AS SOCIEDADES LIMITADAS - PRIMEIRA PARTE
 
Prof. Aclibes Burgarelli
AULAS DE SETEMBRO E OUTUBRO DE 2015.
 
 
SOCIEDADES LIMITADAS.
 
1 - Breve Introdução.
 
O revogado Decreto no 3.708, DE 10 DE JANEIRO DE 1919, regulou a denominada sociedade por cotas de responsabilidade limitada. De acordo com o texto legal, esse tipo societário fora considerado sob a ótica contratualista, mediante participação de duas ou mais pessoas com obrigação de contribuírem para formação do capital social, com assunção de responsabilidade individual (quanto à contribuição de cada participante) e solidária (quanto à integralização do capital social).
 
Referido tipo, após mais de oitenta anos passou a integrar o rol dos tipos societários no vigente código civil, contudo com a denominação “sociedade Limitada” (arts. 1.0-52 a 1.087).  
 
Quanto à responsabilidade dos sócios, desde o sistema anterior constou menção sobre o conteúdo do contrato (art. 2º, Decreto 3.708), assim: “devendo estipular ser limitada a responsabilidade dos sócios à importância total do capital social”.
 
Com a evolução do tipo societário, consagrou-se na doutrina e na jurisprudência que  a responsabilidade dos sócios seguia a seguinte ordem: em primeiro lugar, a responsabilidade da pessoa jurídica, ou seja da sociedade. Uma vez detectado insuficiente o patrimônio desta, subsidiariamente responderiam os sócios, de forma solidária até ao montante do capital que, eventualmente, deixara de ser integralizado.
 
Desse modo, se não houvesse informação de fraude no tocante à administração societária, tampouco valor em aberto para integralização do capital social, ausente estaria a possibilidade de responsabilidade pessoal dos sócios, em relação às dívidas com terceiros.
 
A atividade econômica de pequenos e médios empreendimentos comerciais, exercida no início da década de vinte, impunha o emprego de regra que limitasse a responsabilidade de sócios nas sociedades comerciais (e mesmo não comerciais),  porque a regra geral da responsabilidade ilimitada, no código comercial, não estimulava a constituição de sociedades e afastava investimentos e desenvolvimento econômico.  
 
Em assim sendo é da natureza da sociedade pessoal, por cotas a limitação de responsabilidade dos sócios, quanto às obrigações com terceiros, evidentemente desde que cumpridas algumas condições conforme já se mencionou linhas atrás e ausente qualquer indício de fraude nos atos de administração da sociedade.
 
Esclareça-se que, no vigente código civil, já consta regra a respeito de circunstâncias de fato que motivam a responsabilidade de administradores e, até mesmo, de sócios, no caso de ilícitos:
 
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
 
 
Internamente, ou seja, no relacionamento formado entre os sócios contratantes e a sociedade há um tipo de responsabilidade pessoal individual e coletiva. Individualmente os sócios são obrigados à integralização (pagamento) dos valores contributivos (cotas), referidos no contrato. A inadimplência faz com que se atribua ao sócio a denominação “remisso”. A remissão é causa de exclusão do sócio, em relação à sociedade.
 
No tocante ao valor que a sociedade deixou de receber, por causa da inadimplência do denominado sócio remisso, todos os demais respondem solidariamente, perante a sociedade e, conforme o caso, na falência da sociedade por exemplo, perante à massa falida.
 
Não traz prejuízo dar ênfase ao fato de que as considerações retro formuladas o foram tendo em conta atividade regular da sociedade e da administração; porquanto situação de fraude ou de ilicitude traz consequências outras de responsabilidade, conforme se verá adiante.
 
 
2 - Os sócios nas sociedades limitadas.  
 
2.1. Sócio pessoa natural.  

Para participação de sócio, pessoa natural, no contrato de sociedade, há uma observação necessária, ou seja: a pessoa deverá ter capacidade, ou conforme o caso estar devidamente assistida por quem tiver condição de fazê-lo. Capacidade (absoluta ou relativa) é requisito para o exercício, em nome próprio ou com assistência, da atividade econômica.
 
