A UNIÃO HOMOAFETIVA E SEUS ASPECTOS HISTÓRICO, RELIGIOSOS, MORAL, SOCIAL E CONSTITUCIONAL.
INTRODUÇÃO
A Cidadania e a Democracia são imprescindíveis para a legitimidade de um governo, seu controle social e para que uma sociedade seja de fato igualitária, livre e coesa, especialmente, quando estas estão voltadas para fatos sociais que ensejam polêmicas e para os quais vê-se a ausência de tais pilares sociais, como se apresenta a união homoafetiva, uma das maiores e mais calorosas discussões da atualidade no Brasil, confrontando-se com preceitos, preconceitos e ausência de leis que os ampare. Constituindo importante tema tanto para o estudo da Sociologia, quanto para o estudo do Direito.
Embora para muitos ainda seja um tabu o tema união homoafetiva, a discussão do assunto há tempos adormecida, tomou fôlego e agora transcende as fronteiras do julgo moral, alcançando diversos ambientes, do acadêmico a mídia, nos segmentos religiosos e, já adentrando o Congresso Nacional.
O intento do proposto trabalho é apresentar o tema de maneira clara. O primeiro consta da pesquisa teórica com apresentação das conceituações pertinentes ao assunto. Em seguida foram apresentados diversos aspectos, delineando sucintamente sua historicidade, desde os tempos remotos até a atualidade. Enfatizando o tema a luz da moral e da religião. E, finalmente, o tratamento sociológico e jurídico dispensado a união homoafetiva, onde são apresentados grandes nomes do direito, como Hans Kelsen, Miguel Reale, Paulo Nader, Débora V. Brandão, Rodrigo da Cunha Pereira, que tiveram suas concepções como base para o desenvolvimento da pesquisa, além do entendimento de estudiosos, como a Desembargadora Maria Berenice Dias. Também, na Sociologia, nomes como Émile Durkheim, Max Weber in Cristina Costa, Paulo Bonavides, Celso A. de Castro, Ana Lúcia Sabadell, foram as bases teóricas para a construção da temática abordada. Enfocou-se a pesquisa documentária nos art. 3º e 5º da Constituição Federal, o art. 1.723 do Código Civil, o Projeto de Lei 1.151/95 da Deputada Marta Suplicy e o 66/2000 do Deputado Renato Simões. Questionou-se, também, o direito da família e a extensão deste direito as uniões entre pessoas do mesmo sexo, relatando casos concretos de reconhecimento por jurisprudências e pareceres favoráveis ao assunto. Defendidas por juristas e profissionais do direito brasileiro.
O objetivo é a reflexão, especialmente, do profissional do direito, a respeito do que se apresentou no passado relacionado as uniões entre pessoas do mesmo sexo, do que se apresenta no Brasil, do que se conquistou até o momento. E qual a probabilidade de um futuro em que a união homoafetiva, seja reconhecida legal e legitimamente. Pois o direito não poderá se omitir ao enfrentamento desta ou de outras questões inerentes na sociedade moderna, ainda que estas ensejem polêmicas e dificuldades.
CIDADANIA E DEMOCRACIA: UNIÃO HOMOAFETIVA E SEUS ASPECTOS SOCIAIS E JURÍDICOS
A união homoafetiva enseja um dos maiores debates atual, confrontando-se com preconceitos, tabus, preceitos morais, religiosos e constitucionais. Inicialmente, cabe referir alguns conceitos relacionados ao tema ora abordado.
Conceitos:
Cidadania: em Costa e Duarte (2004, p. 21), é a participação ativa na luta pelo cumprimento de direitos já reconhecidos, na luta pelo reconhecimento, pelos direitos que se tornem historicamente necessários como também por seu reconhecimento e por sua implementação tendo em vista a promoção do bem comum.
Democracia: Paulo Bonavides, na obra Ciência Política, cita Kelsen, que considera ser a democracia, sobretudo um caminho: o da progressão para a liberdade.
Família: Segundo o jurista brasileiro Clovis Bebiláqua, é um conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da consangüínea, cuja eficácia se estende ora mais larga, ora mais restritamente, segundo várias legislações. Outras vezes, porém, designa-se, por família, somente os cônjuges e a respectiva progênie.
Homossexual: Pessoa que se relaciona sexualmente quer de fato quer de forma fantasiosa, imaginária, com parceiros pertencentes ao mesmo sexo que o seu, mantendo-se, todavia, satisfeita com o seu biológico.
