Forças policiais e ordem pública

1.1.Ordem pública e seu alcance

O cidadão possui direitos e garantias fundamentais que lhe são assegurados pela Constituição Federal, e que devem ser observados e respeitados. O exercício dos direitos individuais exige a estabilidade das instituições e o funcionamento dos serviços públicos, o que ocorre por meio da ordem pública, que deve ser preservada, permitindo o desenvolvimento da sociedade.

As forças policiais têm como missão a preservação da ordem pública, assegurando ao cidadão o exercício dos direitos e garantias fundamentais. Segundo Javier Barcelona Lopp, as forças de segurança têm a missão de prevenir, manter e restaurar a segurança e a ordem pública, protegendo o livre exercício dos direitos e liberdades e garantindo a segurança do cidadão.[1]

A manutenção da ordem pública é essencial para a existência da sociedade e realização de seus objetivos. O Estado deve organizar e manter forças que estejam voltadas para a preservação da ordem pública, que expressa uma situação de tranqüilidade material, de ausência de perturbações. É um estado oposto a desordem, um estado de paz em que está ausente a perturbação, e possui três elementos fundamentais, a segurança, a tranqüilidade e a salubridade.[2]

A atividade policial está voltada para a preservação da ordem pública, e se caracteriza pelo combate ao crime. Quando o Estado não consegue impedir a prática do ilícito, deve reprimi-lo, colhendo os elementos necessários para a propositura da ação penal. A ação dos agentes policiais deve estar voltada para a defesa dos direitos do cidadão, mas isso não impede o uso legítimo da força que deve se afastar da arbitrariedade e do abuso.

A ordem pública pode ser entendida como sendo uma situação de convivência pacífica e harmoniosa da população, fundada nos princípios éticos vigentes na sociedade, e refere-se à paz e à harmonia da convivência social, excluídos assim, a violência, o terror, a intimidação e os antagonismos deletérios, que deterioram àquela situação.[3]

O administrado encontra na ordem pública a situação necessária para o desenvolvimento de suas atividades, e a convivência com os demais integrantes da sociedade, tendo como limites a lei, que deve ser observada. Ao praticar atos que comprometem a ordem pública, o particular legitima o Estado a empregar a força para restabelecer a paz e a tranqüilidade.

A ordem pública pode ser entendida ainda, como sendo o estado de paz social que experimenta a população, decorrente do grau de garantia individual ou coletiva proporcionada pelo poder público que envolve, além das garantias de segurança, tranqüilidade e salubridade, as noções de ordem moral, estética, política e econômica, independentemente de manifestações visíveis de desordem.( Bol. Res. PM/RJ n º 68,15/04,82)

1.2. Segurança pública como aspecto de ordem pública

A preservação da integridade física e patrimonial do cidadão é atividade de segurança pública, que ao lado da tranqüilidade e da salubridade pública são aspectos de ordem pública. O Estado é o grande responsável pela segurança de todos, pois de todos deve e pode exigir o cumprimento dos deveres necessários à manutenção desta condição. Um dos mais difíceis problemas que os dirigentes de uma nação enfrentam é obter o exato equilíbrio entre as obrigações e as responsabilidades do Estado – voltado para o interesse coletivo e detentor do monopólio do uso legítimo da força – e as do cidadão, possuidor, de um lado, de direitos naturais inalienáveis e, de outro lado, subordinado ao ordenamento jurídico do estado de direito.[4]

No exercício de suas funções, as forças policiais encontram-se legitimadas para empregarem o uso da força, que deve se afastar do campo da arbitrariedade, do abuso, que macula a imagem dos agentes policiais, e traz como conseqüência a responsabilidade objetiva do Estado de indenizar os danos suportados pelo cidadão.

Os administrados devem confiar em suas forças policiais, que tem como missão a preservação da segurança pública e dos direitos e garantias fundamentais. Os agentes policiais devem estar preparados para exercerem suas funções respeitando os limites estabelecidos pela lei, afastando-se do uso indevido da força e da prática de atos ilegais.