Na hipótese de pessoa natural, relativamente capaz ou pessoa jurídica o que se observa é o seguinte: O menor, por exemplo, segundo as regras da capacidade civil, não poderá exercer, por si, atividade econômica, na condição de empresário ou na condição de administrador de sociedade empresária; contudo, não há vedação para que, na modalidade de sócio, integre o contrato de sociedade e, se relativamente incapaz, o fará por meio do instituto da ASSISTÊNCIA.
 
Atente-se para a regra do art. 974 do código civil.
 
Art. 974..............................................................................
§ 3o  O Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais deverá registrar contratos ou alterações contratuais de sociedade que envolva sócio incapaz, desde que atendidos, de forma conjunta, os seguintes pressupostos: (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011)
 I – o sócio incapaz não pode exercer a administração da sociedade; (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011)
II – o capital social deve ser totalmente integralizado; (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011)
III – o sócio relativamente incapaz deve ser assistido e o absolutamente incapaz deve ser representado por seus representantes legais. (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011)

 
O assunto foi objeto de enfrentamento pelo Des. Pereira Calças, Ilustre professor de Direito Comercial, de sorte que oportuna é a reprodução de trecho de sua autoria, em decisões que formam jurisprudência.
 
“A questão foi levada ao Supremo Tribunal Federal que, em 26-5-1976, por seu plenário, julgou o Recurso Extraordinário nº 82.433-SP, em acórdão relatado pelo Ministro Xavier de Albuquerque, assim ementado: “Sociedades por quotas de responsabilidade limitada. Participação de menores, com capital integralizado e sem poderes de gerência e administração, como cotistas. Admissibilidade reconhecida, sem ofensa ao art. 1º do Código Comercial.” (...) Em suma, interpretando a questão sob a óptica do Decreto nº 3.708/19, pacífico o entendimento jurisprudencial e da grande maioria da doutrina, no sentido de que o menor, púbere ou impúbere, regularmente assistido ou representado na forma da legislação civil, pode ingressar como sócio de sociedade limitada, seja na condição de herdeiro de sócio falecido, seja na subscrição originária de contrato de sociedade em constituição, seja pela aquisição posterior de quotas, desde que o capital esteja totalmente integralizado e ao menor não seja atribuída função de administrador. A Questão da participação dos menores nas sociedades limitadas não deverá ensejar discussões com a vigência do Código Civil de 2002, haja vista que o artigo 1.052 preceitua que na sociedade limitada a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas cotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social. Manteve-se, portanto, a regra anterior que estabelece a responsabilidade solidária de todos os sócios pela integralização do capital das sociedades limitadas e, dessa forma, bastará seguir a orientação hoje consagrada, para afirmar-se que os menores poderão ser sócios das sociedades limitadas, mantida a exigência da total integralização do capital social e a proibição do exercício das funções de administrador.”1 (grifos nossos).
Como se vê, não há qualquer irregularidade na participação de menor de idade no quadro societário da pessoa jurídica, desde que seja totalmente integralizado o capital social, não exerça o sócio menor a administração da empresa e seja ele representado ou Assistido”.
 
 
2.2 – Sócio pessoa jurídica.
 
Não há impedimento para que outra pessoa jurídica, que não a sociedade evidentemente, seja admitida no quadro de sócios. Nesse caso far-se-á presente por seu representante legal, indicado no contrato social quanto de sua constituição.
 
Ilustra-se com o seguinte esquema:
 
Quadro de sócios da sociedade “X” ltda.
 

 
  • Fulano de Tal – pessoa natural, maior e capaz.
    Sicrano de Qual – pessoa natural, relativamente capaz, assistido por seu pai.
    Sociedade “Y” – pessoa jurídica, por seu representante legal Sr. Beltrano.
 
