Jesus e Javé os nomes divinos

 
Dentre tantos gênios de origem hebraica qual deles seria o mais célebre? Essa pergunta deixar-nos-ia em dúvida. Desde Abraão, Isaac, Salomão, Davi, Isaias, Moisés, Spinoza, até modernamente Einstein, Freud, Marx, Kafka, Husserl, Wittengeinstein, Hanah Harendt, Edith Stein, Walter Benjamin, Norbert Elias, entre tantos outros,  os hebreus e a sua história particular tem legado ao mundo, não só valores morais, mas contribuições decisivas em todos os campos do conhecimento, seja na religião, nas artes ou nas ciências.   O fato é que ao longo dos milênios, esse povo moldou o nosso modo de pensar e de agir. Não é à toa que alguns chamam a civilização Ocidental de judaico-cristã.  Em meio a tantas personalidades uma, entretanto, ofusca as demais, Jesus ou Yeshuá de Nazaré que é para o crítico literário  americano de origem judaica, Harold Bloom, o mais genial dos judeus. Javé, outra entidade judaica seria a própria genialidade.   Em seu livro de ensaios “Jesus e Javé os Nomes Divinos" ( Jesus and Yahweh: The Name Divine. Tradução de  José Roberto O´Shea. Objetiva. 2006, 274 p.) o ensaísta quer compreender as divindades Javé e Jesus - o Cristo que difere em muito do Jesus histórico, que teve uma vida singular e que sem dúvida alguma é o barril de pólvora que detonou processos de transformações sócios políticos, culturais e até econômicos(leia-se Max Weber)  do mundo Ocidental.
De uma seita marginal, o cristianismo, tornou-se o alicerce espiritual do mundo romano e depois de toda a Europa e Ocidente.  O livro de Bloom centra-se em três figuras: o Jesus histórico, Yeshuá de Nazaré, um Deus teológico, Jesus Cristo, e um Deus demasiado humano Javé. Harold Bloom nos explica que do Jesus histórico poucos elementos temos para poder compreendê-lo historicamente e o Jesus que ele denomina de teológico que é conhecido através de textos "tendenciosos" trazidos a nós por evangelhos que tem o intento mais de catequisar e que pouco se conhece sobre Yeshuá de Nazaré que para Harold Bloom é o "enigma dos enigmas".  Os poucos fatos que conhecemos do Jesus histórico está nos relatos pouco confiáveis do historiador romano de ascendência judia  Flávio Josefo (38 a 100 d.C.) ou nos relatos tardios contidos nos evangelhos que retratam a vida de Jesus, bem como a sua morte e ressurreição décadas depois do fato ter acontecido. Harold Bloom informa que os evangelhos sinóticos trazem em si um antissemitismo explícito (sobretudo o de João)   e ele diz preferir o evangelho apócrifo de Tomé a todo o evangelho canônico.  Para Bloom, Yeshuá de Nazaré existiu, mas o Cristo " foi uma invenção do novo testamento” ( p.36).  Afirma que  “ a busca incessante do Jesus verdadeiro não contaminado pelo dogma é uma obsessão de pesquisadores. Fala que nos EUA ao longo de sua história, Jesus tem atuado como um protestante sem denominação específica. Ele adverte que se sua afirmação soa irônica, a sua intenção é exclusivamente literal, “ e não desaprovo a nossa tendência natural de entabular conversas particulares com um Jesus nosso(...) a não ser pelo Hamlet shakespeariano, não me ocorre outra figura tão volátil quanto Jesus; ele de fato, pode  ser tudo, para todos os seres humanos” (p.37). 
