PEDRO E INÊS - A MAIS BELA HISTÓRIA DE AMOR EM PORTUGUÊS (CAPÍTULO III)

DADOS HISTÓRICOS COMPROVANTES DE TODOS OS ACONTECIMENTOS:

1320: Em Coimbra, a 8 de Abril, nasce o príncipe D. Pedro, filho de D. Afonso IV, rei de Portugal;

- 1340: D. Afonso IV participa na batalha do Salado ao lado de Afonso XI de Castela. É a vitória decisiva da cristandade sobre a moirama da Península Ibérica. Inês de Castro, dama galega, vem para Portugal no séquito de D. Constança, noiva castelhana de D. Pedro; paixão adúltera e fulminante de Pedro por Inês;

- 1345: Nasce D. Fernando, filho de D. Constança e de D. Pedro;

- 1349 ?: Morte de D. Constança;

- 1354: Influenciado pelos Castro (irmãos de Inês), D. Pedro mostra-se disposto a intervir nas lutas dinásticas castelhanas;

- 1355: A 7 de Janeiro, com o consentimento d’el-Rei D. Afonso IV, nos paços de Santa Clara (Coimbra) Diogo Lopes Pacheco, Pedro Coelho e Álvaro Gonçalves degolam Inês de Castro; revolta de D. Pedro contra o pai;

- 1357: Morte de D. Afonso IV; D. Pedro sobe ao trono e manda executar os assassinos de Inês de Castro;

- 1361: Do Mosteiro de Santa Clara (Coimbra) para o Mosteiro de Alcobaça, D. Pedro I manda trasladar os restos mortais de Inês de Castro;

- 1367: A 18 de Janeiro morre D. Pedro I.

O AMOR DE PEDRO E INÊS NA LITERATURA

O amor que uniu D. Pedro a D. Inês foi motivo de inspiração para vários escritores e poetas - o que permitiu que esse amor trágico chegasse aos nossos dias incólume e com essências de imortalidade – que ressuscitaram as suas personagens, ambas envoltas em vincadas auréolas de amor, História de Portugal e mito.

Esta história de amor, bela e trágica, tem sido, também, tema de obras teatrais e cinematográficas que abordam, em maior ou menor grau, quer o fundo psicológico de Inês, quer o conflito de que ela é centro. Como fonte mais próxima dos acontecimentos, os escritores e artistas que a ela se referiram temos as crônicas de Fernão Lopes e Rui de Pina, entre outros.

A primeira aparição dos amores de D. Inês na literatura dá-se com as Trovas à Morte de Inês de Castro, de Garcia de Resende, no Cancioneiro Geral de 1516. Nelas, Inês, no Inferno, lamenta a tristeza da sua sorte, advertindo as mulheres para os perigos do amor. No entanto, é com Os Lusíadas, de Luís de Camões, que se constitui o mais influente fundo lírico do episódio de D. Inês de Castro, a «Linda Inês», tal como surge no canto III. Muitas das referências a espaços, como os campos do rio Mondego e à figura dos carrascos, surgem pela primeira vez neste poema, como parte integrante da História de Portugal. A influência da obra de Camões, em geral, na literatura portuguesa, contribuiu em muito para firmar Inês de Castro como uma das suas personagens mais férteis.

Em 1587, era editada A Castro, a primeira tragédia clássica portuguesa, que, como tema nacional, aproveitava precisamente os amores de D. Inês, dando particular atenção ao conflito interior de D. Afonso IV, nas suas hesitações quanto à sorte a dar à mulher do seu filho.

Em Portugal, os amores de D. Inês popularizaram-se, não só na literatura, mas também entre o povo, com o teatro de cordel. Também Bocage dedicou-lhe uma lindíssima cantata.

Com o Romantismo, aumentou o interesse pelos factos históricos associados ao episódio. Alexandre Herculano e Oliveira Martins, entre outros, procuraram investigar, com algum rigor, as pessoas e fatos históricos.

Após o Romantismo, o tema persistiu vivamente numa literatura de caráter nacionalista e saudosista, explorando aspectos da história, persistindo em todo o século XX. Mais recentemente podem indicar-se exemplos como os dos poetas Ruy Belo, Miguel Torga e Natália Correia. Mesmo a nível internacional, e já no século XX, alguns escritores têm recorrido a Inês de Castro como tema das suas obras. Disso é exemplo o escritor existencialista francês Henri de Montherlant, com La Reine Morte.

