Direito Militar – Aplicação do Tratado de Roma
1. Introdução
A Constituição Federal de 1988, que no decorrer dos anos vem sofrendo várias modificações em nome da governabilidade, assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, os direitos enumerados no art. 5 º, que são auto-aplicáveis e integram o que se denomina de cláusulas pétreas, ou seja, cláusulas de pedra, que não admitem emenda constitucional, caso contrário provavelmente já teriam sofrido modificações.
A esperança da nação é que a Constituição Federal de 1988 possa envelhecer seguindo os passos da Constituição América do século XVIII. Afinal, o país já teve seis constituições antes do vigente texto constitucional, 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967, devendo reunir esforços para que a atual constituição possa se tornar perene, servindo de referência e garantia as novas gerações que acreditam na existência do Estado democrático de Direito.
O § 2 º, do art. 5 º, da CF, assegura aos cidadãos em seu aspecto amplo não apenas os direitos enumerados no texto constitucional, mas também os decorrentes dos tratados internacionais que foram subscritos pela República Federativa do Brasil.
Seguindo a sua tradição, o governo brasileiro vem subscrevendo tratados internacionais importantes, como a Declaração Universal de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas – ONU, o Tratado de Combate ao Tráfico de Mulheres e as Crianças, o Tratado de Proteção ao Trabalho Infantil, a Convenção Americana de Direitos Humanos, denominada de Pacto de São José da Costa Rica, entre outros.
Na busca de uma maior integração do Brasil na comunidade internacional, a União seguindo os o exemplo de outros países ratificou o Tratado de Roma, que instituiu o Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia, na Holanda.
2. Aprovação do Tratado e o seu alcance
O Congresso Nacional com fundamento na Constituição Federal por meio de decreto legislativo, e o Poder Executivo por meio de decreto presidencial, aprovou o Tratado Internacional de Roma que passou a integrar o sistema jurídico nacional, ao lado das leis federais e complementares.
Por força do Tratado, as tropas brasileiras que praticarem crimes de guerra, genocídio, atos de agressão a civis, ou violação as convenções de guerra, Convenção de Genebra, ficarão sujeitos a julgamento com base nas disposições do Estatuto Internacional.
O Brasil já participou de diversas forças de paz em atendimento as resoluções da ONU, destacando-se as Forças de Paz que estiveram em Angola, Canal de Suez, e recentemente em Timor Leste, que garantiu a liberdade e a independência da ex-colônia Portuguesa que vivenciou os horrores da guerra, e o desrespeito flagrante aos direitos e garantias fundamentais do cidadão.
Se os militares brasileiros que integram as forças de paz violarem as normas estabelecidas no Tratado de Roma, Decreto n º 4.388, de 25 de setembro de 2002, serão levados a julgamento perante o Tribunal Penal Internacional. Deve-se observar, que não apenas os militares que integram as Forças Armadas mas também os civis ficam sujeitos serem levados a julgamento perante o Tribunal Internacional pela prática de crimes estabelecidos no Estatuto de Roma.
3. Garantias asseguradas no tratado de Roma
O Tratado de Roma assegura todas as garantias estabelecidas no direito penal, como o princípio da legalidade, as excludentes de ilicitude, a ampla defesa e o contraditório, a presunção de inocência, a presença do acusado nos julgamentos, a assistência de advogado, entre outros.
No direito internacional, as garantias processuais são semelhantes às adotadas pelos países que seguem o sistema da família romano-germânica ou civil law. O acusado tem os mesmos direitos que são assegurados aos acusados em seus respectivos países de origem pela prática de crimes comuns.
O direito internacional que tem como fundamento o combate aos atos ilícitos, sendo que em nenhum momento afasta a aplicação das garantias processuais, que são essenciais para a realização de um julgamento pautado pelo princípio de justiça, assegurando ao acusado os direitos e garantias previstos nas Constituições dos Estados modernos e democráticos, que tem como fundamento a liberdade e igualdade.
A instituição do Tribunal Internacional é um avanço no combate aos atos de ilicitude que possam ser praticados pelas forças militares, que devem preservar a lei e a ordem em qualquer lugar que estejam atuando, ou mesmo dos grupos paramilitares que venham cometer qualquer ato de arbitrariedade contra a população civil ou o Estado democrático de Direito.
