Antes fôssemos finados

Claustrofobia, pânico de altura, medo de insetos e visitas cada vez mais freqüentes ao psiquiatra. Uma série de fatores externos à realidade tem mudado o caráter da sociedade atual em relação ao inevitável. Em nosso cotidiano, vemos que o medo da morte tem se tornado a causadora dos principais distúrbios sentimentais nos seres humanos.

Em várias etapas da vida, traçamos uma lista de objetivos para conquistar a todo custo, criamos expectativas variadas e buscamos conviver com os seres da mesma espécie aplicando nossa política de boa vizinhança. Contudo, no sonho de conseguir um bom emprego, educar corretamente os filhos ou escrever aquele livro famoso, justificamos tudo pelo mesmo clichê: “se eu não fizer isso, a morte me pega e adeus! Não sou mais ninguém, não fiz absolutamente nada da minha vida.”

Nesse movimento contínuo, as pessoas partem, encerram seus reinados de conquista e destruição, deixando cada vez mais claro para os que cercam seu túmulo que ao se deitar ali e se deixar levar pelo sono eterno partimos em direção a uma viagem sem volta. E baseados no pessimismo, enfiamos na cabeça o doloroso dever de aproveitar menos nossa diversão gratuita, encerrar as sessões de risos, esquecer amigos e começar a tentar a todo custo fazer uma trajetória sem graça, mas com um fim glorioso para que se recordem bem aqueles que um dia olharão nossos túmulos sem o desdém dos vencedores.

E para um efeito desastroso, os sentimentos humanos são cada vez mais influenciados pelas perdas que acumulamos durante a vida. Nossa velhice se torna breve, chorosa e povoada de fantasmas do passado, que uma vez mais, médicos diplomados tentam apaziguar.

É claro, portanto, que não é possível saber quantos anos nos resta, mas antes disso é preciso entender que eternidade é tão dispensável quanto traçar nossas vidas com medo de morrer. No paraíso, quem sabe, o ser humano não flutue em nuvens e entenda que nossa essência existe para sempre quando transmitimos aos que amamos o que fomos e que a magia da vida não termina quando o relógio bate meia-noite e somos condenados ao sono eterno.

Tadeu Goulart
Enviado por Tadeu Goulart em 05/07/2009
Código do texto: T1684397
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