Saindo perto...?
Naqueles anos pre-internéticos, hoje já caquéticos, mas ainda éticos, era pelo o alto-falante da matriz que se faziam os comunicados de maior interesse dos munícipes da Velha Serrana. Os anúncios fúnebres, por alguma recôndita razão - vai ver que do coração - eram os que mais chamavam a atenção do populacho, acho.
Um rádio, um fogão, uma enceradeira, ou uma simples enxada ao ar, ou mesmo uma prosa casual de porta de rua, eram imediatamente desativados para que os ouvidos pudessem absorver da mais cristalina forma e norma a mensagem ab urbe condita.
E do alto da torre da matriz de Nossa Senhora do Pilar, ao éter se lançava grave e compungida, mas firme e envolvente a notícia:
" A família de ... cumpre o doloroso pesar de participar aos parentes e amigos, o falecimento de ..., ocorrido ... e convida para o enterro a se realizar às ...horas, saindo..."
Eu, desde pirralho a rapazote, era capaz de jurar que a palavra que vinha a seguir era "perto". E me perguntava, até aos botões, por que diabos de perto, uma vez que a seguir vinha, comumente, um endereço completo: rua tal, travessa tal, beco tal?
Quiçá, por ancestral respeito ao falecido da vez, princípio de surdez, ou por preguiça tão-somente, pra fechar em três, nunca cheguei a indagar a papai - que, mesmo pouco escolado, sempre na comunicação verbal anda ligado - a razão daquele "perto". E não era perto, por certo?
Até que um dia, veio-me o estalo. Lendo, e lento, fui me dar com algum escrito, e já nem lembra de quem. Mas o certo - e bem perto - é que continha lá a palavra féretro. Ahrã, tava ali, matei a charada. Que contudo, e sobretudo, não teve a sua morte na matriz anunciada.