Ação Monitória no Novo CPC
Texto de autoria do professor José Rogério Cruz e Tucci, advogado e professor da USP.
Vale a pena ler esta maravilhosa aula do mestre que sabe muito!
Entre os procedimentos especiais, o novo Código de Processo Civil manteve, nos artigos 700 a 702, a denominada ação monitória.
Apresentando-se mais aperfeiçoada, o novel diploma processual recepcionou inúmeras tendências já consagradas nos tribunais, por certo, para evitar desnecessárias dúvidas e polêmicas, visando sobretudo municiar o nosso sistema legal com um instituto que possa ser utilizado com maior segurança e frequência na praxe jurídica.
A ação monitória consiste no meio pelo qual o credor de determinada obrigação, cujo crédito esteja comprovado por documento hábil, requer a prolação de provimento judicial consubstanciado, em última análise, num mandado de pagamento de quantia em dinheiro ou de obrigação de fazer ou não fazer, ou, ainda, de entrega de coisa.
Já no que se refere à sua estrutura, tal demanda é veiculada mediante procedimento especialíssimo, em razão da sumariedade formal da cognição e de outros aspectos que o conotam.
Ademais, nos moldes como estabelecido no artigo 700, trata-se de procedimento monitório documental, que é caracterizado pela exigência de prova escrita do crédito, desprovida de eficácia executiva.
A petição inicial, a ser elaborada como qualquer postulação preambular, deve indicar, em primeiro lugar, a teor do artigo 319, inciso I, do Código de Processo Civil, o juízo destinatário do pedido de tutela jurisdicional.
O endereçamento no cabeçalho da inicial deve levar em consideração as regras de competência estabelecidas no artigo 42 e seguintes, bem como aquelas de organização judiciária, assentadas em cada estado da Federação.
Essa indicação constante da petição inicial geralmente fixa o juízo da demanda, embora sempre sujeito a alteração ex officio ou por meio de arguição, pelo réu, de incompetência absoluta ou relativa (artigo 337, inciso II, e parágrafo 5º, do Código de Processo Civil).
Em seguida, o artigo 319, inciso II, exige a qualificação do autor e do réu da forma mais precisa possível, inclusive com a especificação do respectivo endereço eletrônico, o domicílio e o local da residência.
A referência ao estado civil, dependendo da natureza da obrigação, delineia-se importante para o exame da necessidade de outorga uxória ou marital (artigos 1.647 do Código Civil e 73 do Código de Processo Civil), ou, ainda, da imprescindibilidade da presença de ambos os cônjuges no processo (litisconsórcio necessário — artigo 114).
O registro do e-mail das partes também é exigido. Num ambiente cada vez mais dominado pela comunicação virtual, é sem dúvida um dado pessoal significativo para os desígnios do processo eletrônico. No novo estatuto processual, a citação e a intimação podem ser efetivadas por via eletrônica (artigos 246, inciso V, e 270).
O domicílio também é pertinente para aferição da competência, e o endereço da residência, relevante para a eventual intimação pessoal da parte. É dever da parte comunicar, nos autos do processo, a atualização de seu endereço residencial sempre que ocorrer qualquer alteração “temporária ou definitiva” (artigo 77, inciso V).
Não sendo disponíveis tais informações referentes ao réu, poderá o autor, na própria petição inicial, requerer ao juiz que sejam deferidas diligências para a obtenção das mesmas (artigo 319, parágrafo 1º).
De qualquer modo, a petição inicial não será indeferida por insuficiência dos dados pessoais exigidos, desde que possível a citação do réu (parágrafo 2º). Igualmente, não será indeferida se a obtenção prévia de tais informações “tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à Justiça” (parágrafo 3º).
Além de seu requisito extrínseco ou externo, vale dizer, a forma escrita, dentre os requisitos intrínsecos, o inciso III do artigo 319 exige que conste da petição inicial a exposição do fato e dos fundamentos jurídicos do pedido. Assim, a narração, ou narrativa, levada a cabo pelo autor, nada mais é do que a descrição fática e jurídica dos fundamentos da pretensão deduzida, cujo objeto deve ser efetiva e positivamente indicado no petitório.
O demandante tem ainda o ônus de especificar o valor devido, caso se trate de obrigação de pagar quantia em dinheiro, com a devida demonstração discriminada em memória de cálculo (artigo 700, parágrafo 2º, inciso I).
Evidentemente que os fatos articulados na inicial deverão estar roborados pelos documentos (originais ou cópias autenticadas) acostados à petição inicial.
Depois da narração da causa de pedir, o autor deverá formular a sua pretensão, consubstanciada no pedido (artigo 319, inciso IV). O pedido imediato, ou seja, a espécie de tutela jurisdicional pleiteada, e, ainda, o pedido mediato (a natureza da obrigação que deverá ser imposta pela sentença).
O valor a ser atribuído à causa corresponderá ao da quantia, ao da coisa pretendida, ou da estimativa do proveito econômico perseguido (artigo 700, parágrafo 3º).
Tenha-se presente, outrossim, que, além de repercussão no terreno fiscal para fins de recolhimento de custas processuais, inúmeras sanções encontram-se atreladas ao valor da causa, como, por ilustração, as multas contempladas nos artigos 77, parágrafo 2º, 81 e 334, parágrafo 8º, do Código de Processo Civil.
O novo artigo 292, a exemplo do revogado artigo 259, estabelece os critérios legais para se aferir o valor da demanda.
Saliente-se, ainda, que, consoante o disposto no parágrafo 3º do mesmo artigo 292, o juiz poderá corrigir “de ofício e por arbitramento” o valor atribuído à causa, “quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor”.
O réu, todavia, continua podendo impugnar o valor dado à causa. No terreno da ação monitória deve fazê-lo nos embargos ao mandado.
Como os elementos de convicção, na ação monitória, devem ser pré-constituídos, perde qualquer relevo o protesto pela produção de provas (artigo 319, inciso VI).
Como importante novidade, a petição inicial deverá também conter, a teor do inciso VII do mesmo artigo 319, a expressa disposição do demandante à realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação, prevista no subsequente artigo 334. Esta mesma exigência vem reiterada no parágrafo 5º desse artigo 334, que determina: “O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição...”.
Por fim, estabelece o parágrafo 4º do artigo 700 que, além dos requisitos ditados pelo artigo 330 do Código de Processo Civil, a petição inicial ser indeferida na hipótese de não atender à determinação do parágrafo 2º do artigo 700, acima referida.
Tenha-se presente, no entanto, que o indeferimento somente ocorrerá se o autor não cumprir a ordem de emenda da petição inicial, prevista no artigo 321 do novo estatuto processual, no prazo de 15 dias.