 
É importante registrar que, em se cuidando de representação legal de sociedade que, no seu quadro de sócios, conta com pessoas naturais e pessoas jurídicas, é de rigor assinalar que somente pessoas naturais poderão ser indicadas para atos da administração societária (art. 997, VI, código civil).  Referido artigo menciona “pessoas naturais” e não “sócios”, de sorte que a administração da sociedade poderá recair em pessoa natural não sócia da sociedade.
 
Uma vez que não há restrição legal para o procedimento retro (nomeação de não sócio, para administração da sociedade), tal como ocorre em relação às sociedades por ações nas quais os diretores e membros do conselho fiscal devem ser pessoas físicas (art. 146 da Lei 6.404/76), tem-se que o sistema também permite a participação de outra ou outras s sociedades, na condição de sócias.
 
Se assim se permite, correto é afirmar que o representante legal de uma sociedade, p. ex., sociedade “X Ltda”, Fulano de tal, poderá ser designado administrador da sociedade “Y Ltda” , pelo fato de que esta (“Y” Ltda) é sócia daquela (“X” Ltda).

Em outros tipos societários há certas particularidades: nas sociedades em nome coletivo nas quais somente pessoas físicas podem ser sócias, não se cogita de nomeação de representante legal de pessoa jurídica sócia (art. 1.039 e 1.042 do NCC); nas sociedades em comandita simples, a administração é exclusividade dos sócios comanditados que devem ser, obrigatoriamente, pessoas físicas (art. 1.045 e 1.047 do código civil. 

Anote-se que é vedada, na sociedade limitada, a contribuição em serviços, por parte dos sócios, visto que essa faculdade é específica das sociedades simples e, ainda assim, se os serviços decorrerem de atividade profissional intelectual, de natureza literária, artística ou científica.

De outra banda, as sociedades simples podem adotar o tipo limitida, de sorte que passam a ser regidas, no que couber, pelas regras do tipo adotado.

Se a sociedade simples adotar o tipo societário da responsabilidade limitada, reger-se-á, no que couber pelas regras desta, o que não significa que se deva aplicar o preceito que veda a contribuição de serviços, por parte dos sócios. A prestação dos serviços intelectuais, de natureza literária, artística ou científica é da natureza, da essência,  das simples e, ainda que se estabeleça a responsabilidade limitada e solidária dos seus sócios, a essencial prestação de serviços não se altera.  
 
  

 
AULA DE 19 DE OUTUBRO DE  2015
 
4 – ALGUNS TIPOS DE RESPONSABILIDADE NAS SOCIEDADES LIMITADAS.
 

4.1 – Responsabilidade societária. 4.1.1 – Responsabilidade da sociedade.
 

 
  1. – Responsabilidade dos sócios.
     
    1. - Em relação à sociedade.

      – Algumas Modalidades de responsabilidade em Relação a Terceiros.
       
                       – Responsabilidade Civil.

      – Responsabilidade Trabalhista.
      – Responsabilidade Tributária.

      – Responsabilidade Falimentar.

      – Outros tipos.                  
 
 
4.1 – RESPONSABILIDADE SOCIETÁRIA.
 
Sociedade é espécie de pessoa jurídica (art. 44, II, cód. Civil), formada por meio de contrato, celebrado para o fim de se obter um resultado economicamente satisfatório. Há conceito legal, a respeito, no art. 981 do código civil; assim:
 
“Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados
 
Em sendo contrato, já se percebe que os sócios contratantes assumem responsabilidades: em primeiro lugar, em relação à lei material “erga omnes” e, ao depois, a lei criada por eles, o contrato.
 