*

“COLO DE GARÇA”, assim chamou Luís de Camões a Inês, por ser tão formosa e possuir pescoço alvo e esbelto, lembrando o da ave de mesmo nome.

N´Os Lusíadas, o episódio de Inês de Castro é considerado o ponto alto do lirismo camoniano inserido em sua narrativa épica. Camões dedica dezanove estâncias ao episódio de Inês, onde é explorado o carácter trágico do mito inesiano.

O episódio foca o encontro de Inês com o rei Afonso IV, os pedidos de clemência e a injustiça e ferocidade em redor da morte da amada de D. Pedro. O início da narração deixa antever o desfecho do mito, isto é, sabemos à partida que o desenlace é trágico, está indiciado:

"O caso triste e digno de memória,

Que do sepulcro os homens desenterra,

Aconteceu da mísera e mesquinha

Que depois de morta foi rainha."

EPISÓDIO DE INÊS DE CASTRO

(Canto III, estrofes 118 a 135 e estudo das mesmas)

"Tu, só tu, puro Amor, com força crua,

Que os corações humanos tanto obriga,

Deste causa à molesta morte sua,

Como se fora pérfida inimiga.

Se dizem, fero Amor, que a sede tua

Nem com lágrimas tristes se mitiga,

É porque queres, áspero e tirano,

Tuas aras banhar em sangue humano."

Camões afirma, nos versos da estrofe, que o amor foi a causa da morte de Inês, como se ela fosse uma inimiga. O amor feroz, cruel, não se satisfaz com as lágrimas, com a tristeza, mas exige, como um deus severo e despótico, banhar seus altares “aras” em sangue humano: requer sacrifícios humanos. Nesse verso, parece indicar que Inês foi morta com a mesma crueldade que se usava contra os mouros - muçulmanos, que invadiram Portugal - pérfidos inimigos.

Basta olharmos para esta estância do Canto Terceiro para compreendermos como o amor-paixão é algo tão intenso e arrebatador que poderá ter um fim tão violento como ele próprio é.

"Estavas, linda Inês, posta em sossego,

De teus anos colhendo doce fruito,

Naquele engano da alma, ledo e cego,

Que a Fortuna não deixa durar muito,

Nos saudosos campos do Mondego,

De teus fermosos olhos nunca enxuito,

Aos montes insinando e às ervinhas

O nome que no peito escrito tinhas."

Inês estava em Coimbra, sossegada, “colhendo doce fruito”, usufruindo da felicidade ilusória “engano da alma, ledo e cego” e breve da juventude. Nos campos, com os belos olhos úmidos de lágrimas de amor, repetia o nome do seu amado aos montes - para cima, para o alto - e às ervas - para baixo, para o chão. As formas "fruito" e "enxuito" são variantes de “fruto” e “enxuto”.

"Do teu Príncipe ali te respondiam

As lembranças que na alma lhe moravam,

Que sempre ante seus olhos te traziam,

Quando dos teus fermosos se apartavam;

De noite, em doces sonhos que mentiam,

De dia, em pensamentos que voavam;

E quanto, enfim, cuidava e quanto via

Eram tudo memórias de alegria."

As lembranças do príncipe respondiam-lhe, em pensamentos e em sonhos, quando ele estava longe. Isto é, a memória do amado fazia com que Inês conversasse com ele, quando este estava ausente. Ambos não se esqueciam um do outro e se “comunicavam” através da memória, em forma de pensamentos e sonhos. Assim, tudo quanto faziam ou viam os fazia felizes, porque se lembravam dos respectivos amados.

"De outras belas senhoras e Princesas

Os desejados tálamos enjeita,

Que tudo, enfim, tu, puro amor, desprezas,

Quando um gesto suave te sujeita.

Vendo estas namoradas estranhezas,

O velho pai sesudo, que respeita

O murmurar do povo e a fantasia

Do filho, que casar-se não queria."

O príncipe recusa-se casar com outras mulheres - tálamo: casamento, leito conjugal - porque o amor despreza, rejeita tudo que não seja o rosto da amada. Gesto significa rosto, semblante.

"Tirar Inês ao mundo determina,

Por lhe tirar o filho que tem preso,

Crendo c’o sangue só da morte ladina

Matar do firme amor o fogo aceso.

