A desconstrução de Margarida Gautier

A DESCONSTRUÇÃO DE MARGARIDA GAUTIER
Miguel Carqueija



Resenha de “A dama das camélias”, de Alexandre Dumas Filho. W.W. Jackson Editores, Rio de Janeiro-RJ, 1963. Grandes Romances Universais, volume 2 com “A tulipa negra” de Alexandre Dumas, pai.

Este romance, o livro mais conhecido de Dumas Filho (que nunca obteve a mesma fama e popularidade do pai, exceto por esse romance que virou um grande clássico) segue a linha trágica que também se verifica no destino de outras mulheres em obras de Tolstoi, Flaubert, Eça de Queiroz e até no brasileiro Aloísio Azevedo.
Margarida é uma prostituta de luxo, isto é, como se dizia então, uma cortesã, acostumada com altas despesas e amantes caros. Porém Armand Duval vê nela algo mais e, depois de se ligar a Margarida (que desde o princípio já se sabe que sofre de tuberculose) acaba morando com ela numa casa de campo. São felizes até que as ligações familiares de Armand interferem.
O enredo é deprimente e triste. Margarida caminha pra a auto-destruição, pela perda da saúde mal cuidada. Armand, quando julga ter razões de queixa, trata-a com ódio e desprezo e a abandona quando ela mais precisaria dele; quando se arrepende já é muito tarde.
O livro põe bem claro o ambiente de libertinagem materialista na alta burguesia francesa, especialmente a parisiense. Armand admite francamente ao seu amigo, a quem narra a triste história, a vida canalha e ociosa que levava:
“Meu pai é o homem mais respeitável que se possa imaginar. Minha mãe, quando morreu, deixou seis mil francos de rendimento que meu pai dividiu por mim e por minha irmã no dia em que obteve o emprego que requeria; depois, quando cheguei aos vinte e um anos, juntou a esse pequeno rendimento uma pensão anual de cinco mil francos, afiançando-me que com oito mil francos podia viver excelentemente em Paris, se quisesse arranjar (sic) uma posição no fôro ou na medicina, que avolumasse ainda mais o meu rendimento. Vim para Paris, fiz o meu curso de direito, entrei na classe dos advogados e, como fazem muitos rapazes, meti o meu diploma na algibeira, e entreguei-me à vida indolente de Paris.”
E esse cretino tinha até um criado, como se dizia naquela época; os homens que serviam como empregados domésticos dos aristocratas eram muitos. Margarida também tinha a sua criada.
Até o pai de Armand acha que um cavalheiro deve ter sua amante; mas ele se opõe à ligação com Margarida por outras razões (sua ostensividade que prejudicaria o matrimônio da irmã).
Como Dumas Filho revela alguma coisa do final antes de iniciar o começo (eu não aprecio esse sistema) já se percebe facilmente que tudo se encaminha para o desastre e que não haverá o desejado “final feliz”.

Rio de Janeiro, 3 de agosto de 2017.