O emprego das Forças Armadas nas questões de ordem pública e o Estado Democrático de Direito

A sociedade brasileira vem enfrentando sérias dificuldades em razão do aumento da violência e dos impostos, que a cada dia comprometem ainda mais a renda do trabalhador brasileiro. Em tempos de crise, a insegurança é uma realidade representada pelo crescimento do número de crimes contra à pessoa, o patrimônio, entre outros. Por força destes fatos, alguns setores defendem a utilização das Forças Armadas nas atividades de segurança pública.

O caos vivenciado pela vizinha Colômbia, que possui um dos mais elevados índices de homicídios, é um indicador de que a sociedade deve estar atenta para o aumento da criminalidade e o combate a corrupção, que aumentam o custo de vida e muitas vezes afastam os investimentos internacionais em um mercado extremamente competitivo. A corrupção também deve ser considerada como sendo um crime hediondo sem direito aos benefícios de progressão de regime e liberdade provisória com ou sem fiança.

A Constituição Federal, que deve ser a lei fundamental do Estado de Direito e estar sujeita a modificações limitadas, diferentemente das mais de cinqüenta Emendas do texto constitucional, traz a competência de cada órgão responsável pela segurança, nacional ou pública. A divisão de atribuições existe como forma de se evitar eventuais conflitos, que em nada contribuem para a manutenção da ordem e dos direitos fundamentais do cidadão.

A atividade policial no Brasil está sendo repensada e vem sofrendo várias críticas em decorrência do aumento da violência. As forças policiais atuam no combate aos efeitos da violência, sendo que as causas primárias ainda vêm sendo combatidas com timidez, apresentando resultados modestos. Afinal, em razão do aumento da corrupção, faltam recursos para uma política de saúde, controle de natalidade, melhoria da educação, e investimento na geração de novos empregos, sem os quais o país não alcançará uma melhoria nos índices avaliados pela Organização das Nações Unidas.

O enfraquecimento da lei, que é o instrumento escolhido pela sociedade para a convivência dos diversos grupos sociais em paz e harmonia, leva ao suicídio do Estado e o fortalecimento dos poderes paralelos representados na maioria das vezes pelos cidadãos infratores, os quais não respeitam a ordem e as instituições previamente estabelecidas.

Os atos praticados contra o Exército Brasileiro são o exemplo da crença na impunidade, onde os grupos que se encontram na ilegalidade acreditam que os atos ilícitos praticados contra a estrutura do Estado não receberiam nenhuma resposta por parte das forças regulares e constitucionais, que são os responsáveis pela preservação da ordem pública. Neste sentido, ao contrário do pretendido por alguns criticas, o Exército tem o direito legitimo de responder pelos atos que foram praticados contra o povo e as Instituições democráticas.

A segurança de um Estado não pode ser objeto de discussão apenas em momentos de eleição ou em caso de crises que tenham repercussão junto a sociedade. É preciso que temas técnicos sejam discutidos por profissionais especializados no assunto, para se evitar que as reformas sejam feitas apenas por decretos.

As forças policiais no Brasil encontram-se fragmentadas, existindo inclusive conflito de atribuições no dia-a-dia do exercício das atividades profissionais. A falta de integração das polícias é uma realidade que preocupa o cidadão que busca a proteção do Estado. Alguns integrantes das forças policiais não aceitam a unificação, e esta também em razão da tradição histórica não é o melhor caminho para se reestruturar o sistema de segurança pública.

A Polícia Militar e a Polícia Civil nos Estados devem continuar existindo, sem que isso configure qualquer óbice a melhoria do sistema de segurança pública. O que é necessário é a criação de uma lei federal regulamentando a competência de cada um destes órgãos policias, e que permita uma efetiva integração dos órgãos policiais na busca de um serviço de segurança que seja de qualidade, juntamente com um sistema prisional efetivo, para o cumprimento das penas fixadas pela Justiça, afastando de vez senso de impunidade.

A ausência de uma maior participação das forças policiais nas questões relacionadas com a segurança pública, principalmente naquelas envolvendo o trafico de entorpecentes e de armas, ao lado da ausência de investimentos efetivos por parte dos órgãos governamentais, faz com que a população nos diversos Estados-membros da Federação busque em outros órgãos o apoio necessário para o cumprimento dos direitos previstos no art. 5º da Constituição Federal, como o direito à vida, à liberdade, à propriedade, à segurança, entre outros.

