QUE TAL SER PROFESSORA POR UM DIA?

O dia-a-dia de uma professora começa de madrugada, quando perde o sono pensado em como conquistar a simpatia do Joãozinho, a disciplina do Carlinhos e a atenção da Marianinha. Após horas remoendo, chega a algumas conclusões, busca papel e caneta, é preciso anotar, os neurônios não respondem mais como antes, a mente parece cansada, não sei por que, mas pensar, às vezes, cansa... E se lembrar de certas coisas, então, nem se fala!

Volta a cochilar, mas já é hora de acordar, o despertador anuncia. Levanta-se, faz uma oração em prol do trajeto que fará até a escola, que Deus a proteja daquele pai de aluno que está tão bravo; outra pela mãe do aluno x que quer jogá-la pela escada; pede também pela reunião que, certamente, haverá na hora do recreio, que ninguém se mate naquele lugar, afinal, estão todos tão estressados! Não pode se esquecer do outro turno que terá de enfrentar e lá vêm intercessões... A essa altura, já é tempo de tomar banho, fazer a higiene bucal, tomar café, novamente higiene bucal, se arrumar, nada de chinelo arrastando e soutien saltando pela alça da blusa, precisa estar apresentável. Filtro solar, corretivo facial para disfarçar as olheiras deixadas pela insônia, um batonzinho pra quem gosta e cai bem, joga o material às pressas dentro da bolsa, bolsa não, mala pedagógica, nunca vi carregar tanta bugiganga igual professora! E ainda reclama da mochila pesada do aluno, mas a dela pesa quase “trocentos” quilos. E é sempre imensa, parece até “mochila de ar” de astronauta, pensando bem, não seria má ideia, pois ao longo do dia, se ouve cada coisa que tem hora que dá vontade de ir morar na lua.

Então, vai fazendo a oração e o desjejum ao mesmo tempo, uma mordida no pão e uma prece para cada “santo” que lhe vem à cabeça; segue para a arrumação e quando acaba a maratona do “reboco” no rosto, roupa adequada, material devidamente arrumado, filho “engomadinho” pra ir à aula ou aos berros no colo da babá (quando esta não se atrasa), ufa, amém.

Sai apressada, chega ao trabalho, ouve as perguntas rotineiras: “Tudo bem, fulana?” “Por que não foi à formação ontem à noite?” “Ah, sabe dizer se já saiu a progressão?” “E a atualização prevista no artigo 5º da lei do PSPN, será mesmo de acordo com o índice do FUNDEB, considerando o piso de R$ 1.312,85 ou insistirão no valor de R$ 950,00 até nos aposentarmos”? Responde automaticamente:

“Mistério, colegas! Depende da vontade política e da nossa inimiga “folha”, lembram-se dela?”

Do pátio vem o som “suave” das crianças brincando, a coordenadora “calmíssima” pedindo que se comportem. Logo em seguida, ouvem-se passos cadenciados, são os “anjinhos” em fila, caminhando para a sala em uma harmonia que quase se pode confundir com uma procissão.

Chegando à sala de aula, ela se “diverte” enquanto tenta conversar sobre boas maneiras com um, sobre bulling com outro; do lado oposto do recinto, começa uma demonstração de jiu-jítsu, judô ou qualquer arte marcial. Interrompe o assunto e corre lá para lembrar que não está na hora da competição. Os mais comportados aproveitam para colocar o papo em dia, e fazem isso em tom tão baixo que daria para acordar a Bela Adormecida.

Quando, finalmente, a aula tem início, um quer usar o sanitário, outro está quase desmaiando de sede, com razão, afinal, falar e se movimentar excessivamente dá sede; além disso, beber água faz bem à saúde, como impedi-los de sair de sala para tal?

E assim, entre uma e outra adversidade, a aula segue até o recreio, novamente ouve-se o som que soa como bálsamo aos ouvidos.

Sala dos professores, ufa, afinal, professor tem direito a vinte minutos para descansar, lanchar, beber água, ir ao banheiro, esses dois últimos, em alguns casos, não há a menor possibilidade de fazê-los no decorrer da aula sem que, na volta, encontre uma “agradável surpresa”!

Nossa! Como passa rápido! Já bateu o sinal?

E mais uma vez, o mesmo processo até a hora da saída.

Se tiver sorte, consegue sair sem ser derrubada em algum degrau e chegar ilesa ao outro colégio, onde alunos diferentes, mas com características muito parecidas a esperam.

Sobrevive bravamente até o final do dia. Sai da escola com a sensação de dever cumprido, recebendo beijinhos, abraços e acenos dos levados e ao mesmo tempo, adoráveis alunos, sem os quais o ambiente escolar torna-se vazio e sem sentido.

Chega em casa numa “tranquilidade invejável”, vai cuidar dos afazeres domésticos, dos filhos, quem os tem... Daí a pouco, chega o maridão e “carinhosamente” pergunta: “Mulher, por que o jantar AINDA não está pronto”? Ela, educadamente, engole todas aquelas palavras “bonitas” que gostaria de proferir, afinal, é uma professora, e responde com toda a delicadeza do mundo:

“PORQUE VOCÊ AINDA NÃO FEZ”!!!

Diante disso, fica mesmo “difícil” associar a vida dessa profissional ao que Marx chamava de “Mais Valia”. Mais “complexo” ainda é compreender por que essas mulheres costumam ter dificuldades em sua vivência familiar. Talvez por isso, apenas por isso, “perdoamos” aqueles que nos crucificam, e o fazemos ainda melhor se tivermos com TPM.

Bete Ribeiro
Enviado por Bete Ribeiro em 06/03/2011
Reeditado em 18/08/2012
Código do texto: T2831979
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