4- Linguística – continuação – Os valores das Palavras. DENOTAÇÃO e CONOTAÇÃO; os DIMINUTIVOS

Proponho que continuemos a estudar as grandes potencialidades expressivas das palavras.

Em primeiro lugar, recordemos o esquema do capítulo anterior (capítulo 3), e o que a seu propósito dissemos:

I - O QUE É UMA palavra?

Uma PALAVRA é o resultado da ASSOCIAÇÃO de

= um SOM articulado por UMA pessoa: o FALANTE, ou Emissor

e

= um SIGNIFICADO conhecido por TODOS os FALANTES, ou Receptores:

Exemplo:

Tomemos um exemplo muito simples: vamos PRONUNCIAR a palavra "CASA":

– O que acontece?

Acontecem dois fenómenos simultâneos,

dos quais nem nos apercebemos:

A– No nosso CÉREBRO, surge a "imagem" genérica de uma "casa, uma HABITAÇÃO" -

que é o SIGNIFICADO ou "imagem mental", ou CONCEITO

B– Ao mesmo tempo, o nosso APARELHO FONADOR emite os SONS necessários para dizermos "CASA"

Ora bem:

o conjunto de A (o CONCEITO) + B (o SOM pronunciado) = a "PALAVRA" ou "SIGNO LINGUÍSTICO"

O que acabamos de dizer, parece uma coisa comum, vulgar... Parece uma coisa que toda a gente sabe, não é?

Mas é muito importante. PORQUÊ?

1- Porque UMA palavra pode ter VÁRIOS SIGNIFICADOS:

Exemplo:

DENTE – pode ser: = um DENTE de um ser humano ou de um animal;

= o DENTE de um pente;

= até mesmo... um "dente-de-alho"!

2- E também porque poderemos ter VÁRIAS PALAVRAS para UM mesmo SIGNIFICADO:

Exemplo: para a ideia de HABITAÇÃO, poderemos usar: casa, andar, apartamento, mansão, vivenda, palácio.....

II- A Língua pode oferecer-nos várias palavras para um só significado:

Para uma ideia (ou CONCEITO) – podemos ter vários SIGNIFICADOS:

Exemplo: para o CONCEITO de HABITAÇÃO:

Podemos ter várias palavras:

Casa, Apartamento, Casarão, Casinha, Casinhoto, Mansão, Palácio, Palacete, Vivenda, Lar, Vila,

Tugúrio, Casita...

...E até mesmo, se por acaso nos referimos a animais: CASOTA, TOCA...

Perguntaremos:

– Para quê tanta palavra?

A resposta será só uma:

– Porque fazem falta:

Quando dizemos PALÁCIO – certamente não estamos a pensar nos nossos pequenos apartamentos na cidade...

E se dissermos: TOCA – também não estaremos a pensar nas nossas habitações!

III - Para além do seu VALOR CONCEPTUAL , as palavras também podem comportar um “PESO” EMOCIONAL e/ou

AFECTIVO!

Ora vejamos um exemplo, através de um mini-conto:

" Vi um anúncio no jornal que me deixou muito interessada:

APARTAMENTO

RUA de São José

2 ASSOALHADAS, COZINHA, WC

Em muito bom estado

140.000 €

Fiquei muito interessada! Eu estava mesmo cansada de viver longe do emprego... Telefonei ao vendedor...

E fui ver a CASA...

Enfim, gostei muito do que vi. Era um 4º andar. Com elevador! As janelas ficavam bem acima do nível da rua!

Pensei comigo: "Faço daqui uma linda CASINHA!"

Depressa concluí os trâmites da compra, e depressa me mudei e me instalei na minha nova CASA.

Quando já tinha tudo arrumado, cortinas postas, e plantas verdes na minha pequena varanda, chamei a minha amiga Isabel, para vir lanchar comigo na minha nova instalação.

Eu estava impaciente. Mal ela tocou à campainha, fui abrir, e convidando-a a entrar, disse-lhe:

- Benvinda ao meu PALÁCIO!

E ela saudou-me, dando-me um abraço, dizendo:

- Parabéns, Amiga!"

Comentário:

Neste pequeno conto, vemos várias palavras REFERINDO a mesma REALIDADE: o novo apartamento da Narradora:

São elas: APARTAMENTO - CASA - CASINHA - INSTALAÇÃO - PALÁCIO

– Fica nítido para nós, que as palavras têm:

= o seu valor conceptual

e

= para além desse valor conceptual, podem ter ainda um “peso” emocional e afectivo!

Estamos mesmo a perceber que...

