SONETOS INDIGNADOS

A INGRATIDÃO DA HUMANIDADE

A ingratidão, meu Deus, esta pantera

Que habita o coração da humanidade,

Ignorando o amor e tua bondade,

Chamando-te até mesmo de quimera!

A ingratidão, meu Deus, no mundo impera.

Fazer o bem parece iniquidade!

O agradecimento é leviandade,

Sempre da parte de quem não se espera!...

É contumaz, meu Deus, homens ingratos,

Comer teu pão, depois cuspir nos pratos,

Ignorando o amor com que fizeste!...

E se lhes pede comida, um faminto,

Ignoram o pobre no recinto,

Negando repartir do que lhes deste!...

SONETO DA INGRATIDÃO

A dor da ingratidão, que dor pesada!

É dor que não desejo pra ninguém.

É pagar com o mal quem fez o bem,

Desprezar quem lhe ajudou n’empreitada.

A dor da ingratidão deixa arrasada

A natureza de quem ama e confia;

Como é triste sentir melancolia

Isomorfa a de uma alma injustiçada!

Por que tanta ingratidão nesta terra?

Por que tanta covardia, tanta guerra,

Contra quem somente amou, fez o bem?...

Por que age tanto assim a criatura

Que ante o amor recebido se aventura

Ofertar seu desprezo, seu desdém?...

A FALSIDADE DESTE MUNDO

Neste mundo é tamanha a falsidade

Que a verdade, de repente, ocultou-se;

A mentira transformou-se em verdade

E a verdade, em mentira, transformou-se!

Porventura alguém sabe onde a verdade

Neste mundo hodierno extraviou-se?

Em que parte do planeta a bondade

Inda não, em maldade, adulterou-se?

Oh Senhor, nos livrai da falsidade!

Que opera neste mundo de maldade,

Da forma mais arguta e traiçoeira...

Pois no mundo a maldade não se espira:

A verdade transformou-se em mentira

E a mentira — em verdade verdadeira!

AMIGOS DE APARÊNCIA

Cuidado co’os amigos de aparência

Que cercam nossa vida, meu irmão.

Fazê-los confidentes — que imprudência!

Se não contemplam Deus no coração.

Cuidado co’os amigos de aparência,

Fingindo-nos ter amor e união;

Planejando só o mal (com paciência)

Figurados de ovelha e de cristão!

É mister que tenhamos mais prudência,

De tudo o que falamos, na essência,

Pra não incendiarmos u’a floresta!...

Busquemos no Senhor mais sapiência

Pra fugir dos amigos de aparência

Que acreditamos bons, mas que não prestam!

FALSIDADE

Falsidade, fator de rima fácil,

Facilmente encontrada todo dia;

Quer seja na nobreza, em modo grácil,

Ou nos servos da noite nua e fria.

Falsidade, palavra que associa

A calúnia, a mentira e a perdição.

Falsidade, o que Judas fez um dia,

Contra Cristo, ao tramar a traição!

É triste praticar a falsidade

Contra quem nos amou com lealdade

E nunca nos deixou sofrendo a esmo...

Ensinando pra toda humanidade

Que amassem uns aos outros de verdade,

Da maneira que amamos a nós mesmos!

PÁSSARO FERIDO

Pássaro ferido na fria calçada

Como um condenado a viver ao chão,

Quem se importa com sua asa quebrada?

Seus sonhos alados na imensidão?...

Qual o motivo? Qual foi a razão

Dessa maldade contra um indefeso?

Inveja do voo?... Da sua emoção?...

-Pássaro ferido sentindo-se preso!

Oh dias vividos! Oh noites sonhadas!

Por que tanto ódio, pessoas malvadas?

As asas do sonho - por que quebrar?...

Às vezes me sinto, em horas marcadas,

Qual passarinho de asas quebradas,

Por tanto na vida viver a sonhar!

O DEUS DA PROVIDÊNCIA

Quebraram as asas dos meus ideais,

Decretaram uma lei: não podes sonhar!

O vosso inimigo ele é forte de mais,

Guardai vossas armas, não podes lutar!

Fiquei desolado, sem força, sem paz...

Queria ser forte, valente, lutar!

Foi quando escutei uma voz me falar:

Não temas meu filho que Vou te ajudar!

Não temas a força do teu inimigo

Porque nesta batalha eu estou contigo,

O gigante não irá mais ti afrontar!...

Eu sou o Deus Forte, Sou Jeová-Jiré,

Eu estou aqui para te socorrer,

Entrei nesta guerra para guerrear!