A segurança pública é exercida para a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Abrange assim, as vertentes individual e comunitária da segurança, sendo voltada para o universo não antagônico. Sendo garantia passa assegurar a ordem pública, é campo de atuação do poder de polícia, expressão do monopólio da força que detém o Estado.[5]

A sociedade precisa da atuação das forças policiais que devem estar preparadas para exercerem suas funções, respeitando o cidadão e sua dignidade. A força deve ser utilizada pelo Estado quando necessária, sem que isso signifique o desrespeito à lei, ou a prática do abuso de poder.

1.3. Emprego das forças armadas na segurança pública

A segurança, interna e nacional, é dever do Estado que foi assumido em decorrência do contrato social celebrado com a sociedade, onde esta abandonou a auto-tutela, e a formação de exércitos particulares, permitindo a formação de um governo voltado para o fortalecimento da nação, e à preservação dos direitos e garantias fundamentais consagrados na Constituição Federal e nos instrumentos internacionais.

As forças policiais são responsáveis pela preservação da ordem pública, em seus aspectos segurança pública, tranqüilidade e salubridade pública. As forças armadas são responsáveis pela defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais, e por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem, art. 142, in fine, da Constituição Federal.

Por disposição do texto constitucional cada força de segurança possui seu campo de atuação delimitado, e estas possuem legitimidade para empregarem à força, coação administrativa, quando necessária para o cumprimento de suas atividades. O estabelecimento de atribuições não impede que as Forças Armadas venham a ser empregadas na função de segurança pública, quando as forças policiais não tenham restabelecido à ordem pública violada em decorrência de atos praticados por pessoas, ou grupos, que buscam desestabilizar o Estado de Direito.

A repressão militar é a ultima ratio do Estado contra as agressões à lei e à ordem que não tenham cedido às modalidades policiais de repressão. É o uso da força organizada de que dispõe o Estado, em caráter dissuasório ou eliminatório, sob a autoridade do Presidente da República, trata-se, portanto, de modalidade extrema de repressão política, caracterizada pelo emprego das Forças Armadas do País.[6]

O Presidente da República poderá ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa, ou solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio, arts. 136 e 137, da C.F. Com a decretação destas medidas, as Forças Armadas poderão ser chamadas para atuarem em atividades voltadas para a preservação da ordem pública. Nesse caso, as forças policiais ficarão submetidas ao comando das Forças Armadas, que serão as responsáveis pela preservação da ordem pública enquanto vigorarem as medidas impostas.

A União com fundamento no art. 34, incisos I a IV, da C. F, poderá a empregar as Forças Armadas para manter a integridade nacional; repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra; pôr termo a grave comprometimento da ordem pública; garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação.

O emprego das Forças Armadas na função de segurança pública é uma exceção, que somente ocorre nos casos previstos na Constituição Federal. A formação dos agentes policiais é voltada para as questões de ordem pública, enquanto que os militares federais são preparados para defenderem a soberania nacional, e atuarem em situações de guerra, invasão, forças de paz, que são atividades tipicamente militares.

Ao cessar a situação que levou ao emprego dos militares federais, estes retornarão aos quartéis para que os agentes policiais voltem ao exercício de suas funções, que se destinam a preservação da ordem pública e dos direitos e garantias fundamentais dos administrados.

Os militares que integram as Forças Armadas não devem ser empregados nas atividades de segurança pública. Essa função deve ser exercida pelas forças policiais, e seus agentes devem ser preparados para usarem a força somente quando necessária, respeitando o administrado, os direitos que lhe são garantidos pela Constituição Federal. O emprego desnecessário da força traz como conseqüência a obrigação do Estado em indenizar o particular.

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NOTAS

[1] LOPP, Javier Barcelona, op. cit., p. 194-195.

[2] LOPP, Javier Barcelona, op. cit., p. 196.

[3] LAZZARINI, Álvaro et ali., op. cit., p. 82.

[4] Fundamentos Doutrinários da Escola Superior de Guerra, 1998. p. 155.

[5] Fundamentos Doutrinários da Escola Superior de Guerra, 1998. p. 157.

[6] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo, op. cit., p. 319.

Disponível na internet: www.ibccrim.org.br, 26.03.2004.