Simplesmente complicado
 

Passar doze horas viajando dentro de um avião, na classe econômica, é tão ruim quanto passar doze horas dentro de um ônibus, fazendo a mesma coisa. A sensação é a de que se transformou em uma sardinha enlatada. Se no ônibus você ainda pode sair da lata para respirar um pouco, esticar as pernas de quando em vez, no avião a única alternativa para encurtar o tempo é assistir a um filme na telinha ancorada e espremida no assento a sua frente. Foi o que fiz terça feira passada, voltando de Frankfurt.
 
Eu podia escolher e não tive dúvida: tinha que ser algo leve e divertido. No caso a única alternativa foi It’s complicated. Ou teria que assistir desenhos animados. Na minha condição de sardinha não estava a fim de ver bichos falantes.
 
Os dados técnicos eu busquei depois, ou seja, agora mesmo, antes de começar a escrever. Foi só então que fiquei sabendo que a diretora, Nancy Myers é a mesma dos filmes Do que as mulheres gostam, filme que vi, mas já esqueci,do fantástico Alguém tem que ceder, esse sim, inesquecível, O amor não tira férias, O Pai da Noiva (1e2).  Ela também é co-produtora e roteirista o que significa que, de uma forma ou de outra é poderosa.

O que inicialmente me atraiu foi a protagonista: Meryl Streep. Os machos também são daqueles que ficam bem na fita – Steve Martin e Alec Baldwin, embora por eles apenas eu não saísse de casa para ir ao cinema. Quando muito na locadora, se é que ainda existe alguma por aqui. E então, durante duas horas, o tempo passou mais rápido para mim.Eu me diverti. Cheguei a ter vontade de rir alto. O que certamente nem seria notado naquela barulheira infernal. Mesmo assim me contive. 
 
É um filme novo, do ano passado, lançado aqui no último fevereiro. A historinha é bobinha, mas estando eu impossibilita de fazer qualquer outra coisa a não ser tentar me esticar e espremer, depois que o filme acabou deu para pensar um pouquinho. 
 
Meryl Streep soberba como a mulher de meia idade, dona de um restaurante, divorciada e mãe de três filhos semi-adultos: a mais velha, casada (o cara que faz o papel de seu marido é genial, mas não sei o nome dele), outro que acaba de se formar na Universidade e a caçula, que está a caminho da Universidade. Meryl está carente, a casa vazia, se sentindo velha.  Ainda não superou a separação, ocorrida há dez anos. Sua válvula de escape são as amigas (uma delas é Rita Wilson, mulher de Tom Hanks), o trabalho e o sonho de reformar a casa onde vive desde a separação. O marido traidor (Baldwin) é um advogado casado com uma bela morena mãe de um filho pestinha e Steve Martin o arquiteto encarregado da reforma da  casa de Meryl, também divorciado, traído e ainda não recomposto.

A história toma fôlego (embora curto) quando a família toda vai para New YorK para a formatura do filho, sem os contra pesos. E aí Alec e Meryl têm uma recaída e acabam se tornando amantes. Bem, as coisas não acontecem assim, de cara, tem toda uma sensibilidade de uma mulher eticamente correta, mas ao mesmo tempo adorando uma vingancinha e toda a urgência de um macho safado já enfastiado com seu novo casamento. Não é preciso ser um gênio para deduzir que existe um triângulo amoroso com várias possibilidades de dissolução nem que as situações que ocorrem envolvem os sentimentos dos filhos. Três indicações ao Globo de Ouro (Melhor Comédia ou Musical, Roteiro e Atriz ( Meryl, é claro) indicam também que o filme tem boas qualidades, o que endosso. Mas não é nenhuma Brastemp. Divertimento certo para quem quer rir e dar uma pensadinha na vida. E ver Meryl Strep representando uma mulher bonita, madura, moderna e talentosa. Ou seja, ela mesma.

Aqui nesse finalzinho a pergunta que me fiz: mas que pensadinha na vida seria essa? O cerne das reflexões sobre o filme seria responder a pergunta: pode um relacionamento de anos, um relacionamento íntimo, com seus acertos e erros, mas interrompido por outros tantos anos ser novamente acionado? Pontos de vista são vários, pode se olhar por muitos ângulos, sejam eles os do triângulo, ou de simples observadores, mas isso é assunto para uma crônica não um texto que se pretende ser resenha. Uma boa sugestão seria, para os que ainda não viram o filme e acabem por vê-lo acompanhar os passos do genro do ex-novo casal. Ele é o olho.