Não é somente os sócios que assumem responsabilidade diante da sociedade, pessoa distinta; por conseguinte, também assumem responsabilidade por eventual prejuízo que, de sua atividade, traga a outrem, em situações que transcendem a legalidade dos atos e negócios.  A sociedade é pessoa, embora jurídica, distinta das pessoas naturais, dotadas estas de racionalidade biológica. A pessoa jurídica é ficção e, nessa condição, seus órgãos vitais não são biológicos; antes, emprestados de pessoas naturais. Há pessoas naturais (sócios ou não sócios) que cuidam da Administração da sociedade; contudo, há também pessoas naturais (sócios) que não cuidam da administração da sociedade, por expressa vontade da maioria.
 
É nesse cenário de mistura de pessoas (naturais e jurídicas) que, de acordo com a regularidade ou irregularidade de atos, de negócios e mesmo de procedimentos, que serão estudadas os diversos perfis de responsabilidade societária.
 
 
 

 
– RESPONSABILIDADE DA SOCIEDADE PERANTE TERCEIROS.
 Conforme se aduziu, sociedade é pessoa jurídica com vida própria, patrimônio próprio, nome próprio, endereço, honra e, se registrada, capaz de atos para a vida econômica; apta, pois, para contrair obrigações e gozar de direitos.
 
 
 
No formato acima descrito, por eventual dano causado a outrem, estará sujeita à aplicação da regra do art.927, do código civil:
 
Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
 
Verificar-se-á que não é somente o princípio geral da responsabilidade subjetiva que se aplica, no caso de ilicitude, mas também outros princípios que norteiam o sistema da responsabilidade, por exemplo, a responsabilidade contratual e a responsabilidade objetiva (ex. código do consumidor), vale dizer responsabilidade derivada da premissa maior (do código civil) e, também, do contrato social e de violação de outras leis (trabalhistas, tributárias, falimentar, consumidor, propriedade industrial etc.).
 
Seja qual for a implicação quanto à responsabilidade, certo é que a reparação é feita com o patrimônio da sociedade. O patrimônio é o lastro que garante direitos de terceiros em relação à atividade da pessoa jurídica, no caso a sociedade.
 
TJ-PR - Ação Civil de Improbidade Administrativa 10186520 PR 1018652-0 (Acórdão) (TJ-PR)  -  Data de publicação: 27/05/2013
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DECISÃO DO MAGISTRADO SINGULAR QUE INDEFERIU PEDIDO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL.OBTENÇÃO DE CÓPIA DAS DECLARAÇÕES DE IMPOSTO DE RENDA DE TITULARIDADE DOS EXECUTADOS. ADMISSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 591 CPC . PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PARTICULAR. REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA "O patrimônio do devedor é a garantia do credor, de acordo com o princípio da responsabilidade patrimonial estampado no artigo 591 , do Código de Processo Civil . Assim, o Juiz na condução do processo de execução deve adotar todas as medidas necessárias, previstas em lei, para a satisfação do credor, em consideração ao princípio da efetividade da tutela jurisdicional."1 RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
 
Assentado que o patrimônio é a base que sustenta as obrigações da sociedade, não raro a presença de situações embaraçosas para essa realidade, porque se encontram patrimônios de sociedades esvaziados por inúmeras razões, com o que se frustra a satisfação da obrigação existente.
 
São esses casos que redirecionam a responsabilidade às pessoas dos sócios, de modos diferentes, conforme adiante será considerado.
 
 
 
4.2. – A RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS.
 
4.2.1 – RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS EM RELAÇÃO À SOCIEDADE.
 
A aferição da responsabilidade dos sócios, em relação à sociedade, demanda busca do tipo societário, adotado pelos sócios, na constituição da pessoa jurídica, visto que, conforme o tipo adotado decorre a respectiva responsabilidade: limitada, ilimitada e mista.
 
Aqui se cuidará da responsabilidade limitada, observada no tipo societário específico. Há, no código civil, tipos nominados dentre os quais o tipo sociedade limitada, cujo capital é representado por cotas sociais, proporcionais ao montante do capital estimado. Antigamente denominadas sociedades por cotas de responsabilidade limitada. Há, contudo, o tipo sociedades de capital, as denominadas sociedades anônimas, cuja limitação de responsabilidade é revelada na formação do capital social, isto é capital social representado por ações. Há outros tipos de parcelas que poderão compor o capital social, p. exemplo, debêntures; porém, aqui não se cuidará desse tipo societário, isto é, das sociedades de capital.
 