Justiça: É a constante e firme vontade de dar a cada um o que é seu (ULPIANO apud PAULO NADER, 1999, p. 118).
Fato Social: É todo fato que em seu contexto é exterior a vontade humana, é comum a toda sociedade e exerce coercitividade sobre os indivíduos (DURKHEIM apud CRISTINA COSTA, 2005, p.83).
A UNIÃO HOMOAFETIVA E SEUS ASPECTOS HISTÓRICO, RELIGIOSOS, MORAL, SOCIAL E CONSTITUCIONAL.
ASPECTOS HISTÓRICO E MORAL
O termo homossexual origina-se do prefixo grego homos que significa “o mesmo/ semelhante”. “Sexual” vem do latim sexo e significa ‘’relativo ou pertencente ao sexo’’.
A homossexualidade esteve presente nos primórdios da própria história, citada nos livros da antiguidade grego-romana e na própria Bíblia. Na sociedade grega, tais relações eram tão presentes que chegavam a ser consideradas mais nobres do que os relacionamentos heterossexuais.
A luz da moralidade, a união homoafetiva precede e prenuncia a decadência moral, tal qual a política e a social, por figurar desrespeito e anomia diante da moral. Posto a sociedade de ter valores culturais dominantes e um sistema de exclusões muitas vezes baseado em preconceitos estigmatizantes, fruto da cultura e de valores históricos.
Com a revolução dos costumes e da mudança dos valores, dos conceitos de moral e pudor, o tema homossexualidade e união entre pessoas do mesmo sexo, deixaram de ser “assunto proibido’’ sendo enfrentado no cinema, novelas, na mídia como um todo e na própria política. Entretanto, nas culturas ocidentais contemporâneas, são marcados pela marginalidade, aqueles que não têm preferências sexuais dentro de determinados padrões de estreita moralidade.
ASPECTO RELIGIOSO
Sem dúvida, na religião é que encontramos o caráter mais polêmico e maior preconceito, em face da religião ter como base os princípios sagrados, segundo os quais a relação sexual tem como natureza, a procriação. Pondera-se no meio religioso, que se Deus quisesse e achasse conveniente a existência de seres de um só sexo, assim o teria feito. O livro de Gêneses, em seu capitulo 2, versículo 27, assim o fala: “Criou Deus, pois o homem a sua imagem e semelhança, a imagem de Deus o criou: homem e mulher os criou’’.
Também a Bíblia é explicita, clara e direta sobre a matéria, nos textos abaixo referidos no livro de Levítico 18: 22. “Com homem não te deitarás, como se fosse mulher: é abominação.”
As principais religiões consideram uma aberração, uma transgressão a ordem natural, uma perversão. Contudo, se suas bases para não aceitação é repúdio as uniões homoafetivas é a concepção da procriação, pondera-se então, que pessoas estéreis, mulheres casadas na menopausa também tenham suas uniões vedadas e repudiadas pela igreja, visto a estas a não possibilidade de procriação.
ASPECTOS SOCIAIS E CONSTITUCIONAIS
A palavra homossexual foi utilizada pela primeira vez, em 1869, pelo médico húngaro Karoly Benkert. E para a psicologia, a homossexualidade é considerada como um distúrbio de identidade, não hereditário nem de opção consciente ou deliberada.
Para o psicólogo Roberto Graná, o homossexualismo é fruto de um pré-determinismo psíquico primitivo, originado nas relações parentais das crianças, desde a sua concepção até os 3 ou 4 anos de idade, quando o núcleo da identidade sexual na personalidade do individuo, que determinará sua orientação sexual, se constitui.
Isso posto, trata-se de um fato que não enseja qualquer reprovabilidade social ou jurídica, pois é algo involuntário. Uma vez que é involuntário e que a própria medicina reconhece tal circunstância, na última revisão, do ano de 1995, o código internacional das doenças- CID deixou de constar o termo homossexualismo, cujo sufixo “ismo” significa doença, adotando o termo homossexualidade, cujo sufixo “dade”, significa modo de ser. Portanto, não sendo possível ao indivíduo a escolha da sexualidade, figura a reprovabilidade quer social, moral, religiosa ou jurídica, um ato discriminatório.