Que furor consentiu que a espada fina,

Que pôde sustentar o grande peso

Do furor Mauro, fosse alevantada

Contra hûa fraca dama delicada?"

O rei D. Afonso decide matar Inês, para que o filho seja libertado do seu amor. O pai de Pedro acredita que só o sangue da morte apagará o fogo do amor. Sua fúria foi tanta que fez com que a espada cortante que afrontara o poder dos Mouros fosse levantada contra uma frágil e indefesa mulher.

"Traziam-na os horríficos algozes

Ante o Rei, já movido a piedade;

Mas o povo, com falsas e ferozes

Razões, à morte crua o persuade.

Ela, com tristes e piedosas vozes,

Saídas só da mágoa e saudade

Do seu Príncipe e filhos, que deixava,

Que mais que a própria morte a magoava."

Quando os horríveis e cruéis carrascos trouxeram Inês perante o rei, este já estava compadecido, com dó, e arrependido. Mas o povo persuadia o rei a matá-la. Inês, então, com a voz triste, sentindo mais pela dor e saudade do príncipe e dos filhos do que pela própria morte.

"Pera o céu cristalino alevantando,

Com lágrimas, os olhos piedosos

(Os olhos, porque as mãos lhe estava atando

Um dos duros ministros rigorosos);

E despois, nos mininos atentando,

Que tão queridos tinha e tão mimosos,

Cuja orfindade como mãe temia,

Pera o avô cruel assi dizia:"

Levantando os olhos cheios de lágrimas ao céu - somente os olhos, porque um carrasco prendia-lhe as mãos - e, depois, olhando para as crianças - que amava tanto e temia que ficassem órfãs - disse para o avô cruel, o rei:

"Se já nas brutas feras, cuja mente

Natura fez cruel de nascimento,

E nas aves agrestes, que somente

Nas rapinas aéreas tem o intento,

Com pequenas crianças viu a gente

Terem tão piedoso sentimento

Como c’o a mãe de Nino já mostraram,

E c’os irmãos que Roma edificaram:"

Se até os animais selvagens, cujos instintos são cruéis, e as aves de rapina têm piedade com as crianças, como demostraram as histórias da mãe de Nino e a dos fundadores de Roma… Nino fora abandonada por sua mãe, rainha da Assíria e foi alimentada por aves de rapina. Rômulo e Remo, fundadores de Roma, foram abandonados quando crianças e amamentados por uma loba.

"Ó tu, que tens de humano o gesto e o peito

(Se de humano é matar hûa donzela,

Fraca e sem força, só por ter sujeito

O coração a quem soube vencê-la),

A estas criancinhas tem respeito,

Pois o não tens à morte escura dela;

Mova-te a piedade sua e minha,

Pois te não move a culpa que não tinha."

Sendo assim, ele, o rei, que tinha o rosto e o coração humanos - se é que é humano matar uma mulher só porque esta ama um homem que a conquistou - poderia ao menos ter respeito e consideração às crianças. Inês suplica, então, que o rei se compadeça dela e das crianças, já que não queria perdoá-la ou absolvê-la de uma culpa, um crime, que não tinha cometido.

"E se, vencendo a Maura resistência,

A morte sabes dar com fogo e ferro,

Sabe também dar vida, com clemência,

A quem peja perdê-la não fez erro.

Mas, se to assi merece esta inocência,

Põe-me em perpétuo e mísero desterro,

Na Cítia fria ou lá na Líbia ardente,

Onde em lágrimas viva eternamente."

E se o rei sabia dar a morte, como o mostrara ao vencer os Mouros "Maura resistência" também saberia dar a vida a quem era inocente. Mas, se ainda a quisesse castigar, que a expulsasse, para uma região gelada ou tórrida, para sempre.

"Põe-me onde se use toda a feridade,

Entre leões e tigres, e verei

Se neles achar posso a piedade

Que entre peitos humanos não achei.

Ali, c’o amor intrínseco e vontade

Naquele por quem mouro, criarei

Estas relíquias suas que aqui viste,

Que refrigério sejam da mãe triste."

Que ele a colocasse entre as feras, onde poderia encontrar a piedade que não achara entre os homens. Ali, por amor daquele por quem morria, criaria os filhos, que era recordações do pai e seriam consolação da mãe.

