PAIXÃO ESQUECIDA

"O Brasil hoje está dividido em dois grupos de empresários: os que choram e os que vendem lenços."

A frase acima é do publicitário Nizan Guanaes mas que eu gostei dela, gostei. Afinal quem já não ouviu, nestes tempos de anunciada crise um choro do tipo: "Que crise! o pessoal entra na loja, olha, pergunta o preço, mas comprar que é bom nada!" Porém a crise de hoje não é diferente da crise de quando o mesmo empresário entrou para o ramo. Ele nem tinha clientes e estava com todo o estoque para desovar. "Naquele tempo", ele ficava a porta da empresa com um sorriso lá nas orelhas sorrindo até para quem não era cliente. Quando alguém passava olhando meio de um lado ele convidava: "Entre, fique a vontade, seja bem vindo..." Andava por toda a loja guiando os clientes, apresentando os funcionários e na saída ainda carregava os pacotes. Quantas vezes esperou ao lado do telefone por um cliente quando ninguém sabia o número da loja. Quantas vezes procurou uma associação de classe, um sindicato, um condomínio de lojas se oferecendo para participar da diretoria, trazer novas idéias, propor novas campanhas, "animar" o setor! O que aconteceu hoje? Os clientes querem conversar ele manda avisar que não está. Toca o telefone ele grita: "Alguém atenda!" A Associação Comercial convocou uma reunião, ele reclama, dá desculpas, não quer participar. Ah! agora a culpa é da crise, da globalização, da política de juros do governo, da guerra no Nãoseiondequistão! Choro e mais choro, o empresário é o mesmo mas como diria o professor Luiz Marins: "Ele perdeu a paixão do começo".

Mas por incrível e lamentável que lhe pareça não quero puxar as orelhas dos empresários. Aliás, chorando ou vendendo lenços são eles os bons camelos que estão carregando nas costas a mais pesada carga da recuperação econômica de nosso país. Tem coisa que me parece mais gritante. É ver cristãos chorando a crise ministerial que estão atravessando sem ver que eles próprios são os responsáveis pela carestia a que estão submetidos. Há casos de igrejas inteiras nesta situação. Gerações inteiras de cristãos contaminadas por este sentimento de autocomiseração, convencendo-se a si próprios de que as circunstâncias atuais são suficientes para prejudicar o seu desenvolvimento espiritual e travar a sua ação ministerial.

É sério e bíblico. Em Éfeso havia uma igreja formidável ora pastoreada por nada menos do que Timóteo o discípulo-filho do apóstolo Paulo. A igreja de Éfeso tinha obras, trabalho e paciência. Seu caráter era tal que não podia sofrer os maus; antes, punha à prova os que diziam ser apóstolos, e o não eram e os achara mentirosos. Esta igreja tinha coragem de pagar o preço, era sofredora, trabalhava pelo nome do Senhor Jesus, e não se cansava. Apesar de todas estas qualidades admiráveis (e hoje tão raras) Jesus foi incisivo ao mandar-lhe inequivocamente a seguinte advertência: "Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor." [Apocalipse 2.4]

Sabe como é aquele cristão do começo, você não precisa pedir-lhe para que faça qualquer coisa ele já fez. Ele é o primeiro a vir para o apelo e o último a sair. O primeiro companheiro para oração, para quem não tem mensagem ruim nem culto frio. Ele participa de todos os corais em que for aceito, faz parte da equipe de visitas, traz folhetos no bolso, vai a todos os cultos e ainda faz hora-extra nas vigílias. Ele está apaixonado por Jesus, encantado com o evangelho, saturado de amor pela Palavra de Deus e mergulhado num verdadeiro e sincero primeiro amor. Ele defende a igreja com a mesma paixão com que defende a Bíblia, defende o povo de Deus com o mesmo amor com que ama ao próprio Deus e não se envergonha de ser cristão.

O tempo passa, este crente "aprende" tanto que desaprende a paixão do começo. Fica tão "experiente" que sabe até demais, agora tem até nojo quando vê alguém no primeiro amor. Cada nova atividade que a igreja tenta promover "não tem respaldo bíblico", cada evangelização que é programada "não vai dar resultado", cada novo ministro da Palavra que prega "não tem mensagem sólida". Convide-o para participar de um grupo de louvor, de estudo, de oração, sei lá de células evangelísticas que você vai surpreender-se com a quantidade de atividades que o impossibilitam-no de participar. Ah! hoje ele chora que não pode suportar as lutas que enfrenta. Hoje ele não entende como a crise, a dificuldade financeira, a solidão, a aridez ministerial, a fraqueza e a mesmice espiritual abateram-se sobre ele. E a culpa é do ministério que não tem visão espiritual, a culpa é do pastor que não visita os membros tradicionais, a culpa é da igreja que perdeu o "calor humano", a culpa é dos colegas de ministério que não o apoiam, a culpa? é que nunca lhe deram uma chance, nunca lhe põem em uma posição de liderança, nunca acreditaram nele! Ele está definhando e a culpa (que maravilha!) não é dele!

Sabe o que Jesus diria a este crente? Sei do teu histórico de trabalho, fidelidade, paciência e até sofrimento por mim. Me orgulho disso! Mas tenho porém contra ti que deixaste o teu primeiro amor, a tua paixão do começo! "Lembra-te, pois, de onde caíste, e arrepende-te, e pratica as primeiras obras; quando não, brevemente a ti virei, e tirarei do seu lugar o teu castiçal, se não te arrependeres." [Apocalipse 2.5] Jesus não deixou espaço para um meio-termo. Não há a terceira via: Os salvos, os não salvos e os "aceitos". Não há entre os ativos e os inativos os "meio-ativos", ou "outrora-ativos" ou "ora-inativos". Para certa igreja Jesus disse: "Tens nome de que vives e estás morto". Pois entre os vivos e os mortos espirituais não há "os que ficam vagando".

Faça uma auto-análise de sua vida espiritual e de sua paixão ministerial. Não vai doer e não precisa contar pra ninguém. Se notar que perdeu vigor e paixão tendo em referência o chamado período do primeiro amor, vale a pena voltar as raízes e retomar as primeiras obras. Sem olhar as barreiras, sem olhar as disputas políticas possivelmente existentes em sua congregação. Ou então, passe de vez para o segundo grupo e contate os empresários que vendem lenços.

Heleno Pedroso
Enviado por Heleno Pedroso em 30/06/2012
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