A união homoafetiva é um fato social e jurídico, gerador de efeitos jurídicos, por configurar uma sociedade civil, ou mesmo, uma comunhão de vidas e interesses. Esteve presente em todas as sociedades desde os povos mais remotos. Constitui importante tema para o estudo sociológico e do direito, por representar um fato relevante nas sociedades, especialmente, na sociedade brasileira, que entende a homossexualidade como uma transgressão a moral, aos costumes e a união homoafetiva, como uma degradação da família tradicional.
Durkheim demonstrou que os fatos sociais têm existência própria e independem daquilo que pensa e faz cada indivíduo em particular (DURKHEIM apud CELSO CASTRO, 2003, p.64) e, considera um fato social como normal, quando se encontra generalizado pela sociedade ou quando este desempenha alguma função importante para sua adaptação ou sua evolução. Afirmou que a sociedade é o meio onde o direito surge e se desenvolve, pois a idéia do direito liga-se a idéia de conduta, organização e de mudança. Partindo desta concepção, a união entre pessoas do mesmo sexo figura como um fato normal, à medida que se apresenta na sociedade buscando adaptação social e jurídica.
O comportamento homossexual, especialmente sua união, embora não tenham nenhum tipo de lei que os aprove ou lhes punam, sofrem por parte de determinados grupos a reação negativa de reprovação, por se comportarem de forma discordante em relação aos valores e princípios da moralidade. Apresentando uma consciência coletiva, segundo a concepção durkheimiana. Contrapondo-se, Weber vem afirmar que cada indivíduo age segundo motivações resultantes da influência da tradição, dos interesses racionais e da emotividade (WEBER apud CRISTINA COSTA, 2005, p. 98). Observou que há direitos subjetivos criado por regulamentos públicos, onde o indivíduo tem a possibilidade de recorrer a dispositivos constitucionais para garantir seus interesses.
Nesse contexto, a sociologia jurídica tem como objeto de estudo a realidade do direito, impondo ao pesquisador a necessidade de acompanhar as transformações que sofre o sistema jurídico e a sociedade.
O direito, especialmente o de Família, tem sofrido grandes transformações nos últimos tempos. Tais mudanças, entretanto, não contemplaram a união entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil a lei não toma conhecimento da união homoafetiva, não lhe dá aprovações nem punições, admitindo casamento somente entre pessoas de sexos opostos, ou seja, heterossexuais. Entretanto, alguns sistemas jurídicos vêem a necessidade de adequar suas leis para acomodar tais situações, como já acontece, por exemplo, nos EUA, no Estado de Nova Iorque.
No processo histórico dos direitos, o direito social foi o último dos direitos a ser conquistado. Direitos sociais compreendem garantias sociais, econômicas, culturais, morais e de lazer . E para que sejam assegurados é necessária a presença da justiça em todas as suas dimensões; de modo particular, a justiça social.
A Constituição Brasileira de 88 estabelece no art. 5º que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade”.
Em síntese, todos têm direitos e também deveres para com o semelhante garantindo a integridade, a autonomia, a liberdade e a dignidade como pessoa humana. Todavia, não elimina conflitos no conjunto da sociedade, especialmente ao se tratar de homossexualidade e união estável entre pessoas do mesmo sexo. E neste momento, em que a palavra de ordem é o direito a cidadania e a inclusão dos excluídos, questiona-se a ausência de leis que regulamentem a união homoafetiva.
Alguns estudiosos entendem a questão da união homoafetiva segundo a visão kelseniana. Se não há lei prevista, nem norma que juridicamente a ampare, logo não há possibilidade de reconhecimento expresso as uniões estáveis homossexuais como entidade familiar. Entretanto, a teoria tridimensional do direito de Miguel Reale assume relevante papel, porque explicita perfeitamente que a norma é a conjugação de fatos e valores. Considerando que é o valor que justifica a regulamentação de um fato relevante da análise da finalidade normativa. Assim quando se analisa a questão união estável e do casamento civil sobre a ótica da possível extensão destes direitos aos casais homoafetivos, considera-se o valor deste fato dentro da sociedade. “Fato, valor e norma estão sempre presentes e correlacionados em qualquer expressão da vida jurídica, seja ela estudada pelo filósofo ou sociólogo do direito ou pelo jurista” (Miguel Reale, 1994, p. 57).
Outros profissionais do direito encontram dificuldade para assuntos da sexualidade, visto a grande polêmica, muitas vezes advindas da dificuldade com apropria sexualidade.
