Sob o poeira do Apartheid .

Ao descrever a pobreza dos guetos de Johannesburgo e a humilhação e opressão que seus habitantes sofrem, Athol Fugard, o mais conhecido dramaturgo sul-africano também foi alvo da repressão do Apartheid, sendo até proibido de sair do país. A sua persistência em retratar os dramas de sua terra e o retrato das transformações sociais e políticas que sobrevieram ao fim do regime o colocou na mídia mundial. Suas peças foram apresentadas em todo o mundo, de Portugal a Broadway americana. Escreveu durante 20 anos, uma mistura, com suas palavras, de "condenação e celebração", o que se condena é o sistema do Apartheid e o que se comemora é a alegria do espírito humano.

Em Tsotsi – infância roubada (Cia das Letras, 296 páginas, R$ 46,00), seu primeiro e único romance, que chega as livrarias brasileiras após conquistar a América com sua versão cinematográfica, o filme baseado no livro foi vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro no ano passado, Fugard consegue retratar a violência, o crime dos guetos como um produto desse processo implacável formado pelo sistema político governante. Como em suas peças, o autor narra cenas que com o poder da narrativa, ganham maior comoção, como por exemplo ao descrever, a conversa que o líder dos gangsteres conversa com um deficiente.

Tsotsi foi uma obra que Fugard possui escreveu e abandonou após seu término em 1961. Foi publicado primeiramente em 1980, na Inglaterra e na África do Sul, esquecido pelo autor, o livro foi descoberto por dois estudantes sul-africanos, em meio aos papéis do dramaturgo. Na edição brasileira, também é oferecida uma das principais peças do dramaturgo, Mestre Harold ... e os meninos, de um ato só, um perfeito exemplo da arte de Fugard em encenar os conflitos e injustiças do apartheid.

O termo Tsotsi, segundo o diretor Jonathan Kaplan era um estilo. Jovens negros que viviam nos distritos da cidade de Johannesburgo, seguindo a linha dos gângsteres norte-americanos da década de 1940, retratados pelo cinema norte-americano, imitavam as roupas e os trejeitos daqueles bandidos a la Hollywood , armados com canivetes, com seus chapéus de feltro, paletós transpassados e gravatas largas e coloridas. Esses jovens passaram a desprezar a lei e a ordem, e a palavra Tsotsi, em Afrikaans significava desordeiro, rufião passou a ser usada para assassino e ladrão. Marginais violentos, que eram tão impiedosos e irracionais que eram considerados os predadores dos guetos.

A história narra as andanças de um jovem marginal negro, epônimo do título do romance , com sua gangue, pelas ruas miseráveis da Johannesburgo dos anos 1950. Tsotis é um personagem despido dos preceitos humanos, sem moral, sem memória, sem história, que vive aprisionado em um mundo racista, cometendo crimes contra seu povo. Mas que se adapta a um novo preceito, após tentar assaltar uma mulher, ela abandona seu bebê nas mãos do rapaz, dando luz sobre seu passado sombrio. O ponto crucial do trama é a piedade de um assassino, o livro possui uma narrativa enxuta e lírica, onde o autor se coloca na pele dos oprimidos e dar voz à ira, à miséria e à esperança.

Cadorno Teles
Enviado por Cadorno Teles em 01/03/2007
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