Inativo da PM pode ser aproveitado na segurança pública
Apesar das dificuldades estruturais, o Brasil busca alternativas para oferecer um pouco mais de segurança para os administrados. Alguns estados-membros da federação têm apresentado projetos com o intuito de utilizar os policiais militares inativos nos serviços policiais destinados à segurança de escolas, hospitais, prontos-socorros e outros locais que precisam de uma maior atenção por parte do Estado.
Buscando contribuir para uma melhoria da segurança pública, o Mato Grosso do Sul criou, por meio de lei estadual, o CVMI — Corpo Voluntário de Militares Estaduais Inativos. Mas, o procurador geral da Republica, Antonio Fernando Souza, ingressou, no Supremo Tribunal Federal, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 3.637) contra a tal lei.
Para o procurador-geral da Republica, a Lei estadual 1.699/96 contraria o artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Ainda segundo o procurador-geral, a lei fere os princípios constitucionais referentes ao ingresso no serviço público, porque a contratação para as funções públicas deve ser por meio de concurso público.
O estado de Minas Gerais adotou recentemente procedimento semelhante ao do Mato Grosso do Sul no tocante aos militares estaduais inativos, que passaram para a reserva remunerada da corporação, os quais poderão ser revertidos para o serviço ativo da força policial desde que tenham menos de 60 anos e se encontrem em plenas condições físicas e de saúde para que possam atuar no policiamento voltado para a preservação de escolas públicas, creches, prontos socorros e hospitais.
A respeito do assunto, a doutrina assim se manifestou: “segundo pesquisas realizadas pelos institutos de opinião, a segurança pública e o desemprego são as questões que recebem atualmente uma maior atenção das famílias brasileiras”. No atual sistema, uma pessoa que não tenha uma fonte de renda se sente marginalizada perante a sociedade que mais valoriza o ter que o ser. A banalização dos costumes tem levado a uma sociedade consumista que acredita que o uso da força é suficiente para o combate a criminalidade.
O Estado necessita de mais funcionários para que possa atender a demanda crescente da população brasileira nos diversos setores, educação, saúde, habitação, segurança pública, justiça, entre outros, que cresceu de forma considerável nos últimos anos. Em 1970, o Brasil tinha 90 milhões de habitantes e, atualmente, possui uma população que ultrapassa os 170 milhões.
Mas o Estado não possui os recursos necessários para que possa contratar novos servidores. A reforma da previdência proposta pelo Estado tem como fundamento o déficit existente que impede o pagamento de pensões integrais às pessoas que, no decorrer dos anos, contribuíram para o crescimento efetivo do país.
Com o objetivo de exercer de forma efetiva suas funções, com um aumento do efetivo sem a necessidade de novas contratações, a Polícia Militar de Minas Gerais resolveu empregar os policiais inativos no reforço ao policiamento escolar e em postos de saúde.
A utilização destes policiais que se dedicaram ao serviço público por 30 anos permitirá que um maior número de policiais possam ser empregados nas atividades ostensivas, otimizando os recursos da corporação em um momento que o país passa por dificuldades econômicas.
Os policiais militares que aderirem ao programa serão remunerados com um acréscimo em suas aposentadorias no período em que estiverem em atividade, mas o custo será menor do que se o Estado contratasse novos servidores públicos.
Segundo o Estatuto de Pessoal da Polícia Militar de Minas Gerais, o militar estadual que for transferido para a reserva poderá retornar ao serviço ativo. No estado de Minas Gerais, tanto o oficial (2º tenente a coronel) como a praça (soldado a subtenente), após 30 anos de efetivo serviço, são transferidos para a reserva. Nos demais estados-membros da federação, em sua maioria, apenas os oficiais são transferidos para a reserva, sendo que as praças são reformadas, o que significa que não poderão mais retornar ao serviço ativo.