A questão da união homoafetiva é muito mais profunda e complexa e a sua discriminação não pode ser resolvida com a simples valorização das identidades sexuais, tão pouco com a mudança da visão social frente ao assunto.
Jurandir Freire, ao ponderar sobre o assunto, é sábio ao dizer que nenhum preconceito poderá ser renunciado racionalmente apenas por mostrar a estupidez de suas crenças, sobretudo se os fundamentos desta crença permanecerem sendo levado a sério.
A arma contra o preconceito é a ironia, o sarcasmo, a crítica, o descrédito, a surpresa e o desprezo por tudo aquilo que lhe dá suporte, junto com a proposta de pensar em experimentos morais alternativos para nossas relações afetivas, amorosas, sentimentais, amigáveis, etc, onde o sexo seja coadjuvante e não ator principal.
Interessa aos profissionais do Direito refletir melhor o real significado de igualdade e liberdade dos indivíduos acima dos conceitos estigmatizados e moralizantes que servem de instrumento de exclusão da cidadania. Cidadania que está associada ao Estado, como instituição que define direitos e deveres, atribuindo sanções formais. No Brasil a democracia é representativa de modo prevalente. Entretanto, nos confrontamos, em diversas situações com uma democracia e cidadania abstrata, a medida que o Estado deixa de ser legítimo, por não propiciar a legitimação e legalização de fatos concretos, qual a união estável homoafetiva, marginalizada por determinados valores que tão-somente figuram como retrocesso social, numa sociedade dita “moderna”.
Inúmeros são os movimentos sociais de apoio a legalização da união estável entre pessoas do mesmo sexo, também já tramitam no congresso projetos de lei, como o Projeto de Lei 1.151/95 da Deputada Marta Suplicy, que busca a proibição da discriminação por motivo de orientação sexual. O Projeto de Lei 66/2000, do Deputado Renato Simões, que entrou em vigor em São Paulo, no ano de 2001 e que também dispõe sobre a prática de discriminação por motivo de orientação sexual e dá outras providências. Também o substitutivo adotado pela Comissão Projeto Lei 1.151/95 que disciplina a parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo. A própria Advocacia geral da União - AGU se pronunciou avaliando o tratamento preconceituoso e discriminatório do meio social e do próprio poder público ao impedir o bem-estar dos homossexuais . Também a procuradoria Geral da República - PGR entende como violação de princípios constitucionais o não reconhecimento da união estável formada entre pessoas do mesmo sexo . Há ainda grande preconceito, morosidade e descaso tanto social quanto político. Assim, todos os que se encontram nessa situação estão absolutamente a margem da lei e desprotegidos.
É bom ressaltar, que embora não exista na constituição nenhuma lei de amparo a união homoafetiva. Existem princípios constitucionais que são basilar e essencialmente, muito mais indeterminados e elásticos do que as demais normas, produzindo ao amparo de um sistema normativo que abrange diversas possibilidades e contemplando estes cidadãos.
O art. 1.723 do Código Civil/02 afirma que união estável é toda união pautada por uma “convivência Pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família”. O termo constituir família não significa “ter filhos”, “pretender filhos” ou mesmo “poder ter filhos”, pois se assim fosse entendido, casais heteroafetivos estéreis não teriam sua união estável reconhecida, ficando também marginalizados. O real significado de constituição familiar é, justamente, a manutenção de uma união pública, contínua e duradoura, em comunhão plena de vida, com todas as consequências que esta plenitude acarreta, conforme art. 1.566, incs. I a III e V do Código Civil que estabelece a união estável: fidelidade recíproca, mútua assistência, vida em comum, respeito e considerações mútuas. E de fato, a união homoafetiva apresenta esse caráter, embora acredite-se carecer de uma emenda constitucional para estender os mesmos direitos já conferidos as famílias e entidades familiares.
O tema homossexualidade e união homoafetiva são questões de direito, visto a constituição brasileira dispor no seu art. 5°, inciso I, o princípio da igualdade e no art. 3°, inciso IV, dispor sobre a dignidade da pessoa humana. Assim, tem o homossexual enquanto cidadão, seu direito garantido pela lei. E ainda que a sociedade seja dita “moderna”, onde figura um Estado democrático de direitos fundamentais e deveres, o homossexual é visto pela concepção do “sem vergonha”, que age abominavelmente ao se envolver com outro igual. Tais posturas são fruto da cultura de valores de cultura tradicionais, o que não justifica as inúmeras formas de discriminação e de abusos cometidos.
