A mesma praça, o mesmo banco. . . (publicado originalmente em 6/6/2007)

Como sempre costumo fazer, de vez em quando paro com cinema neste espaço para discorrer sobre outros assuntos. Hoje, faço reverência a um programa de televisão com 51 anos de vida, sendo 20 deles na mesma emissora. “A Praça é Nossa” ou “A Praça da Alegria” estreou em 1956 depois de Manoel da Nóbrega viajar para a Argentina. Nos nossos vizinhos, onde estava em férias, o escritor e apresentador viu, da janela do hotel, um senhor sentado no banco da praça central de Buenos Aires. E dáva-se a impressão de ser bastante conhecido nas redondezas. Todos que passavam por ele tinham algo a contar. De volta ao Brasil, Nóbrega redigiu o roteiro. Daí para a frente, foi só juntar um grupo de comediantes e trabalhar. Walter D’Ávila, Ronald Golias, Consuelo Leandro, Walter Stuart, Jorge Loredo, Borges de Barros… Foram centenas de atores que sentaram no banco da Praça. Em 1972, ao se transferir à rede Tupi, “A Praça da Alegria”, em sua estréia, contou com uma surpresa: o animador Silvio Santos apareceu de surpresa na gravação do programa. Ele e Manoel da Nóbrega eram antigos amigos. Os apresentadores trocaram palavras de carinho e se emocionaram. O atual dono do SBT se fez presente, repetindo o gesto de 1972, em 1987, quando a atração foi para a emissora de São Paulo.

Vinte anos atrás, porém, o programa sofreu reformulações. Depois de conduzido pelo próprio Nóbrega, que morreu em 1976 aos 63 anos, e Luís Carlos Miele (na Rede Globo), coube ao filho do criador do quadro, Carlos Alberto de Nóbrega, ficar com camisa titular. O nome foi trocado para “A Praça é Nossa”. A maioria dos humoristas das décadas de 60 e 1970 migrou também ao SBT. Catifunda, Rony Rios, Canarinho, Roni Cócegas etc, retiraram do baú antigo sucesso, com razoáveis pontos de audiência. No documentário “Manoel da Nóbrega: uma História”, de 2005, Silvio Santos explicou sua relação de amizade com Manoel e Carlos Alberto: “Cheguei em São Paulo em 54 sem ter o que fazer. Como precisavam de um locutor de rádio, o Manoel indicou. ‘Este menino vai bem’, ele disse.” Por falar em baú, o laço entre a dupla ficou mais estreito quando Silvio herdou o Baú da Felicidade dele. De empresa falida, em 1958, Silvio Santos construiu seu império monstruoso graças aos frutos financeiros do ex-Baú de Manoel. De volta para “A Praça é Nossa”, no SBT, o maior dos desafios caiu sobre o colo de Carlos Alberto. De redator de programas como “Família Trapo” (1967-1971), da Rede Record, e “Os Trapalhões” (1979-1986), da Globo, comandaria agora um dos carros-chefe do canal paulista. Tirou de letra com seu método rigoroso de gravação. Tudo saía certo demais.

Dotado de humor popular, chegando a resvalar no popularesco em algumas épocas, “A Praça é Nossa” se desestabilizou em 2005, quando perdeu seu ponto mais forte: Ronald Golias. A morte dele, aos 76 anos, deixou órfãos muitos fãs, entre eles este jornalista aqui. A partir deste momento, Carlos Alberto preferiu dar prioridade aos novatos, intercalando-os aos muito veteranos, como Loredo (Zé Bonitinho), de 82 anos, por exemplo. O tipo de humor de “A Praça da Alegria” jamais será o mesmo de “A Praça é Nossa”. O talento dos atores, idem. Não se pode comparar Walter D’Ávila com Buiú. Comediantes como Moacyr Franco e Saulo Laranjeira, claro, é outra conversa. Laranjeira, de fato, é um excelente contribuinte da arte. Compositor caipira, tem um programa numa emissora de Minas Gerais, além de cantar bem. Há ainda Arnoud Rodrigues, que aparece de vez em quando. O que não mudou foi o cenário. O banco, a praça, o jornaleiro, os transeuntes, enfim, um lugar que encontramos em qualquer parte do mundo. Manoel da Nóbrega encontrou em Buenos Aires. Fez daquela cena seu maior trunfo. E ele sabia ser ‘aquele senhor que lê jornal’ muito bem. É como disse seu filho naquele documentário citado acima: “Ele tinha uma energia imensa. Se ele ficasse lá, sentado e parado, sem ninguém o rodeando, o público não se importaria.” Não mesmo. Carisma é para ser aproveitado.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 16/08/2009
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