíblia. Ora, podemos contra-argumentar que, nos meios protestantes (sem generalizar, é claro) a idolatria é largamente praticada através da chamada “teologia da prosperidade” (no caso, adoração do dinheiro e do prazer e conforto); os irmãos que nos acusam não me parece que se preocupem muito em depurar o próprio ambiente protestante da ostensiva idolatria que alguns praticam.
Isto posto, passemos a examinar a questão entre os católicos.
Antes de mais nada é preciso entender que os católicos seguem a Bíblia, como fonte de Revelação, a chamada “Sagrada Escritura”. Mas enquanto os protestantes limitam-se a ela, o Catolicismo tem também a Sagrada Tradição e o Sagrado Magistério. São os nossos três pilares que dão solidez à nossa Fé.
Na Bíblia está bem claro que a idolatria é proibida como pecado gravíssimo. Para não nos alongarmos nisso limitar-me-ei a citar a Carta de Jeremias aos cativos, que constitui o capítulo 6 de Baruc. É uma verdadeira aula sobre a absoluta inocuidade, ou impotência, dos ídolos fabricados. O profeta, de fato, expõe o óbvio ululante, como às vezes temos de fazer, tamanha a falta de noção que deparamos. Então vejamos, a partir do versículo 7:

“A língua desses deuses é polida por um artista. Mas, apesar de dourados e prateados, são falsos e incapazes de falar. (...) Possui o deus um cetro como se fôra governador de província; mas é incapaz de condenar à morte aqueles que contra ele se rebelam. Ostenta na mão o machado e a espada, mas nem pode garantir-se contra um inimigo ou ladrão. E disto se pode concluir que não são deuses. Não tendes porque temê-los. (...)
“Se os colocardes num templo, enchem-se seus olhos da poeira erguida pelos pés dos visitantes. (...) E eles nem se apercebem dos vermes que fervilham no solo e que vêm devorá-los, assim como as suas vestes. Escurece-lhes o rosto a fumaça que se desprende do templo. Morcegos, andorinhas e outras aves esvoaçam em torno de seus corpos, e gatos saltam sobre eles. De tudo isto podeis concluir que não são deuses, e que nenhum respeito lhes deveis.
(...) Não possuindo pés, devem ser carregados aos ombros, revelando assim a todos a sua ignomínia. Bem mais, porém, seus servos deveriam envergonhar-se, pois se algum deus vier a cair por terra, não poderá por si mesmo levantar-se; virá alguém repô-lo de pé, pois que é incapaz de qualquer movimento.”


Por aí se vê como no Antigo Testamento já se encontram alertas claríssimos contra a estultície blasfema da idolatria!
No catolicismo, é rigorosamente proibido adorar imagens ou idolatrar seja o que for. Podemos somente adorar a Deus, pois só Deus é digno de adoração. Esta é nossa doutrina de Fé, dogmática.
Por que então nos acusam muitos irmãos protestantes de idolatria? A acusação é obviamente falsa. Eles dizem, claro, que nós temos imagens. Entretanto, fabricar e ter imagens no templo ou em casa não significa adorá-las até porque o católico tampouco adora os santos representados pelas imagens. Note-se que se a proibição de imagens pelo simples fato de serem imagens for seguida ao pé da letra e com todo rigor, nossos irmãos protestantes não poderão desenhar, nem fotografar, nem filmar, nem guardar fotos da mãe ou de qualquer ente querido, pois fotos são imagens. Então como não ver idolatria na posse de retratos? E seria idolatria a existência de esculturas de personagens da História em locais públicos, como a estátua de Araribóia na entrada de Niterói?
Por outro lado, através de uma antanagoge podemos inverter o argumento. Infelizmente, nos meios protestantes, pratica-se largamente a idolatria. Pode não ser das imagens mas é do dinheiro: a famosa “teologia da prosperidade” que induz a ridícula idéia de que você só está na graça de Deus se possuir muitos bens, gozar a vida, viver com saúde e conforto... é a religião do hedonismo, do materialismo.
Sei muito bem que muitos protestantes não seguem essa heresia idólatra. Mas, cabe perguntar aos nossos irmãos protestantes, se eles se julgam bem intencionados: antes de acusar (quiçá injustamente) outras religiões de serem idólatras, por que não combatem a idolatria dentro de suas próprias fileiras? Não vale alegarem, como eu já deparei, que “na minha igreja isso não acontece”. Mas acontece em outras igrejas protestantes, e vocês não precisavam vir à Igreja Católica para reclamar.
De passagem observo que, com o pretexto de “não serem idólatras” (confundindo adoração com veneração) não só nos acusam falsamente de adorarmos a Virgem Maria, como dão a impressão de odiá-la. Odiar a Mãe de Jesus Cristo?
Mais de uma vez, em seu belíssimo programa “Escola da Fé” (Canção Nova, canal 44, quintas-feiras às 20.30, recomendo aos irmãos protestantes) o valoroso Professor Felipe Aquino lembrou que os fundadores do protestantismo (Lutero, Calvino, Melanchton e outros) não tinham essa mania de desprezar Nossa Senhora. Eles a veneravam, a homenageavam. Depois é que o protestantismo descambou para essa hostilidade e esse desprezo para com a Virgem inclusive insistindo nessa bobagem de dizer que ela teve outros filhos além de Jesus – só porque o Evangelho fala nos irmãos de Jesus, sabendo-se que o idioma então usado pelos judeus não continha a palavra “primo”. Insistem em pretender que Maria teve vida sexual com José, uma forma de implicar com ela, reduzindo sua missão sagrada. Pois sabemos que Maria se consagrara ao serviço de Deus e o matrimônio com José fôra um arranjo para que não ficasse sozinha, o que a sociedade judaica não aceitava em relação a mulheres solteiras. Há no protestantismo um esforço para minimizar o papel de Maria. Li faz pouco tempo um livro de Ellen White, espécie de “profeta” do adventismo, onde ela sequer faz menção a Maria. Procuram ignorar até o presépio, os acontecimentos do nascimento de Cristo.
Se postos contra a parede nossos irmãos protestantes admitem finalmente que prezam Maria, mas (sempre esse “mas”) ela nada pode fazer por nós, pois está aniquilada (para muitos irmãos protestantes não há vida após a morte, todos são aniquilados e assim ficarão até o Dia do Juízo). Assim qualquer indivíduo grosseiro e ignorante fazendo orações raivosas, desde que esteja vivo em seu corpo aqui na Terra, pode mais junto a Deus que a Virgem Maria, já que ela está “aniquilada”.
Na verdade a má-vontade parece evidente se levarmos em conta (o que pode ser observado inclusive nas pregações dos ministros protestantes) que raramente se referem espontaneamente à Virgem (a não ser para falar mal dos católicos) e mais facilmente falam de figuras do Velho Testamento, como Davi, Moisés, Jacó, José, Isaías. Nada contra, mas... a mulher que aceitou diante do Anjo Gabriel ser a mãe do Messias, não lhes merece idêntica (no mínimo) consideração?
Por isso eu peço aos irmãos protestantes que vierem por acaso a ler estas “mal traçadas linhas” a reconsiderarem, caírem em si e mudarem de atitude em relação às imagens e à Virgem Maria. Será que, quem não ama a mãe, pode amar o filho?


Rio de Janeiro, 30 de dezembro de 2016.

(imagem da Pietá de Miguel Angelo)