VAIVÉM

VAIVÉM I – 16 JUN 21

a vida é morte porque a morte é vida

e a morte é vida porque a vida é morte,

a vida é morte porque a vida é sorte

e a morte é vida porque a morte é o norte;

a morte é o norte porque toda a lida

conduz à morte, por bom ou por mau corte,

por pior sorte na lida ou por esporte

e a vida é morte porque a morte é forte

e seja a vida mais curta ou mais comprida,

bem mais comprida será sempre a morte,

que ao norte corre sempre à toda a brida

e à toda brida corre a vida até que aborte

e todo aborte conduz a só e única guarida,

pois toda a vida se reduz ao mesmo porte.

VAIVÉM II

o vento passa em constante movimento,

porém não passa, que o real portento

é que transmite tão só seu passamento,

mas nunca sai do ponto onde é encontrado;

assim o vento permanece do meu lado,

seu movimento pode mesmo ser tocado,

porém o vento é um perpétuo flagelado,

sem residência, casa ou apartamento;

ele sopra aonde quer, mas não é ele

que de fato te sopra contra o ouvido,

são as partículas do ar que comunicam

o movimento, que empurram e te implicam,

mas o vento, por mais que se rebele,

jamais sai do lugar em que é sentido.

VAIVÉM III

e comigo se passa igual que ao vento,

eu impulsiono os outros, faço bulha,

junto de meu trabalho que se entulha:

imprimo às traduções seu movimento;

mas a mim não é dado um só portento,

fico onde estou; no beiral a pomba arrulha,

o vento está comigo e assim me esbulha

o quanto eu ganho com tanto pensamento;

eu sopro e agito como a tempestade,

porém não movo, permaneço preso

no local em que marcaram minha sentença

e voo como o vento em vã verdade,

pelas sendas de minha mente, puro e teso,

igual neblina que a meu redor se adensa.