As sociedades limitadas, por alguns, denominadas sociedades de pessoas e, por outros, mistas, encontram guarida legal a partir do art. 1.052 e vai até 1.087, do código civil.
 
Dispõe a lei: “Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada                                            sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social”.
 
 
No tipo societário de que cuida o artigo suso referido, a responsabilidade dos sócios bifurca-se; assim: individualmente, cada sócio está obrigado a integralizar o montante de cotas que subscreveu; contudo, coletivamente, o grupo de sócios obriga-se pelo total do capital social contratado; portanto, se não foi feita a integralização, todos, solidariamente, estão obrigados a fazê-lo.
 
A solidariedade não se presume, resulta da lei ou do contrato; aqui a resultante é clara, está na lei.
 
É importante que se consigne o seguinte: Ao se proceder ao estudo e compreensão do artigo 1.052, do código civil, quanto aos limites da responsabilidade dos sócios, em relação à sociedade e à certeza do exaurimento da mesma responsabilidade no momento em que se verifica a integralização do capital social, está a se considerar o fato de inexistência de fraude, ou de comportamento ilícito por iniciativa dos sócios ou mesmo de pessoas ligadas à sociedade. No caso de fraude, a situação é bem diferente e será objeto de exame mais adiante.
 
O sócio que deixa de integralizar as cotas subscritas, tudo o que prometeu contribuir para com a sociedade, se, notificado, não o fizer, poderá ser excluído  da relação contratual plurilateral, por força do art. 1.004 do código civil; essa situação o considera sócio remisso.
 
“Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora.
Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031  (TJ-MG - 105400801500190011 MG 1.0540.08.015001-9/001(1) (TJ-MG)  Data de publicação: 30/09/2008”.
 
 
 
 
4.2.2 – ALGUMAS MODALIDADES DE RESPONSABILIDADE EM RELAÇÃO A TERCEIROS.
 
4.2.2.1.–  Responsabilidade Civil.
 
O sistema de direito societário, contido no código civil, dá dois tratamentos diferentes às sociedades simples. O primeiro refere-se ao conceito de empresarialidade (art. 966, c.c. 982, do código civil), para o fim de se classificarem as sociedades em empresárias e simples (parágrafo único, art. 966 e segunda parte do art. 982, do código civil). Sob essa ótica, a sociedade simples é exceção em relação à sociedade empresária. O segundo tratamento diz respeito aos tipos societários, dentre os quais se tem as sociedades simples não mais consideradas exceção da empresarialidade, mas regra geral para todos os tipos societários.
 
Conforme disposto no art. 1.053 do código civil, o que for omisso no elenco de regras para as sociedades limitadas, será suprido subsidiariamente com as regras das sociedades simples.  Na sequência dos artigos regentes das sociedades limitadas não há preceito que regule expressamente a relação dos sócios com terceiros; entretanto, na sequência dos artigos regentes das sociedades simples, a partir do art. 1.022, há normas expressas nesse sentido e, destas, extraem-se as informações pertinentes ao assunto de que ora se cuida.
 
Três artigos estabelecem três princípios fundamentais aplicáveis às sociedades limitadas, no tocante à relação dos sócios com terceiros: a) art. 1.024 que estabelece o princípio da subsidiariedade; b) o art. 1.025 que demonstra o princípio da sucessão de responsabilidade e, finalmente, c) art. 1.026 com o princípio da admissibilidade de apuração de haveres para satisfação de credores.
 
Art. 1.024. Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais.
 
Art. 1.025. O sócio, admitido em sociedade já constituída, não se exime das dívidas sociais anteriores à admissão.
 
Art. 1.026. O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação.
Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação.
 