Javé  e Jesus Cristo pertencem a tradições distintas. Enquanto Javé nada tem de grego e, portanto, da tradição Ocidental, Jesus emerge de um judaísmo helenizado, que vai desde a tradição Homérica, a Sócrates e Platão. Bloom diz  que o seu interesse nesse livro são a personalidade, o caráter e o autoconhecimento de Javé e de Jesus. Fala da obra sobre Jesus do Padre John P. Meier, A Marginal Jew ( Um judeu  à margem) onde ele define Jesus como “um gênio judeu” e acrescenta que Jesus foi o maior deles. Para ele, Jesus foi o Sócrates  Hebreu e supera o mentor de Platão na qualidade de mestre supremo da sapiência obscura. Amor e não ironia é o que os fiéis buscam em Cristo. (p.44). “Jesus nos confronta a todos, fiéis e infiéis, com um conjunto de enigmas” ( p.44) Ele observa que os judeus tem com Cristo uma relação negativa, mas não, necessariamente, com Jesus, que mal pode ser responsabilizado pelo que o cristianismo fez em seu nome. (p.44). Observa que as palavras de Jesus são sempre enigmáticas, o que é um enigma? indaga Bloom, seria uma espécie de “charada verbal”. Nos mostra que a palavra em sua origem remete ao vocábulo grego que significa fábula. Observa que Jesus recorrendo a aforismos ou parábolas, fala através de enigmas. Sobre  o evangelho de Marcos ( que ele tem preferência aos demais evangelistas) e sendo, o primeiro dos evangelhos sinóticos, é o evangelho que mais revela um Cristo secreto e enigmático. O evangelho de Marcos se destaca como o enigma dos enigmas “ sempre resistente a análise” (p.48). Sobre uma análise da psicologia de Jesus o autor informa que  mesmo as mais sofisticadas especulações freudianas não se aplicam a Jesus, porque a sua relação com a mãe e com o suposto pai  é de total desprendimento.  Bloom afirma ser Freud  a maior encarnação do gênio judaico depois de Jesus. Entretanto ele observa que  o preceito freudiano segundo o qual toda religião se reduz ao desejo do pai não se aplica a Jesus. Ao se valer de enigmas,  Jesus expande e modifica as tonalidades da Tradição Oral de seu povo. (p.53) Ele compara a afirmações de Paulo de Tarso que parece despresar a letra:  “ A  letra mata, e o Espírito é que da vida” (2 Corintos 3, 6) se contrapondo a afirmação de Jesus de Nazaré que valoriza a palavra:  “ nem sequer uma letra e vírgula serão tiradas da Lei, sem que tudo aconteça” (Mateus 5, 18). O autor fala do seu desagrado quanto aos escritos de Paulo de Tarso  e de João por ser   notadamente  antissemitas. Nota que a oscilação entre amor e ódio aos Judeus tem inspirado uma longa história de violência contra seu povo. Observa que o  Novo Testamento é obcecado por uma relação angustiada com a Lei e os Profetas, embora ressalte  que os evangelhos são um feito literário notável. (p. 54) . Tanto o Novo Testamento quanto o Alcorão eclipsaram a Bíblia Hebraica. Ler o  Novo Testamento na íntegra e na ordem que foram dispostos canonicamente é uma experiência tanto literária como espiritual.  O Novo Testamento se fundamenta na violência sagrada da Crucificação e do suposto desenlace, em que a morte em consequência de tortura se transforma em ressurgimento dentre os mortos. (p.113)  No capítulo  V, o autor vai falar de Paulo e  afirmar que um terço do evangelho é paulino, o verdadeiro fundador da religião cristã, que nem chegou a conhecer cristo.  Afirma que  Paulo é mais agitador do que teólogo místico. Cita George Bernard Shaw que compara Paulo a Karl Marx e afirma ser os dois,  grandes perpetradores de equívocos que provocaram o desterro de toda responsabilidade moral. (p.73) Para Bloom, Paulo de Tarso não é nem vilão nem modelo, é o gênio da síntese, singularmente estranho, que oculta algo evasivo no fundo do seu ser. (p.75).
No Capítulo 9 irá abordar o dogma da Trindade que é a linha crucial da defesa da igreja contra as acusações do judaísmo e do islamismo quanto ao caráter politeísta do cristianismo ( já que são três entidades em uma: Pai, Filho e Espírito Santo - a Santíssima Trindade) . Afirmará que a Santíssima  Trindade se constitui numa proeza excepcional do mundo cristão. (p.121). Noutro capítulo, Bloom se dedica ao estudo da personalidade de Javé o Deus judaico.   Ele explica que o titulo de seu livro “Jesus” significa Jesus o Cristo, um Deus teológico ao contrário de Javé que seria um Deus humano, demasiado humano. Mas observa que se Javé como a entidade Cristo for uma ficção “trata-se da ficção mais perturbadora que o Ocidente já produziu”.   Para Bloom tanto o Antigo Testamento quanto o novo, são antes de tudo textos literários com uma força de persuasão muito forte. Um terço do evangelho foi inspirado nos escritos de Paulo, a Tanak, foi escrito pela autora “J”.
 
Labareda
Enviado por Labareda em 09/12/2014
Reeditado em 21/10/2019
Código do texto: T5063815
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