Pontos em comum e diferenças entre a música de Nelson e a de Falcão

Sou cearense do litoral e nasci em 1961, por isso ainda ouvi música em rádio valvulado. Lembro-me que as pessoas do interior chamavam as canções, de moda, existia a moda nova e a moda velha, modas de Nelson Gonçalves, Orlando Silva , Augusto Calheiros já eram tidas por velhas na minha meninice, apesar de Nelson ter continuado gravando ainda por mais de duas décadas, e diga-se de passagem que basicamente eram os mesmos tema. As canções interpretadas por ele, e antes de falar delas gostaria de não citar os autores, pois é o que mais interessa pra o que quero dizer, sei que Noel Rosa, Lupicínio, Ataulfo dentre outros foram muito bem interpretados pelo grave belíssimo do grande cantor meio-gago. Pois bem, as canções eram muito bem orquestradas, havendo destaque para belíssimos arranjos de cordas, piano, metais e todo o requinte harmônico de uma época áurea, já as letras eram em sua maioria de decepções amorosas tipo “ela se enamorou de outro rapaz”, estórias de desvarios e dramáticas paixões... há uma em especial em que o altruísmo do personagem é tanto que diz: “Eu sabia que você um dia me procuraria em busca de paz, muito remorso muita saudade mas afinal o que é que lhe traz”? – é o caso de uma sua ex-namorada que quando jovem e bela, teve muitos amores e quando já não era mais tão formosa, volta cansada dos seus prazeres e ouve dele uma lição de moral que é pra ela imitar a planta que morre de pé e ainda a agradece por ter se lembrado dele, no final da canção diz: homem que é homem faz qual o cedro que perfuma o machado que o derrubou, dando a entender que a aceita de volta. Há ainda uma outra em que a mulher desvairada é recebida com: entra meu amor fique a vontade e diz com sinceridade o que deseja de mim... e no final diz: tu és a filha pródiga que volta procurando em minha porta o que o mundo não te deu... não te darei carinho nem afeto, mas pra te abrigar podes ocupar meu teto, pra te alimentar podes comer o meu pão. E ainda a famosa “último desejo”, em que o casal se enamora em uma festa de são João com bilhete, foguete luar e violão e algum tempo depois o romance se acaba. O marido nesse caso parece ter dependido mais da mulher do que ela dele, ele contudo diz que seu último desejo ela não deve negar e é este: “se alguma pessoa amiga pedir que você diga se você me quer ou não, diga que você me adora que você lamenta e chora a nossa separação, e às pessoa que eu destesto diga sempre que eu não presto e que meu lar é um botequim, e que eu arruinei a sua vida e não mereço a comida que você pagou pra mim”. Vejo que há sempre uma dignidade na postura do macho. Diante desses poucos exemplos cito outros só que estes são letras de canções onde a mulher é quem dá o ultimato, esta foi interpretada pela potiguara Núbia Lafaiete: se eu quiser beber eu bebo, se eu quiser fumar eu fumo não interessa a ninguém... quem és tu quem foste tu não és nada se na vida fui errada tu foste errado também, não compreendeste o sacrifico sorriste do meu suplício me trocando por alguém, seu eu errei se pequei pouco importa, se aos teus olhos estou morta, pra mim morreste também. Cito mais ainda com uma postura bem mais racional que foi cantada por Roberto Carlos: “só vou gostar de quem gosta de mim”. Bem, eu sei que todos esses são temas e posturas diante do sentimento amoroso ou da paixão exacerbada, mas vamos adiante, vindo para os dias de hoje, sei pelos noticiários e em alguns casos por ser eu mesmo testemunha ocular, e isso não é letra de música, é realidade mesmo que, se dão casos como os da letras de música de Nelson e isso é bem comum. Vou em frente, traições amorosas sempre existiram em qualquer tempo por parte do homem e da mulher, esta, creio com menos incidência no passado. As letras das canções de Nelson denotam que a mulher é na maioria das vezes a vilã, a traidora, a que se vai e depois que quebra a cara, volta e o homem é aquele no mais das vezes o forte, o que aguarda paciente ver chegar a cavalo o castigo para a sua bem-amada e qual um pai bondoso a perdoa e a recebe como a uma filha desgarrada. Cá comigo imagino que esses temas tenham existido quase que somente só, nas músicas daquela época, e digo por quê, porque o homem era muito mais machista do que hoje, mas mesmo assim naquelas canções ele era colocado como vítima, mas não seria isso para se criar um clima de drama ou algo parecido? Sei lá, sabe lá, quem sabe? Não quero com isso dizer que todas as senhoras-damas daquele tempo formassem uma miríade de santas. Continuando ainda nos dias atuais, ainda ouvimos os mesmos temas interpretados pelos chamados bregas, mas o homem já não é o mesmo passivo das letras de Nelson, pode até ser que exista algum igual mais é raro e deve estar em extinção. A maioria hoje não está nem aí, a outra fatia, os que não aceitam o fim da novela e por estarem muito apegados, partem pra violência contra sua eleitas, daí resultando grandes estragos para ambos os lados e até a criação da lei das penhas. Há também outra fatia e parece sem menor que a enterior, são os que aceitam os desenlaces de forma bem carnavalesca e adotam os inúmeros nomes que se dão aos trocados, ou seja aos taídos. Alguns destes, se irmanam em associações voltadas para os chapéus de touro, e até parecem se orgulharem disso. É aí que entra o humor cearense cujo ícone maior é o altão Falcão e suas esculachadas e bem humoradas irreverências em música, que retratam a realidade dos amantes não correspondidos e que encaram o drama na esportiva e na galhofa.