4. Militares estaduais e o Tratado de Roma
Os integrantes das Forças Auxiliares, Polícia Militar e Corpos de Bombeiros Militares, podem participar de Forças de Paz, como já ocorreu diversas vezes em que o Brasil foi chamado pela ONU a enviar militares para manter a ordem e a paz nos países envolvidos em conflitos internos ou externos.
O militar estadual que integra uma força de paz fica sujeito as penalidades estabelecidas no Código Penal Militar, e deve ser julgado pela Justiça Militar Estadual e não pela Justiça Militar Federal, auditoria militar de Brasília.
Se o militar estadual pertencer a Polícia Militar do Estado de Minas Gerais deverá ser julgado por uma das três auditorias militares existentes naquele Estado, com sede na cidade de Belo Horizonte. O mesmo ocorrerá com um militar da Polícia Militar do Estado de São Paulo, que deverá ser julgado perante uma das quatro auditorias do Estado, com sede na cidade de São Paulo e assim nos demais Estados-membros da Federação.
O Código Penal Militar Brasileiro, Decreto-lei n º 1001 de 21 de outubro de 1969, estabeleceu o critério da extraterritorialidade, art. 7 º do CPM, o que significa que a norma penal militar se aplica fora do território brasileiro aos militares federais ou estaduais.
Para um militar estadual ser julgado pela Justiça Militar Federal é necessário que tenha sido incorporado às Forças Armadas, como pode ocorrer com o civil reservista ou mesmo o oficial da reserva formado nos Institutos de Formação de Oficiais da Reserva, CPOR, e que tenha sido chamada a defender a Pátria nos casos de guerra declarada pelo Presidente da República devidamente autorizado pelo Congresso Nacional, art. 84, inciso XIX, da Constituição Federal.
5. Conclusão
A guerra possui regras que há muito foram estabelecidas com o intuito de evitar que os civis fiquem sujeitos a atos de barbárie ou excesso. Os soldados envolvidos em batalhas devem respeitar os direitos humanos das populações civis que foram estabelecidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Convenção de Genebra.
A comunidade internacional, buscando estabelecer preceitos voltados a preservação dos direitos fundamentais, elaborou o Tratado Internacional de Roma que criou o Tribunal Penal Internacional (T.P.I) para julgar os criminosos que não respeitam a dignidade das pessoas, que eventualmente possam estar envolvidas em um conflito, que na realidade não deveriam existir.
O Brasil segundo a sua tradição, subscreveu o Tratado Internacional de Roma, demonstrando a preocupação do país em respeitar os direitos e garantias fundamentais dos nacionais e estrangeiros. No mesmo sentido, o governo brasileiro também subscreveu a Convenção Americana de Direitos Humanos.
Por força do tratado subscrito pelo Brasil, os militares que integram as Forças Armadas se praticarem um ato ilícito capitulado no Estatuto ficarão sujeitos as penalidades ali estabelecidas.
Os Estados Unidos da América, por questões de política interna, não subscreveram o Tratado de Roma, afastando a possibilidade de seus militares serem julgados pelo Tribunal Internacional. A Inglaterra, contrariando a posição americana ,subscreveu o tratado, demonstrando desta forma a sua preocupação com a preservação dos direitos e garantias fundamentais em qualquer lugar do mundo.
Pode-se afirmar que a instituição do Tribunal Penal Internacional que não foi subscrito por todos os países que integram a Organização das Nações Unidas (ONU) é uma tentativa de combater os excessos que são praticados por militares e civis contra as populações indefesas nas situações guerra, ou mesmo da manutenção de Estados Totalitários.
Não adianta a integração econômica como vem ocorrendo com a Europa (União Européia), América (Nafta) e a América do Sul (Mercosul) sem que exista uma integração efetiva entre as nações para a preservação dos direitos fundamentais, como à vida e à liberdade.
Os países que subscreveram o Tratado de Roma têm plena ciência que seus nacionais poderão ser levados às barras do Tribunal Penal Internacional, mas isso não impede a defesa da liberdade e uma efetiva integração entre as nações na busca de um mundo onde a liberdade possa ser respeitada e preservada.
Disponível na internet: www.ibccrim.org.br, 09.03.2004.