Pelo princípio da subsidiariedade, insculpido no art. 1.024 do c. civil, há duas hipóteses para reflexão: a) não integralização do capital social, por um ou alguns sócios, fato que caracteriza infração contratual, com geração de responsabilidade contratual e b) cometimento de fraude da administração ou mesmo de sócio pela prática de ato ilícito ou ato que comprometa a sociedade como pessoa distinta, por exemplo a previsão descrita no art. 50 da lei civil.
 
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
 
Na hipótese da alínea “a” (não integralização do capital social) terceiro credor tem direito de ação contra o sócio remisso, se este não foi objeto de exclusão pela sociedade, a fim de que integralize o capital social faltante, para que se cumpra o disposto no art. 1.024 ou no art. 1.026, ambos do código civil.
 
Observe-se que, não se está a cogitar, como aconteceu linhas atrás, com a hipótese de situação regular no comportamento dos sócios, mas situação de ilicitude e, porque o direito não tutela a ilicitude, a situação dos sócios ou da administração aqui é tratada de modo diferente. 
 
Em conclusão consigne-se o seguinte: Nas sociedades limitadas, a responsabilidade civil dos sócios restringe-se ao montante do capital subscrito e não integralizado de modo solidário, quanto à parte faltante para completar o capital social.
 
Em não havendo irregularidades a serem apuradas ou violação da lei ou do contrato, ou ainda a presença de fraude, quer nos atos administrativos quanto na concordância ou omissão dos sócios, a situação muda e a responsabilidade civil será apurada com possibilidade de se alcançarem os bens particulares dos administradores ou dos sócios.
 
 
A SEGUIR, EM PRÓXIMO ARTIGO,
 
4.2.2.2. – RESPONSABILIDADE TRABALHISTA DOS SÓCIOS.

4.2.2.2. – RESPONSABILIDADE POR DÍVIDAS TRABALHISTAS DOS SÓCIOS.
 
No sistema jurídico laboral prevalece a regra da sucessão do empregador, constante do art. 448 da Consolidação das Leis do trabalho, de seguinte teor:
 
Art. 448 - A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.
 
De outra banda, o art. 2º, §2º, da mesma CLT, consigna hipótese de responsabilidade solidária de grupo de empresas, quanto a débitos trabalhistas.
 
  Art. 2 º (omissis)
 § 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

 
O professor Octávio Bueno Magano[1] sustenta que a hipótese referida no art. 2º, § 2º, da CLT é regra de desconsideração de pessoa jurídica, própria do direito trabalhista e tem cabimento sempre que existir, de qualquer forma, grupo empresarial, sem que haja necessidade de se buscar a existência de fraude.
 
Ao se adotar o posicionamento do Ilustre professor, há que se considerar que, no tocante à desconsideração da pessoa jurídica, além da modalidade prevista no código civil, no art. 50, tem-se outra, a da C.L.T., que deverá ser levada em consideração em litígios na Justiça do Trabalho.
 
Reforça a tese do professor mencionado a regra contida no art. 8º da mesma C.L.T.
 
Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
Parágrafo único - O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

 
 
A jurisprudência trabalhista não destoa da linha traçada em benefício do trabalhador, considerado hipossuficiente, conforme se verifica:
 
Ementa: Responsabilidade do sócio ou acionista. Cabimento. Demonstrada a insuficiência de bens da ré, respondem seus sócios ou acionistas pelo não pagamento dos débitos trabalhistas constituídos, eis que diante do princípio da alteridade inerente ao contrato de trabalho, não há que se transferir ao trabalhador os riscos do negócio. (TRT/SP 00825-1992-481-02-00-8).


4.3.3 – Responsabilidade por dívidas tributárias.

 
Dois artigos do Código Tributário Nacional são pertinentes ao tema em questão:
 
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:
 
I - os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores;
 
II - os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados;
 
III - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;
 
IV - o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio;
 
V - o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário;
 
VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;
 
VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
 
Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório.
 