"Queria perdoar-lhe o Rei benino,

Movido das palavras que o magoam;

Mas o pertinaz povo e seu destino

(Que desta sorte o quis) lhe não perdoam.

Arrancam das espadas de aço fino

Os que por bom tal feito ali apregoam.

Contra hûa dama, ó peitos carniceiros,

Feros vos amostrais e cavaleiros?"

O rei, que afinal, se mostrava bondoso, queria perdoar Inês, comovido por suas palavras. Mas o povo obstinado, o destino de Inês - que assim o quis - não lhe perdoaram. Os acusadores puxam suas espadas. Mostram-se valentes atacando uma dama indefesa.

"Qual contra a linda moça Policena,

Consolação extrema da mãe velha,

Porque a sombra de Aquiles a condena,

C’o ferro o duro Pirro se aparelha;

Mas ela, os olhos, com que o ar serena

(Bem como paciente e mansa ovelha),

Na mísera mãe postos, que endoudece,

Ao duro sacrifício se oferece:"

Assim como Pirro se prepara com a espada “ferro” para matar Policena, por ordem do fantasma de Aquiles, e ela - mansa e serenamente -, movendo os olhos para a mãe, enlouquecida de dor, oferece-se ao sacrifício… Aquiles, personagem da Ilíada de Homero, era invulnerável por ter sido submergido, logo ao nascer, na água da lagoa Estígia - Lagoa da Morte. Morreu durante a guerra de Troia, quando foi atingido por uma seta no calcanhar, o único ponto vulnerável do seu corpo. Pirro, filho de Aquiles, teria sido aconselhado pelo fantasma “sombra” do pai a matar Policena, noiva do herói morto. Matou-a quando esta se encontrava sobre o túmulo de Aquiles.

"Tais contra Inês os brutos matadores,

No colo de alabastro, que sustinha

As obras com que Amor matou de amores

Aquele que despois a fez Rainha,

As espadas banhando e as brancas flores,

Que ela dos olhos seus regadas tinha,

Se encarniçavam, fervidos e irosos,

No futuro castigo não cuidosos."

Do mesmo modo agem os cruéis assassinos de Inês. No pescoço “colo” que sustenta o belo rosto “as obras” o sorriso, o olhar, os movimentos do rosto, pelo qual se apaixonou - o deus Amor, Cupido, fez morrer de paixão - o príncipe, que depois a fará rainha, eles, os matadores, banham, lavam suas espadas e também as faces pálidas “brancas flores” e molhadas de lágrimas de Inês; atacavam enraivecidos, sem pensarem no castigo que o futuro lhes reservava.

Camões supõe que Inês foi degolada, como Policena oferecendo o pescoço ao golpe, e o sangue escorreu sobre seu rosto.

"Bem puderas, ó Sol, da vista destes,

Teus raios apartar aquele dia,

Como da seva mesa de Tiestes,

Quando os filhos por mão de Atreu comia!

Vós, ó côncavos vales, que pudestes

A voz extrema ouvir da boca fria,

O nome do seu Pedro, que lhe ouvistes,

Por muito grande espaço repetistes."

Naquele dia, o sol deveria ter-se escondido, como fizera quando Tiestes comeu os próprios filhos em um banquete servido por Atreu, para não ver o terrível crime. A última palavra de Inês - o nome de Pedro, o príncipe - ecoou longa e repetidamente através da região.

Camões iguala a crueldade da morte de Inês à da história de Atreu e Tiestes. Tiestes era filho de Pélops e irmão de Atreu. Seduziu a esposa do irmão. Atreu deu a comer a Tiestes os filhos que nasceram daquela união.

"Assi como a bonina, que cortada

Antes do tempo foi, cândida e bela,

Sendo das mãos lascivas maltratada

Da minina que a trouxe na capela,

O cheiro traz perdido e a cor murchada:

Tal está, morta, a pálida donzela,

Secas do rosto as rosas e perdida

A branca e viva cor, co a doce vida."

Como uma flor colhida precocemente pelas mãos travessas “lascivas” de uma menina para colocá-la numa grinalda “capela”, assim está Inês, sem perfume e sem cor. Morta, pálida, com as faces “do rosto as rosas” secas, murchas, sem rubor. Os sinais de beleza feminino era uma combinação de branco no rosto e colo. “branca e viva cor” e vermelho “viva cor” nas “rosas” do rosto.

