O Império Bandido de Adroaldo
Glória Athanázio
Apresentação da novela O Império Bandido, de Adroaldo Bauer
Quando veio o convite fui tomada por um indescritível sentimento de lisonja. Eu já havia lido o livro. E mais, havia lhe revirado as entranhas em busca daquilo que alguns leitores encontram prazer íntimo em alardear: uma vírgula a mais ou a menos, um acento aonde não mais deveria estar, uma palavra mal grafada, uma frase sem sentido, aquele “algo que não se encaixa” dentro do texto.
Ler o livro ainda em fase de “gestação”, virar e revirar, tomar decisões e lutar por elas (o autor não é uma pessoa que facilmente se convença, há que haver argumentos muito bem fundamentados, pois se trata de um profundo conhecedor da nossa língua) já me foi uma distinção sem preço. Nesse andar, me encontrei teorizando que o ato de colocar um “manuscrito” em mãos alheias poderia ser comparável a posar nua – mesmo diante de um profissional calejado (e, em se tratando de literatura, não seria esse o meu caso) ou em frente a um confiável amigo fotógrafo. Refiro-me aqui à coragem de se expor a um primeiro olhar crítico (escancarar a celulite da alma, algumas estrias e imperfeições, quem sabe...). Diriam alguns que escrever já poderia ser pura e simplesmente considerado um ato heróico.
Terminada a tarefa, após algumas idas e vindas de textos, contente pela conclusão satisfatória, eis que sou convidada a criar a apresentação da obra. E aí os papéis se invertem... Se, por um lado, a honra me foi concedida, por sua vez, o peso dessa responsabilidade tratou de me travar durante bom tempo. Era eu sentar em frente ao computador e lá se ia a minha mente se projetando pra longe, para além dos pensamentos conectáveis em relação à apresentação do livro. Vinham-me imagens do sorriso bonachão desse amigo querido, lembranças da sua enorme boa vontade no sentido de estender a mão e auxiliar nas horas difíceis – imagem algumas vezes surgida no desenrolar da leitura do seu texto. Enxurradas de palavras inventadas e frases estruturalmente invertidas, que esse rapaz utiliza no dia a dia, assopravam nos meus ouvidos... “Feliz estou; Contente fico...”
Ai, frio na barriga! Meu Deus, o Luiz Pilla Vares escreveu a apresentação de O dia do descanso de Deus, o primeiro livro de Adroaldo Bauer... E agora, sou eu a receber essa honraria... Isso é simplesmente o máximo! E o gelo no estômago não sempre foi o combustível dos nossos maiores artistas e criadores? Não tem sido ele o tempero necessário às boas interpretações? Escrever, para alguns de nós, é necessário, como válvula de escape. Mas, lançar nossos escritos ao mundo sempre será um ato de coragem.
E agora chegou a minha vez! Foi partindo desse sentimento que me lancei ao texto de apresentação que tanto me agoniava: amei o livro! Pronto, falei! Percebi um texto coerente, cuja leitura fluiu (tanto que, durante o processo de revisão, algumas vezes, tive de retomar capítulos inteiros por tê-los devorado na ânsia de conhecer-lhes o final e, obviamente, não lhes direcionara o olhar adequado).
É uma história policial, fictícia, em boa medida temperada com doses de uma realidade impregnada da vivência jornalística do autor. Revela experiências duras, algumas realmente chocantes, vividas em ambientes do mundo e do submundo, experimentadas por criaturas humanas do sul do Brasil, mas que, seguramente, poderiam pertencer a qualquer parte do mundo.
O texto de Adroaldo tem ainda uma característica que a meu ver se sobressai, um tipo de linguagem de câmera, cinematográfica, conduzindo através dos caminhos por onde transitam os personagens, descrevendo cenas e cenários, dirigindo o leitor, como num filme, a vislumbrar riquezas de detalhes e de situações. Isso sem falar na marcante presença Adroaldiana nas soluções encontradas pelo autor para o desfecho dos dramas vividos por algumas de suas criaturas... Mas, para saber dela, recomendo: leia o livro!