Café com vodka
Ela virava as costas enquanto um milhão de pensamentos invadiam pela varanda até atingirem minha mente. A brisa leve era forte o suficiente para balançar as cortinas, na mesma sintonia, que o vestido floral que ela vestia era capaz de se balançar com o, suave e quase imperceptível, rebolar que ela sempre tivera.
Aquele vestido era o meu favorito. Fora modéstia parte de ela escolhê-lo para se despedir. Ela o usara na noite em que nos conhecemos. Os cabelos também lembravam a mesma. Fios curtos, na altura do queixo, e lisos como o correr da cachoeira, ondulados na ponta como o rebentar das ondas ao chegar na areia, beira mar. Usava brincos de pérola branca, acompanhados de um anel, para combinar. Anel este que eu havia lhe dado no quarto ano de namoro. Um noivado. Um anel de ouro branco onde, correntes finas deste, contornavam uma pérola central, que nunca ofuscara. Mas nada brilhava mais que os olhos verdes que ela tinha.
Ao ver aquelas costas abertas pelo decote do vestido, o meu peito se apertou. Minha garganta fez um laço com próprias mãos. E senti falta dela, mesmo tendo-a no mesmo cômodo. A sensação de nunca mais encontrar uma pele tão macia quanto pêssegos, não me agradava. A ideia de não sonhar com um futuro próximo, não me agradava. Não tê-la perto de mim, não me agradava. Aquela imagem: ela, saindo vagamente pela porta, carregando nos braços dois livros e uma bolsa vermelha, e na bagagem, uma vida sem mim, não me agradava.
O que me resta é embebedar-me de saudade, e escrever frases de solidão. Madrugar em cima da sacada, com um copo de café com vodka. Fumar, e sentir pouco a pouco meu pulmão morrer. Pois meu coração já tivera morrido quando viu ela partir.