Acredita-se que as Forças Armadas poderiam estar desenvolvendo atividades de segurança pública, as quais segundo o texto constitucional, art. 144, é função privativa das forças policiais, polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícia civil, polícia militar e corpos de bombeiros militares.

Os militares federais que integram as Forças Armadas possuem suas atribuições previamente previstas no art. 142 da Constituição Federal, e são responsáveis pela manutenção da segurança nacional, soberania nacional, defesa da Pátria e garantia dos poderes constitucionais, o que é bem diverso das atribuições reservadas as forças policiais.

A ação que esta sendo levada a efeito pelas Forças Armadas não pode e não deve ser confundida com a sua destinação constitucional. A resposta levada a efeito pelo Exército Brasileiro foi necessária para se demonstrar que as forças regulares não podem e não devem tolerar atos praticados contra as suas Unidades ou mesmo contra os seus integrantes, o que poderia inclusive levar a uma desestabilização do Estado, cuja existência é essencial para a realização dos objetivos pretendidos pela sociedade. Mas, a ação legitima do Exercito não deve ser confundida como o seu emprego nas questões de segurança pública.

O administrado que cumpre com suas obrigações, pagamento de impostos, recolhimento de contribuições, e que vive sob o império da lei e da ordem, não aceita que seus direitos fundamentais sejam violados, e busca Instituições que possam lhe assegurar o que esta previsto no texto constitucional.

A segurança pública não é uma função constitucional das Forças Armadas e por mais que a sociedade brasileira queria o emprego dos militares federais em atividades policiais este não poderá ocorrer. Caso isso fosse possível estaria ocorrendo uma afronta ao texto constitucional, que fere expressamente o Estado democrático de Direito.

Os militares que integram as Forças Armadas recebem em suas escolas de formação um aprendizado diverso daquele que é ministrados nas escolas policiais, civis ou militares, onde os seus integrantes são preparados para atividades urbanas e de proteção ao cidadão. Os objetivos dos agentes policiais estão voltados para a manutenção da lei e da ordem, enquanto que os objetivos do militares federais estão voltados para a defesa da Pátria, com as atividades em terra, mar ou ar, e quando necessário até mesmo o enfrentamento do inimigo em situações de guerra.

Eventualmente os militares federais poderão ser empregados na segurança pública, mas somente em casos excepcionais quando as forças policiais não restabelecerem a ordem e a paz social violada. A função do policial, civil ou militar, é zelar pela paz e tranqüilidade pública, e quando este objetivo não é alcançado passa a existir um estado de insegurança e inquietação. Somente nestes momentos, é que as Forças Armadas poderão ser empregadas de forma transitória para o restabelecimento da ordem.

A ação que esta sendo desenvolvida pelo Exército Brasileiro no Rio de Janeiro não deve ser confundida como o seu emprego nas questões de segurança pública. Em razão da agressão sofrida surgiu para aquela Força terrestre a necessidade de recuperar o armamento que lhe foi roubado. A ação do Exército é legitima, mas não pode ser utilizada como precedente para o emprego das Forças Armadas nas questões de segurança pública, a não ser que seja decretado Estado de Sítio ou de Defesa, ou que ocorra uma solicitação do Governador do Estado ou dos Poderes Constituídos e uma expressa autorização do Presidente da República, Comandante Supremo das Forças Armadas.

O art. 142, in fine da Constituição Federal estabelece que, “as Forças Armadas destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais, e por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.Existe, portanto, expressa previsão constitucional para que as Forças Armadas eventualmente sejam empregadas na segurança pública, mas somente em casos excepcionais.

As forças de segurança no Brasil vêm prestando apesar das limitações materiais que muitas vezes sofrem um serviço de qualidade na busca da preservação dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. Não se pode esquecer ainda que as forças policiais combatem os efeitos e não as causas da violência. Enquanto não ocorrer uma melhoria no sistema de educação, saúde, assistência social, controle de natalidade entre outros, a violência continuará aumentando e a população sentirá os seus efeitos.

A sociedade juntamente com o Estado deve buscar a melhoria do sistema político e social, com investimentos na área de segurança pública, na geração de empregos, na distribuição de renda, na melhoria dos serviços públicos essenciais, evitando deste forma que os cidadãos infratores aumentem suas influências junto aos mais necessitados, que nem mesmo conhecem a noção e o significado da palavra Estado.

Disponível na internet www.ibccrim.org.br 29.05.2006.