O militar inativo possui toda uma experiência adquirida no exercício da atividade profissional que deve ser aproveita em benefício da população, que vem sofrendo com os atos ilícitos praticados pelo cidadão infrator que há muito abandonou o respeito ao Estado de Direito e que desconhece qualquer campanha de desarmamento, preferindo o desenvolvimento de atividades que somente trazem prejuízo para a sociedade que acredita na regras previamente estabelecidas.
Para retornar ao serviço ativo, os interessados deverão preencher os seguintes requisitos: a) ser soldado, cabo ou 3º sargento da reserva remunerada e não ter sido transferido para a inatividade como bombeiro ou especialista; b) ter sido transferido para inatividade, estando apto para a atividade operacional; c) o interessado não pode estar exercendo qualquer outra atividade remunerada pública ou particular; d) estar na inatividade por um período inferior a oito anos; e) ter idade inferior a 60 anos, até 24 de dezembro de 2003.
A iniciativa da Política Militar do estado de Minas Gerais evidencia que existem soluções que poderão ser adotadas na busca da otimização dos recursos a serem empregados na segurança pública, tendo em vista as limitações que o Brasil possui, e que preocupam a população que não aceita mais a perda de vidas, vítimas da violência, que não faz qualquer diferença entre as classes sociais.
O militar, federal ou estadual, possui direitos e prerrogativas que lhe são assegurados pela Constituição Federal de 1988 e também, no caso do militar estadual, pelas constituições estaduais. O militar, após 30 anos de serviço público, em regra, é transferido para a reserva remunerada, mas isso não impede que este, enquanto não esteja na condição de reformado, possa ser revertido para o serviço ativo, desde que exista a necessidade e o interesse público.
Apenas a titulo de esclarecimento, o militar reformado é aquele que atingiu a idade de 60 anos e que não mais poderá ser revertido para o serviço ativo, mantendo-se desta forma na reserva remunerada com todos os direitos e prerrogativas decorrentes de seu posto ou graduação.
A reversão do militar para o serviço ativo não significa que este esteja ocupando um novo cargo, até porque o militar não poderá mais concorrer para promoções, seja por merecimento ou por antigüidade, sendo certo que o militar apenas faz jus aos direitos e prerrogativas decorrentes de seu posto ou graduação, fazendo jus ainda ao recebimento de um percentual por se encontrar no serviço ativo.
Neste sentido, a questão suscitada pela Procuradoria-Geral da República deve ser analisada em conformidade com o principio federativo da autonomia dos estados-membros e também com base nos direitos e prerrogativas que são assegurados aos militares estaduais e federais que, por força de disposições legais e constitucionais, podem, apesar de se encontrarem na inatividade, serem revertidos para o serviço ativo, conforme dispõe inclusive o Estatuto dos Militares Federais e o Estatuto dos Militares Estaduais nos diversos estados da Federação.
O legislador constituinte derivado estabeleceu uma Lei de Responsabilidade Fiscal para se evitar o aumento do funcionalismo público sem receitas, com a observância estrita de um determinado percentual da receita do ente federativo, que não pode e não deve ser ultrapassado sob pena de responsabilidade do ocupante do cargo publico, inclusive com a perda dos direitos políticos.
Assim, desde que não exista violação aos princípios enumerados no artigo 37 da Constituição Federal e demais disposições que regem os militares estaduais e federais, não há que se mencionar a inconstitucionalidade de uma lei que busca aproveitar o pessoal inativo das Policiais Militares em atividades voltadas para a melhoria dos serviços de segurança pública que são prestados a população, que também por força da Constituição Federal de 1988, tem direito à vida, à liberdade, à integridade física e patrimonial, à saúde e educação, e ainda a um salário mínimo que assegure a dignidade humana em atendimento ao texto constitucional, a Convenção Americana de Direitos Humanos e também aos direitos do homem estabelecidos pela Carta da Organização das Nações Unidas.
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O texto foi originariamente publicado na Revista Consultor Jurídico, 11 de abril de 2006.
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