Quem decide por mim é o Estado...

Eu estava grávida, desejava muito ter esse filho, e um certo dia, por mera curiosidade fui fazer um ultrason, a princípio para saber do sexo, depois da saúde do bebê, já que passei esses cinco meses ouvindo o seu coraçãozinho.

Já havia decidido pelos nomes caso fosse menino ou menina.

De repente muda o desejo de eu ser mãe, ou de simplesmente o desejo de levar essa gravidez adiante, estou com cinco meses de gestação e embora eu muito tenha sonhado com este filho não queria mais tê-lo.

Tudo estava bem, estava formado o meu menininho, só um problema, problema o qual me fizera me odiar naquele momento, meu filho não tinha cérebro.

Declarei mais do que imediatamente o meu desejo de abortar ao médico, que ainda mais rápido respondeu que eu não poderia faze-lo, pois o Estado só permite duas situações para um aborto, se estupro, que lógico não era a minha situação, ou se representasse algum risco de morte para a mãe, que ele alegou também não ser o caso.

Voltei para casa desconsolada de chorar, contei ao meu marido o acontecido e até o atual momento também desejava muito este filho, soube de toda a verdade porém não me dizia nada, só chorava, chorava que nem criança.

Nossa vida dalí pra frente mudou muito, quantas vezes eu chorava de madrugada, e quantas vezes peguei meu marido escondido aos prantos.

Já estava de seis meses, fiz outro ultrason, nada mudou no entanto, nem uma esperança sequer, ele crescia normal, a única coisa que lhe faltava era o cérebro, uma falta que nem o vegetaria ao nascer até ficar adulto, que não o aleijaria, mas uma falta que o mataria segundos depois de nascido.

Parei de acariciá-lo na minha barriga, não falava mais com ele e nem com o meu marido, ao olhar-me no espelho me enchia de ódio, ao ver aquele barrigão chorava o dia inteiro.

Por que aquele sofrimento não acabava?

Eu já estava com a saúde mental abalada e minha expressão que a um mês era de alegria agora é só sofrimento. Meu marido que não bebia antes passou a beber agora, me pedia para abortar, poderiamos ter outros mais tarde, não que aquele não fosse importante, mas é que ele não viveria para nos dar a alegria de chorar, de ter que acordar a noite a dar de mamar, não cresceria, não sorriria, não iria correr.

Eu também queria tirar, mas tinha um Estado, uma justiça que me impedia de fazê-lo, como se este pudesse decidir por mim.

Minha saúde mental e a do meu marido estava muito comprometida, e cada vez que íamos ao pré-natal menos esperança tínhamos desse pequeno vingar...

Já aos sete meses não sabia mais o que fazer, começou em mim um desejo de suicídio, mas o amor do meu marido impedia-me de fazê-lo. Ele agora mais centrado tentava me consolar, embora não conseguisse e nem estava em condições pra isso, meus sonhos iam a cada dia por águas abaixo, e cada dia que se passava a barriga crescia mais, e na mesma medida crescia meu ódio e o desejo de morrer.

Oito meses, quanto mais passava o tempo, mais o tempo demorava a passar, não tinha fim o meu sofrimento, e nem as lágrimas saiam mais, minha'lma estava seca e o meu coração estava oco, o sofrimento cada vez mais aparente em nós dois e no restante da família, todos estavam anciosos para que acabasse aquele sofrimento.

O nono mês enfim chegou, e o dia que Nicolas nasceu que era pra ser de festa, foi de pura tristeza, principalmente porque houve complicações no parto, eu não ajudava e o bebê também não, e já não se podia fazer uma cesária.

Ele nasceu e viveu exatos vinte segundos, eu entrei em coma profundo que durou nove dias, e uma anemia que não passa nunca.

E o Estado acha que pode saber de algo, decidir se eu poderia ou não abortar, se preocupou com a minha vida, mas a minha saúde mental não se preocupou um segundo sequer, e nem a saúde da minha família.

Hoje três anos se passaram, e o medo de uma nova gravidez é imensa, o que poderia ser evitado com aquele aborto, mas a ausência dele só piorou.

Natali Bambam Cuore

bambamnaty@hotmail.com

Bambanzinha
Enviado por Bambanzinha em 10/11/2005
Código do texto: T69775
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