"As filhas do Mondego a morte escura

Longo tempo chorando memoraram,

E, por memória eterna, em fonte pura

As lágrimas choradas transformaram.

O nome lhe puseram, que inda dura,

Dos amores de Inês, que ali passaram.

Vede que fresca fonte rega as flores,

Que lágrimas são a água e o nome Amores."

Inês é assassinada e todos os elementos da Natureza refletem esta morte, típico das produções líricas renascentistas: o sol esconde-se; os vales reproduziram em eco o último sopro de vida de Inês que continha o nome do seu amado; e as ninfas do rio Mondego choraram durante muito tempo e estas lágrimas haviam de perpetuar-se, depois, na Fonte dos Amores ou Fonte das Lágrimas, na Quinta das Lágrimas, em Coimbra. A fonte que rega as flores é refrescante porque é feita de lágrimas e de amores. O episódio termina com a referência a esta fonte mágica, dando um aspecto lendário a esta história de amor.

(Camões, Os Lusíadas, III)

*

Garcia de Resende, nas suas Trovas a Inês de Castro, põe Inês a clamar por sua vida aos seus carrascos:

“Estes homens d’onde irão?”

E tanto que perguntei,

Soube logo que era el-Rei.

Quando vi tão apressado,

meu coração trespassado

foi, que nunca mais falei.

E quando vi que descia,

Saí à porta da sala;

Devinhando o que queria,

Com grã choro e cortesia

Lhe fiz uma triste fala.

Meus filhos pus derredor

De mim, com grã humildade;

Mui cortada de temor,

Lhe disse: “havei, Senhor,

Desta triste, piedade!

Não possa mais a paixão

Que o que deveis fazer;

Metei nisso bem a mão,

Que é de fraco coração

Sem porquê matar mulher;

Quanto mais a mim, que dão

Culpa não sendo razão,

Por ser mãe dos inocentes

Que ante vós estão presentes,

Os quais vossa netos são.

E têm tão pouca idade

Que, se não forem criados

De mim, só com saudade

E sua grã orfandade,

Morrerem desamparados.

Olhe bem quanta crueza

Fará nisto Vossa Alteza,

E também, Senhor, olhai,

Pois do príncipe sois pai,

Não lhe deis tanta tristeza."

(Trovas a Inês de Castro, Garcia de Resende)

*

Também António Ferreira descreve algo equivalente,

quando Inês de Castro clama perante o rei Afonso IV:

"Esta é a mãe dos teus netos. Estes são

Filhos daquele filho, que tanto amas.

Esta é aquela coitada mulher fraca,

Contra quem vens armado de crueza.

(...)

Que te posso querer, que tu não vejas?

Pergunta-te a ti mesmo o que me fazes,

A causa, que te move a tal rigor.

Dou tua consciência em minha prova.

S’os olhos de teu filho s’enganaram

Com o que viram em mim, que culpa tenho?

Paguei-lhe aquele amor com outro amor,

Fraqueza costumada em todo estado.

Se contra Deus pequei, contra ti não.

Não soube defender-me, dei-me toda,

Não a imigos teus, não a traidores.

A que alguns segredos descobrisse

Confiados em mim, mas a teu filho,

Príncipe deste Reino. Vê que forças

Podia eu ter contra tamanhas forças."

(António Ferreira, Tragédia A Castro)

*

Pedro e Inês, cantados por Miguel Torga:

"Inês e Pedro

Antes do fim do mundo, despertar,

sem D. Pedro sentir,

e dizer às donzelas que o luar

é o aceno do amado que há-de vir…

e mostrar-lhes que o amor contrariado

triunfa até da própria sepultura:

O amante, mais terno e apaixonado,

Ergue a noiva caída à sua altura.

E pedir-lhes, depois, fidelidade humana

Ao mito do poeta, à linda Inês…

À eterna Julieta castelhana

do Romeu Português."

(Miguel Torga)

FIM DO TERCEIRO CAPÍTULO

(22/01/2011)

Ana Flor do Lácio

(Leia também: PEDRO E INÊS - A MAIS BELA HISTÓRIA DE AMOR EM PORTUGUÊS CAPÍTULOS I, II e IV)

Ana Flor do Lácio
Enviado por Ana Flor do Lácio em 30/01/2011
Reeditado em 29/08/2018
Código do texto: T2760453
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