Deverá ser considerada fundamentalmente, a dignidade da pessoa humana e a necessidade de regulamentação das uniões estáveis homossexuais, conforme defendem diversos juristas e políticos.
Também vale de lembrar-se que a Convenção Internacional dos Direitos Civis e Políticos, a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Pacto de San Jose, dos quais o Brasil é signatário, servem de fundamento para a ONU, que tem entendido como ilegítima qualquer interferência na vida privada de homossexuais adultos, seja como base no princípio do respeito a dignidade humana, seja pelo princípio da igualdade. Assim sendo, a não discriminação e a igualdade são correlacionadas e constituem um princípio geral para assegurar o respeito e a proteção aos direitos humanos.
Contrário a discussão da união homoafetiva, Miguel Reale afirmou:
A união entre pessoas do mesmo sexo só pode ser discutida depois de alterada a constituição, visto a união estável ser entre homem e mulher. E se há o desejo de entender esse direito aos homossexuais, que primeiramente se mudem a constituição com 3/5 dos votos do Congresso. Depois o Código Civil poderá cuidar da matéria.
Ainda que exista uma efetividade discriminação jurídica cometida contra homossexuais ao não se reconhecer o casamento civil e a união estável destes, em alguns casos, vindo do próprio Superior Tribunal de Justiça, que nega este caráter de união estável. Inúmeras jurisprudências já apontam para a concretização das uniões homoafetivas, como o caso concreto de Luis Alberto dos Santos e Unibanco AIG Seguros e Previdência, respectivamente autor e réu, ajuizado na 3ª Vara Civil do Rio de Janeiro, em 28 de agosto de 2005, em que o autor pleiteia a inclusão de seu companheiro como dependente no seu plano de saúde . Julgado pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Maria Cristina Barros Gutiérrez Slaibi, que considerando jurisprudências outrora julgadas favoráveis ao reconhecimento da união homoafetiva. Julgou procedente o pedido, na forma do art. 269, I do CPC, para declarar a inclusão do companheiro do autor como seu dependente, para todos os efeitos jurídicos, no plano de seguro da ré. Condenando-a ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais na forma do art.20,§ 4° do CPC, fixo em R$ 1.200,00 (Mil e duzentos Reais).
Tais jurisprudências usadas como base pela Juíza Maria Cristina Barros, como a Ação Civil Pública, ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do INSS, que em 27 de outubro de 2004, incluiu no Regulamento da Previdência Social-RPS, no seu artigo 30 que a partir daquela data, o companheiro ou a companheira homossexual de segurado inscrito no RGPS passa a integrar o rol dos dependentes e, desde que comprovada a vida em comum e a dependência econômica, concorrem para fins de pensão por morte e de auxílio-reclusão, com os dependentes preferenciais de que trata o inciso I do art. 16 da Lei n° 8213, de 1991, para óbitos ocorridos a partir de 5 de abril de 1991, ou seja, mesmo tendo ocorrido anteriormente a data da decisão judicial proferida na Ação Civil Pública n° 2000.71.00009347-0.
Ainda da decisão do Tribunal Superior Eleitoral, que por unanimidade, aplicou a união estável homossexual a inelegibilidade consagrada no art. 14, §7°, da Constituição Federal. Em que se proíbe aos cônjuges de Presidente da República, Governadores e Prefeitos concorrerem nas eleições ao mesmo cargo. Necessário, o afastamento do titular até seis meses antes do pleito. Foram elucidadas pela Desembargadora Maria Berenice Dias, do Rio Grande do Sul, Tribunal de Justiça.
As uniões homoafetivas são realidade para qual não se pode fechar os olhos. São cidadãos do mesmo sexo que convivem em regime de união estável, amparados ou não pela legislação, embora em diversos países do mundo já tenham alterado seu sistema de direito positivo para incluir a possibilidade de união estável entre pessoas do mesmo sexo.
Assegurar direitos a união entre pessoas do mesmo sexo, não fere em nenhum momento o princípio da união estável entre homens e mulheres. Deverá ser considerada a dignidade humana, o direito de se viver em um país democrático com igualdade de direitos. Considera-se também a justiça, para alcançar o bem comum, tanto enfatizado no direito.
