A Conquista do Paraíso

Os professores de história cometem o erro de apresentar ao seus alunos demasiado jovens, com uma base fraca e resumida sobre a matéria, uma síntese histórica de um período complexo na forma de um filme apaixonado, que aos olhos daqueles jovens cujas moléculas irrequietas debatem-se incessantemente umas nas outras lhes aparece, compreensivelmente, como deveras longa e aborrecida. Lembro que odiei 1492: A Conquista do Paraíso (1492: Conquest of Paradise, 1992).

Ridley Scott, o nome por trás de referências da ficção científica no cinema, tem um repertório interessante de ficções históricas. Interessante não necessariamente significa bom: porque há certa paixão nesta crônica sobre Colombo que faltará aos gladiadores e cruzados embusteiros do futuro. Ridley Scott tem seus momentos aqui: a cena em que Cristovão Colombo (Gérard Depardieu) vislumbra o continente pela primeira vez; Moxica (Michael Wincott), com seu cavalo inquieto, que sozinho é uma nota que causa uma tensão enorme na segunda metade do filme; e as cenas de violência rápidas mas brutais. O que há de melhor em 1492 não está acompanhado de diálogos.

Quanto às verdadeiras intenções de Colombo para atravessar os mares talvez ninguém saiba, mas em relação ao Colombo de Depardieu fica claro que para ele um Novo Mundo não é apenas um novo continente, novas terras e novas riquezas, mas um mundo longe da intolerância, da ignorância e das fogueiras inquisitoriais. Colombo é romantizado aqui porque a ele é incorporado todos esses desejos e valores de quem aspira por liberdade; é quando a biografia se alia à fantasia e abre espaço para a identificação de uma parte remota do espectador com um sonho coletivo; isso não seria possível com um personagem egoísta e ambicioso; cabe-nos apenas não recorrermos a ela como documento histórico, mas como rascunho debilmente alegórico com uma bela fotografia: Utapan, o nativo, diz ''Você nunca aprendeu a minha [língua]'', referindo-se ao desinteresse europeu pela sua cultura, enquanto Moxica declarara ''Nós somos imortais'', referindo-se sem dúvida aos assassinos imperialistas que permeiam os séculos destruindo os povos e as culturas, eis o contraponto; nesse sentido, ainda que represente Colombo como um herói desbravador injustiçado, a chama intrépida da civilização e do progresso, o filme se encerra como pessimista e coloca diante do espectador, na última cena, o derradeiro vislumbre de um sonho primevo de renovação que não se concretizou.

Por trás das hipérboles e dos eufemismos que há nas ficções históricas e que há também nas grandes produções, há aqui, em algum lugar sob a superfície, algo de autêntico. Talvez uma reverberação forte do passado que Scott conseguiu captar, ou quem sabe seja somente a interpretação de Gérard Depardieu.