Tu vieste...
 
Tu vieste... Vieste pelo escuro;
e a volúpia entrou dentro de mim.
O vento era um arpejar de bandolim
e tu eras um “pinheiro erguido” e duro;
 
Eu imóvel na pureza do cetim
vi sombras escorrerem pelo muro;
e de repente — não sei— eu te seguro...
Teu abraço era o adejar d’um querubim...
 
Levaram-me tuas asas rumo ao céu.
Do teu corpo saíram quentes lavas.
Pensei que morreria nesse fogo...
 
Então a aragem veio como um véu.
Sobre teu peito largo me deitavas,
me envolvendo em carinho— um doce jogo.

 
 




Do inverno e de mim...
 
Ah! Meu amor este é o inverno q’eu não quis,
embora eu queira o inverno de algum jeito.
Pois um “amarone” quente aquece o peito
e junto ao âmbar, o branco faz  matiz...
 
Mas nada disso importa ou faz efeito
quando lá no céu nada mais prediz...
Nuvens cinza são como cicatriz,
e já não mais debruço ao parapeito...
 
O minuano... Ah! Ele não é mais terno.
E a lã não mais aquece meu deserto.
Sinto que uma nevasca se aproxima...
 
Eu não quis amor, não quis esse inverno...
Esse destino... Esse fado tão incerto
como as variações do nosso clima.


 
Amarone: Marca de vinho
 




É outono...
 
É outono. Madurecem as pokãs
e penso ainda, amor, nos amanhãs.
Quantos deles virão talvez c’ o vento
trazendo-nos um gosto suculento?
 
Resistem ainda as folhas com afãs;
crescem os favos, doces talismãs...
É outono. Algo cai ou faz-se alimento.
Nosso amor enche cestos e momentos...
 
Então nos sentaremos pela terra;
as mãos cheias de tantas oferendas;
nas bocas, o beijo ocre se desterra...
 
Nossos beijos tingidos desse âmbar;
converte-nos em fruto—doce lenda
de namorados cujo dom é amar...
 

 





Da estrela...
 
Daqui de onde estou vejo uma única estrela.
Todo o resto é só um manto tão escuro!
Vieram-me ilusões, amor, de tê-la
qual talismã ensinando-me o futuro...
 
Qualquer futuro cheio de centelha.
Cansei da solidão, do branco puro...
Mas vem a aurora e sei que vou perdê-la
— a estrela — entre nós, pois, há um muro...
 
Além disso, há também nuvens sombrias
ameaçando esconder os fios de luz...
Ai de mim, ai das minhas fantasias!
 
Fantasias de nossos corpos nus
Impregnados de rocio em relvas frias
Pelo menos a estrela me reluz...

 

 






Tudo para...
 
Essa é mais uma noite e tudo para,
exceto o farfalhar do limoeiro
com seus poucos limões— meu olhar depara.
Posso apenas sentir o vento ligeiro...
 
Em algum galho o grasnar de alguma arara
denuncia o silêncio tão brejeiro!
Convencida que encanta, a canção rara...
Teu cantar desafia o cancioneiro...
 
Mas tudo para, enfim, a essa hora morta.
Até a dor cessa, menos a saudade,
que feito o vento vai batendo as portas...
 
Amor meu, tudo para, sem bondade,
e só tua lembrança me conforta...
Nem o verso, nem ele tem piedade...


 



 





Vem comigo...
 
Vem comigo, amor meu, por estas terras.
Deixe seu sobretudo e vem comigo...
Atravessa comigo os vales, serras...
Nada temas diante do perigo!
 
Sigamos resolutos para as guerras!
Sem convenções, sem roupas, sem abrigo.
Da natureza tudo se desterra:
 a água, o fruto e até o sangue do inimigo;
 
esta nossa ansiedade que enche o peito;
enche o céu, enche fontes, enche as casas;
transfiguram estrelas, amplidões...
 
Portanto, basta o amor, nosso direito
de amar, e a liberdade abrirá asas...
A paz virá depois das convulsões...

 
 
 





Como te esperei...
 
Veja amor, floresceram margaridas.
Olha, elas sobressaem entre as flores;
as amarelas pétalas urdidas
como os abraços frescos dos amores.
 
Veja amor, borboletas de mil cores
copulando as belezas florescidas...
Como incitam meus beijos, meus ardores;
as ânsias tanto tempo reprimidas.
 
Como te esperei, amor! Esperei tanto!...
Só para contemplar o campo em flor;
colher as margaridas de mãos dadas;
 
buscar felicidade em qualquer canto;
na relva se deitar e, ébrios de amor,
brincar de bem me quer, contos de fadas...

 
 
Olá queridos amigos recantistas, lindo domingo pra vocês. e pra vocês mais uma série de sonetos de meu livro de bolso SONETOS PARA UM AMOR que lancei em 2016 e que pode ser encontrado em diversas livrarias online. Abaixo alguns links onde está à venda.

https://www.amazon.com.br/Sonetos-S%C3%B4nia-F%C3%A1tima-Machado-Silva/dp/8591709527/ref=sr_1_6?dchild=1&qid=1606676633&refinements=p_27%3AS%C3%B4nia+De+F%C3%A1tima+Machado+Silva&s=books&sr=1-6

https://clubedeautores.com.br/livro/sonetos-para-um-amor

https://www.estantevirtual.com.br/livros/sonia-de-fatima-machado-silva/sonetos-para-um-amor/1038395740?show_suggestion=0&busca_es=1


Falta agora só mais uma série pra publicar aqui  esses belíssimos sonetos.
 

IMAGENS – Coby, o gato de  olhos azuis enormes e mais lindos do mundo e de pelo curto inglês , de personalidade forte cujas fotos têm feito enorme sucesso na Internet. FONTE  DAS IMAGENS https://www.instagram.com/cobythecat/


 



INTERAÇÃO DO POETA   Solano Brum
 
TUDO PARA -II-
 
Tudo para a essa hora morta, e, lá fora,
O vento sussurra como num lamento.
Ponho-me a lembrar de ti, nesse momento,
E lá no fundo, sinto que minh'alma chora!
 
Essa ausência de ti, sempre me apavora...
Não sei aonde ir... Tampouco, a nada invento!
Os papéis picados, todos, lançados ao vento,
Cismo que chegarão as suas mãos, sem demora!
 
Neles estão os versos que a ti escrevo...
E vou rasgando-os e lançando-os p'los ares,
Qual náufrago lança seu pedido de socorro!
 
Vem depressa, senão, depressa morro!
Sendo o vento forte, olhá-lo, não me atrevo,
E a dor da solidão é pesar dos meus pesares!
 

 Obrigada poeta pela linda interação