...A palavra APARTAMENTO designa uma realidade concreta:

A palavra REFERE uma realidade, está utilizada com o seu valor DENOTATIVO, pois está usada com o seu significado REAL;

A palavra CASA também está usada com valor DENOTATIVO: também refere uma realidade: mas o seu significado é genérico! Não contém nenhuma especificação: nada nos diz sobre tamanho, especificidades, etc...

Quanto à palavra CASINHA - vemos que se trata de um DIMINUTIVO:

Mas é um DIMINUTIVO muito especial: em Português Europeu, usamos os diminutivos com uma intenção de AFECTO, de CARINHO:

Quando a narradora diz CASINHA não está a informar que o apartamento seja pequeno, mas sim está a antecipar o CARINHO, o AFECTO que poderá ter por aquela habitação quando a adaptar ao seu próprio gosto!

Neste caso, este DIMINUTIVO está usado em sentido CONOTATIVO;

INSTALAÇÃO, neste texto, é uma palavra muito neutra: está no texto a EVITAR A REPETIÇÃO de "apartamento";

PALÁCIO: Vê-se bem que neste conto, a narradora emprega a palavra PALÁCIO devido à sua EMOÇÃO! A palavra FUNCIONA como um "aumentativo", revela a grande EMOÇÃO de possuir um apartamento próprio, numa boa localização! E também está empregue em sentido CONOTATIVO.

Assim, podemos desde já formular uma definição:

As palavras, em geral, são usadas no seu SENTIDO DENOTATIVO: as palavras REFEREM-se a coisas reais; é utilizando o sentido DENOTATIVO que em geral, comunicamos;

Mas por vezes, usamos as palavras sob EMOÇÃO! Queremos dar-lhes um peso muito pessoal, queremos através da ENTOAÇÃO, ou do uso de DIMINUTIVOS, exprimir um AFECTO, ou uma IRONIA ... Neste caso, dizemos que as palavras são usadas em sentido CONOTATIVO.

IV - Vejamos ainda o mini-conto que acabamos de comentar - mas agora com uma pequena alteração:

" Vi um anúncio no jornal que me deixou muito interessada:

APARTAMENTO

RUA de São José

2 ASSOALHADAS, COZINHA, WC

Em muito bom estado

140.000 €

Fiquei muito interessada! Eu estava mesmo cansada de viver longe do emprego... Telefonei ao vendedor...

E fui ver a CASA...

Enfim, gostei muito do que vi. Era um 4º andar. Com elevador! As janelas ficavam bem acima do nível da rua!

Pensei comigo: "Faço daqui uma linda CASINHA!"

Depressa concluí os trâmites da compra, e depressa me mudei e me instalei na minha nova CASA.

Quando já tinha tudo arrumado, cortinas postas, e plantas verdes na minha pequena varanda, chamei a minha amiga Isabel, para vir lanchar comigo na minha nova instalação.

Eu estava impaciente. Mal ela tocou à campainha, fui abrir, e convidando-a a entrar, disse-lhe:

- Benvinda à minha TOCA!

E ela saudou-me, dando-me um abraço, dizendo:

- Parabéns, Amiga!"

Comentário:

Nesta variante, a narradora não utiliza PALÁCIO... Mas sim, TOCA.

Porquê?

Estará ela a subestimar a sua instalação?!

Nada disso!

Ela estará a exprimir-se num certo TOM de IRONIA...

Pois neste caso, a palavra TOCA passou a ter um sentido de REFÚGIO, de ABRIGO!

Aqui, a palavra TOCA também está usada com VALOR CONOTATIVO.

Mas por que motivo foi ela escolher a palavra TOCA?

Provavelmente, ela sente que o mundo "lá fora" é agressivo, agressivo demais... E assim, recorre a esta palavra que,

literalmente, significa "ABRIGO, REFÚGIO"! Talvez esteja implícita, quem sabe, uma comparação com a sua casa

anterior... talvez este novo apartamento seja mais ao seu gosto, e ela sentir-se-á aqui mais confortável!

CONCLUSÃO:

Os jovens Estudantes poderão perguntar:

– Para que serve saber isto tudo?

E a minha resposta será sempre a mesma:

– Para escrevermos textos mais bonitos! Para escrevermos com consciência dos EFEITOS ARTÍSTICOS que podemos tirar das palavras que escolhemos!

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Myriam

Março 2021

Apresentação gráfica do texto, refeita em 1 de Novembro de 2022

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 14/03/2021
Reeditado em 01/11/2022
Código do texto: T7206984
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