Onde encontrar a sabedoria ?


          O autor é o crítico literário norteamericano Harold Bloom. Comprei o livro porque me interessa o conhecimento da verdade (sabedoria) e os caminhos que podem levar até ele. Não é um livro fácil de ler: exige erudição literária, coisa que não tenho. Neste assunto sou completamente promíscua, basta ler a minha lista de livros lidos. Mas é fascinante. Ainda na introdução algo extremamente sério, para pensar: “Qual será a utilidade da sabedoria, se esta só pode ser alcançada na solidão, na reflexão acerca de leituras? A maioria de nós é consciente de que a sabedoria voa janela afora, quando nos encontramos em crise”. Em duas frases ele afirma:
- A sabedoria só pode ser alcançada na solidão- A sabedoria se alcança através da leitura reflexiva. - Adquirida a sabedoria, quando precisamos dela, nos momentos de crise, ela voa janela afora.

          Quando eu fico muito brava e o peso da vida encurva minhas costas costumo exclamar para mim mesma: Por que não nasci burra, acreditando em tudo!? Embora isto aconteça muito raramente (o querer ter nascido burra), acontece. E tenho que concordar: o reino dos céus será dos pobres de espírito. Como São Pedro poderia recusar a entrada na casa de Deus daquela almazinha humilde que acredita em tudo e que erra sem consciência? Enquanto isto, nós, os que buscamos as verdades da vida, acabamos dando com os burros na água. Fervendo, bem explicado, porque os caldeirões do inferno são todos de água fervente. Ainda bem que gosto de água quente.

          Bloom pensa que lemos para sanar a solidão. Pensa também que na prática, quanto mais se lê, mais solitário se fica. Não considera a leitura vício e muito menos virtude. Mas afirma categoricamente: o motivo mais profundo da leitura tem que ser a busca da sabedoria. O que me leva a concluir: e o motivo para escrever só pode ser instruir. Eu penso que tudo se transforma em um círculo, que pode não ser vicioso, mas também não é virtuoso: começa-se a ler para sanar a solidão, mas quanto mais lê o indivíduo, mais solitário fica porque inconscientemente vai atingindo um grau maior de conhecimento e a vida que lhe cerca começa a inquietá-lo e ele continua a ler para acabar com essa inquietação que por sua vez sempre aumenta, quase até o ponto de explodir. Até finalmente se aquietar  o que é uma aspiração da maturidade.

          O autor desse magnífico livro traça paralelos entre as obras de grandes escritores que classifica de sapienciais, escritores dos quais podemos extrair a sabedoria. Um desses paralelos que me comoveu foi o traçado entre um trecho da Bíblia de Genebra (a Sabedoria de Salomão) e outro do Rei Lear (Shakespeare) onde se torna claro que a entrada e a saída da vida é igual para todos, o que ainda hoje muitos de nós teimamos em não aceitar. Ou seja, teimamos em não adquirir este conhecimento porque o ensinamento só se torna conhecimento e sabedoria quando ele realmente se insere em nossa vida. Mas uma grande parte da humanidade tem certeza absoluta que nasceu predestinado e que é imortal.
 
          O outro grande escritor que Bloom considera o máximo é Montaigne, o que me encheu de alegria porque, quando descobri o livro Ensaios o transformei em livro de cabeceira e quando tenho dúvidas sobre algum assunto vivencial é lá que vou procurar. Evidentemente o crítico norteamericano foi capaz de ver em Montaigne muito mais do que vi, mas sou grata porque agora vou redobrar minha atenção. A conclusão sobre o objetivo da vida para Montaigne é realmente fascinante. Ele considera que nossa principal ocupação na vida é viver. Quando alguém termina o dia alegando que nada fez, ele o repreende: como nada fez, por acaso não viveu? O mais importante para um ser humano é gerir a própria vida. Esta é a maior das tarefas. Nosso dever é aperfeiçoar o nosso caráter, não vencer seja lá o que for, nem construir, nem criar. Tudo é acréscimo ao fundamental, tudo é acessório, à gloriosa obra prima que é viver adequadamente. “Nada é tão belo e legítimo do que desempenhar bem e corretamente o papel de homem, nem conhecimento tão difícil de ser adquirido do que saber viver bem a vida, de modo natural; e a mais cruel das enfermidades é desprezar o nosso ser.” A obra de Montaigne é feita de citações, pois ele também busca a sabedoria nos livros. Uma de suas citações mais interessantes é de Horácio, que repasso aqui usando o meu vocabulário e a minha compreensão: não adianta nada usar pernas de pau para ficar acima dos outros homens porque mesmo sobre as pernas de pau teremos que andar com nossas próprias pernas. E ao assentarmos no trono mais elevado do mundo em oposição a quem está assentado no mais rasteiro, todos nos, os assentados nos tronos e os nos bancos rasteiros ambos estaremos assentados sobre nossos próprios traseiros.

          Após analisar a obra de Goethe, baseada na renúncia, Bloom conclui, porém que o autor alemão nunca renunciaria a sua própria singularidade- o que me deixou deveras satisfeita porque acredito que o maior objetivo do ser humano na vida é encontrar a sua individualidade, aquilo que o faz único entre todos. Nem melhor, nem pior. Único.
Em Emerson ele vê o formador básico da cultura norteamericana em todos os aspectos, sejam eles culturais, sociais, políticos ou econômicos naquilo que sua sapiência tem de melhor: a autoconfiança, a fé em si mesmo. E é dele também que retira o motivo por que lê: “Leio em busca de lustro”, afirmando ainda que dessas leituras ele retira tudo o que lhe pertence, onde quer que se encontre, sem nenhum pudor. Que é o que faço agora, tirando da sapiência de Nietzsche a aceitação da contingência, que consiste em estar contido, não em conter. Foi deste conceito que tirei a certeza que tenho da existência de Deus: Eu não me criei, logo fui criado. Se existe um ser que não só criou a mim, mas a tudo que foi criado, este ser é superior a mim e a tudo que foi criado. Então eu chamo este Ser de Deus, como poderia chamá-lo de outra coisa qualquer. Mas Deus é o vocábulo utilizado em minha língua pátria para designar este ser, superior a tudo e a todos. Não preciso de outro nome embora saiba que o chamam por vários nomes. Mas isto não tem a menor importância. Sei que é o mesmo Ser.

          O livro ultrapassa em muito o que esta resenha consegue reproduzir pela simples razão de que não tenho conhecimento suficiente para apreender mais do que apreendi. Será necessário lê-lo outra vez se quiser ampliar meus conhecimentos. E ler também os autores que ele cita, as obras que esmiúça.Que vai além do que está citado aqui. O que acho improvável. O que condensei diz respeito apenas à sabedoria que para mim já pode ser considerada conhecimento. E que é ínfima.