Segundo a Desembargadora Maria Berenice Dias:
Cabe ao juiz pensar e repensar a relação entre o justo e o legal. Não pode buscar subsídios nas regras de direito posto, que não prevêem as situações novas. Precisa ter coragem de ousar na hora de decidir. Sob o fundamento de inexistir previsão legal, não pode o magistrado se omitir e simplesmente negar direitos. Tal revela-se como mera tentativa de punir quem ousa viver de forma diversa do modelo convencional. É a forma mais perversa de exclusão, pois configura condenação à invisibilidade, alijamento do âmbito de tutela jurídica.
A homossexualidade não é uma escolha, assim como não é opcional nascer negro, pobre, índio, deficiente. Não é possível, nem concebível fechar os olhos para uma realidade, para este fato explícito na sociedade e querer a qualquer custo mudá-lo, suprimi-lo, como se este fosse um caderno em que se escreve e quando não satisfeito com as palavras, apaga-se e reescrevem-se outras palavras.
A união homoafetiva é de fato e deverá ser de direito, entendida e respeitada na sociedade, quer pelos cidadãos, quer pelo poder publico, quer pelo sistema jurídico. Caso contrário figurará como um retrocesso social, político, jurídico, e prenúncio da decadência efetiva da democracia e da cidadania, na tentativa de ocultar a essência do ser humano, do homossexual visto como diferente, constituindo uma grande injustiça moral e social. Indo de encontro ao que se propõem os princípios constitucionais da igualdade, da liberdade, da dignidade da pessoa humana.
CONCLUSÃO
A questão da homoafetividade estudada segundo o Direito e a Sociologia, mostrou-se buscando incansavelmente a garantia de direitos, quer seja de igualdade entre os sexos, da liberdade, da intimidade, da pluralidade familiar, do desenvolvimento da personalidade e, de maneira central, da dignidade da pessoa humana. Onde esses direitos postos na Constituição sejam considerados legais e suficientes para a concessão de efeitos jurídicos favoráveis as parcerias entre pessoas do mesmo sexo, para que estes cidadãos possam conviver familiarmente segundo o modelo que melhor retrate seus anseios individuais.
Percebe-se, contudo, que o Direito Civil, em épocas passadas, manteve-se distante das realidades sociais de seu tempo, aprisionado em um formalismo tipicista e excluidor. Hoje, no entanto, as relações sociais são vistas com outro olhar, onde se busca, a partir de princípios constitucionais, soluções para questões presentes na sociedade e ainda não previstas na Constituição Federal. Buscando-se um novo Direito de família sem exclusões, com atenção voltada aos Direitos Fundamentais e Direitos Humanos, para tutelar estes cidadãos que expressando sua forma de amar, outrora julgada diferente, lutam por direitos, pela justiça e pelo bem comum.
Sem dúvida, o trabalho interdisciplinar nos serviu como fonte enriquecedora de conhecimentos, enquanto cidadãos e profissionais do futuro Direito da Amazônia e do Brasil. Ao considerar todas as fontes de pesquisa, quer seja dos casos concretos, as teorias, pareceres e todo o estudo que o envolveu.
A justiça e o bem comum, incansavelmente buscados pelo Direito. As relações sociais, seu desenvolvimento, sua importância para a Sociologia, se fizeram presentes neste trabalho. Entretanto, o maior conhecimento adquirido foi, especialmente, o conhecimento de que só haverá justiça de fato, quando efetivamente for reconhecido que a sociedade é formada de uma diversidade, que deverá ser respeitada a partir da individualidade de cada agente social, respeitando o princípio basilar da igualdade perante as leis, da dignidade da pessoa humana, para que se concretize a real democracia e cidadania, hoje ausente para aqueles que realmente delas necessitam.
Garantir aqueles que têm convívio duradouro com seus parceiros, direitos como: união legal, herança, pensão, patrimônio, identidade, e porque não, adoção é ver de fato, a justiça sendo concretizada e a plenitude da democracia e da cidadania estabelecidas, respeitando a identidade de cada indivíduo.
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Texto Acadêmico em parceria com os Acadêmicos em Direito: Ana Luiza Farias Costa, Ana Maria Teles da Silva Rente, Anne Veloso Monteiro, Antonio Ramon Rodrigues Figueirêdo, Denize Maria Henriques Menezes Queiroz e Evandro Augusto Azevedo da Rocha