 
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
 
I - as pessoas referidas no artigo anterior;
 
II - os mandatários, prepostos e empregados;
 
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
O artigo 134, item VII, suso referido, estabelece a responsabilidade tributária, solidária relativamente a certas pessoas relacionadas com o contribuinte se, por alguma razão ocorrer impossibilidade de se exigir o cumprimento da obrigação diretamente à pessoa obrigada e se detectar intervenção ou omissão que as envolvam.
 
Mais adiante, no item VII,  faz-se referência aos sócios que, no caso de liquidação da sociedade, isto é no seu encerramento, responderão por causa da impossibilidade de exigência de pagamento por parte da sociedade.
 
Trata-se de responsabilidade solidária, visto que a tutela tributária não admite imprudência, negligência, omissão o descuido no trato financeiro e obrigacional da sociedade. Verifica-se, por este comando legal, que a hipótese é objetiva, isto é ocorre no caso de encerramento da sociedade, sem observância das cautelas e providências legais, quanto às obrigações tributárias.
 
Para a hipótese mencionada, editou-se a Súmula    do Colendo Superior Tribunal de Justiça, conforme segue:
 
 
Súmula nº 435 "Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente".
 
 
 
O art. 135, de sua parte, é mais abrangente, uma vez que consigna a responsabilidade pessoal dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
 
Nesse referido artigo está expresso o fundamento jurídico: excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
 
Uma vez que, com a infração instala-se o direito de ação, por parte do Poder Público e porque o fato delituoso deverá ser objeto de prova, sempre vigorou o entendimento voltado à regra de apuração de responsabilidade, por meio de procedimento administrativo, com ampla defesa e contraditório, de sorte a poder o contribuinte defender-se dos termos da notificação.  Vê-se, pois que não se admite acusação, contra o contribuinte, sem que se prove o fato constitutivo do direito da Fazenda Pública.
 
A propósito, foi editada a Súmula 430, no Superior Tribunal de Justiça, na seguinte linha de orientação jurisprudencial.
 
 
Súmula nº 430 do STJ: "O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente".
 
 
Consagrou, por conseguinte, o princípio: o ônus da prova incumbe a quem alega e, no caso de responsabilidade solidária do sócio gerente (e de outros) há que se provar o fato constitutivo, sem o qual não será possível a constituição da dívida ativa e do título líquido, certo e exigível (a respectiva Certidão).
 
Durante muito tempo a conduta jurisdicional do Superior Tribunal de Justiça, foi no sentido de seguir sua própria orientação, de modo que para que se admitisse o redirecionamento da execução contra a sociedade às pessoas dos sócios ou administradores, a Fazenda Pública devia cumprir o ônus da prova.
 
Surpreendentemente, a Ministra Denise Arruda, integrante do S.T.J., foi designada relatora no Recurso Especial  nº 1.104.900/ES e, cumprimento sua tarefa de elaborar o voto escoteiro da Turma, mudou a orientação e assumiu o entendimento no sentido de transferir o ônus da prova ao contribuinte, ou seja ônus de provar fato negativo.
 
A prova negativa sempre foi refutada e rejeitada no sistema processual brasileiro, contudo, agora, com a nova orientação, no momento em que é possível a utilização do instrumento “recursos repetitivos”, corre-se o grande risco teratológico de se admitir, na teoria geral do processo, o ônus de prova negativa.  Caberá ao contribuinte provar que não praticou o ato que a lei considera causa para responsabilidade.
 
Cada um interprete como quiser o fato, mas que se semeia insegurança jurídica isso é verdade e coloca o último baluarte, o Judiciário, na contramão da democracia, da cidadania e da dignidade da pessoa humana.


 
 
[1] MAGANO, Octavio Bueno “Os grupos de empresa no Direito do Trabalho”. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais. 
 
aclibes
Enviado por aclibes em 29/09/2015
Reeditado em 27/03/2016
Código do texto: T5398865
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