Reforma Política: Missão Impossível

Tanto no referendo de 6 de janeiro de 1963 como no plebiscito de 21 de abril de 1993, os eleitores brasileiros votaram a favor do presidencialismo. O caráter do presidencialismo brasileiro tem uma herança imperial. A Proclamação da República provocou a fusão entre as funções de chefe de estado e de chefe de governo. Se no Império, o rei reina e governa, agora na República, o presidente preside e governa. Ao centralizar o poder de arrecadação e de normatização das regras, o atual presidencialismo de coalizão provoca a hipertrofia do poder executivo. Não há independência e harmonia entre os três poderes, pois o orçamento é autorizativo (depende da liberação por parte do poder executivo). Este fato provoca o aumento do poder executivo e força o poder legislativo a barganhar cargos e verbas em troca de votos. Há, portanto, um desequilíbrio entre o poder executivo e o poder legislativo.

A reforma política é impossível no Brasil, pois deveria começar com o orçamento impositivo. Esta medida, por si só, causaria tal impacto político que tornaria desnecessária uma reforma política. O orçamento impositivo obrigaria uma transparência na formulação da peça orçamentária e sua divulgação tornaria pública a alocação dos recursos e, assim, as demandas dos partidos políticos. Estes deveriam formular suas propostas de gastos e de investimentos em cada ano do quadriênio presidencial. A imprensa teria que reformular a cobertura jornalística para cobrir o debate sobre o orçamento. Qualquer alteração nos gastos, ao longo do ano, teria que ser debatida e decidida pelo poder legislativo.

A campanha política das eleições teria que ser focada em propostas abstratas e gerais sobre arrecadação e gastos. Os partidos políticos teriam que se aglutinar para ter mais poder de decisão, pois o orçamento impositivo caberia ao poder legislativo e não à barganha de cargos e verbas em troca de votos para a aprovação do orçamento autorizativo, enviado pelo poder executivo.

O poder executivo tem uma herança da República Velha que é o caciquismo na indicação do candidato pelo partido. Tanto nas eleições estaduais como na eleição presidencial, o indicado concorre para ter o controle da máquina administrativa e o controle do orçamento autorizativo, que depende da liberação por parte do poder executivo. A sede do poder executivo tem uma herança imperial pois o governante mora em “palácio”, portanto distante da população. Os eleitores não se sentem cidadãos com “direitos”, mas sim precisam pedir “favor” aos governantes e isso reflete-se no fatalismo religioso de cerca de dois terços da população.

A reforma política é impossível no Brasil. O equilíbrio entre o poder executivo e o poder legislativo levaria à necessidade do debate político e isso provocaria o impasse político por tornar clara a divergência de opiniões. A falta de decisão exacerbaria o conflito político. A paralisia decisória provocaria polarização política. A radicalização política levaria a imprensa a cobrar a volta à normalidade institucional. A sociedade, a imprensa e os partidos políticos não estão preparados para mudar as instituições democráticas do presidencialismo de coalizão, pois demandaria uma mudança de mentalidade e trazer o país para o século XXI. Seria uma audácia e uma ousadia se o Supremo Tribunal Federal, caso consultado, normatizasse que o orçamento é impositivo e não autorizativo, pois isso seria considerado uma “interferência” na harmonia e independência entre os três poderes da República.