ATÉ QUANDO?

'Té quando teu torrão será perverso?

Até quando a terra mãe será ingrata?

Contra o filho que lhe ama e que lhe trata,

Qual joia mais sublime universo.

Até quando zombará de teu verso

Essa sociedade aristocrata,

Rotulando contra ti essa bravata,

De pseudo-poeta, controverso?

'Té quando seguirás, assim, na terra,

Vítima dos horrores dessa guerra,

Auferido com tamanha ironia?...

'Té quando manterás acesa a chama

Declarando, a cada instante, que inda ama

A terra que lhe inspira a poesia?...

POR QUE NÃO ESQUECER A TERRA INGRATA?

Por que não esquecer a terra ingrata

Que a seu filho renega, que maltrata,

Fazendo-lhe sentir-se um Dom Quixote,

De utopias, levando o seu pacote?...

Por que não esquecer a terra ingrata

Que com tanto desdém hora lhe trata?...

Mas a terra, poeta, que culpa tem

Se há pessoas que não lhe querem bem?

A terra que o Senhor lhe fez nascer

Porventura é culpada do sofrer,

Dessa ingratidão que não se cancela?...

A sua terra é seu berço, seu torrão,

Que culpa pode ter da ingratidão

Dos levianos que habitam sobre ela?...

TERRA QUE SEPULTA SEUS POETAS VIVOS

Terra que sepulta seus poetas vivos,

Oh, por favor, não me venha sepultar!

Que inda tenho muitos sonhos pra sonhar...

Quantas poesias em meu ser cativo!

Terra que sepulta seus poetas vivos!

Por que desprezas meus versos, meu cantar?

E por que te insinuas tanto a me inspirar

Se depois, para mim, fecha teus ouvidos?

Terra que seduz o promissor talento

E lança-o na gaveta do esquecimento,

À poeira do tempo, à mercê das traças!...

Torrão que me encanta e que me faz ativo,

Não venhas co'a tua pá soterrar-me vivo,

Que inda quero cantar-te. Este mal não faças!

DESABAFO DE UM POETA

Não me venham colocar nome de praça,

Não me venham colocar nome de rua,

Pois somente quando morre é que tem graça?

Que reconhecem poeta em terra sua?...

A indiferença vivida ela é tão crua,

É um desprezo ignóbil que não passa;

Por que só quando se morre se atenua?

É que reconhece o poeta a sua raça?...

Por que tanta ingratidão, tanta descrença

À sua obra? Por que tanta indiferença

Ao nirvana que tanto amor encerra?...

Por que, em vida, ele não é valorizado?

Por que, apenas, quando morre é que é lembrado,

Que reconhecem o poeta em sua terra?...

A MÁQUINA DE MOER CANA

A máquina de moer cana

Mói o rio, a natureza,

O roçado da pobreza,

Mói a terra, sem piedade.

A máquina de moer cana

Mói o velho e a criança,

Mói do jovem a esperança,

O futuro e a liberdade.

A máquina de moer cana

Também é máquina de moer sonhos,

Também é máquina de moer gente.

A máquina de moer cana

(que tem o nome de usina)

Mói meu verso e minha rima.

CRIANÇAS COMENDO PALMA

Será que essa sena não dói?

Será que essa sena não dói?

Será que essa sena não dói?

Será que essa sena não dói?!

Será que não dói essa sena?

Será que não dói essa sena?

Será que não dói essa sena?

Será que não dói essa sena?

Uma criança comendo palma,

Uma criança comendo palma!

Uma criança virando boi?!

Será que essa sena não dói?

Será que não dói essa sena?

Será que não dói? Não dói? Não dói?!

O PREÇO DO GÁS

O preço absurdo

Do gás de cozinha,

Encheu-me de gás

Na revolta minha!

Subir tantas vezes,

Mas quem já se viu!

Subir tanto o gás

Do nosso Brasil?

Diga-me, rapaz,

Se o preço do gás

Não está absurdo!...

E que o presidente

Dessa Petrobras

Não se faz de surdo!

QUEM NEGA PÃO AO FAMINTO

Quem nega pão ao faminto,

Tendo de sobra na mesa,

Perdeu-se num labirinto

De nebulosa avareza!

Quem nega pão ao faminto,

No deleitar da riqueza,

Seu coração absinto

É de gigante pobreza!

Quem não reparte seu pão,

Quem jamais estende a mão

Para outra mão estendida,

Pensa ser sábio e não é,

É mais pobre que esmolé,

É miserável sua vida!