Qual é o bicho mais importante da Selva?
Qual é o bicho mais importante da Selva?
Dia desses, ouvi de um sábio uma história com jeito de causo. Fui para casa matutando, pensando na sinuosidade, nas curvas que cada bicho que apareceu me revelou. Preciso desaguar essa história do meu pensar e dividir com você. Quem sabe multiplicar se acaso te interessar. Espie:
O Conselho da Selva decidiu convocar todos os bichos da terra, da água e do ar para deliberar qual bicho de maior importância ali iria se apresentar tornando-se assim o Rei. Para tal, organizaram um grandioso evento onde os participantes concorreriam através de competições de diversas modalidades. Ao final de cada prova executada, seria computada a pontuação de cada animal participante.
Na manhã desta histórica olimpíada, a movimentação na Selva era grande! Torcida organizada, grupo dos puxa saco profissionais, conchavos políticos já preocupados com a sucessão do Rei atual, O Senhor Coruja. Este, por sua vez já estava de saco cheio de mandar. Queria agora sombra e água fresca. Nem aprender queria mais! Doaria toda a sua vasta biblioteca, deixaria de escrever seus ensaios, publicar artigos, livros e plantaria um jardim e uma horta. Faria apenas, como derradeiro ofício (exigindo alguma regra) um curso de culinária para saborear as iguarias criadas a partir dali. Política? Nunca mais. Presidir reuniões e formular decretos? Também não. Mexer com bicho é coisa complicada. Planta é muito melhor! Foi esta a dita decisão que obrigou o Conselho a organizar tal solenidade.
Os bichos inscritos foram: O Leão, o tubarão, o pato e a águia.
Feitos os discursos iniciais, apresentados os jurados e lidas as regras pelo Juiz das provas, deu-se início aos jogos. A primeira prova consistia em saber quem era o corredor mais veloz. Nesta prova o tubarão foi desclassificado. Não conseguia sair da água para participar da disputa. O leão venceu com folga a prova, ficando em primeiro lugar. O pato, meio desjeitoso conseguiu o segundo lugar. A águia ficou na lanterna. A segunda seria a prova do nadador mais rápido. O tubarão conquistou o pódio, o pato ficou em segundo lugar. Na água ele era mais eficiente e menos deselegante. A águia foi desclassificada e o terceiro lugar ficou com o leão. Na terceira e última prova a bicharada ficaria sabendo quem dentre os competidores voaria mais rápido e alto. A águia com já era esperado, deu um show de performance. Voou lindamente para o alto e avante. Beleza, ligeireza e altura (preferia a expressão “alteza” para brincar de rima, até porque o que deseja o candidato, é o tratamento dado à realeza) bem, mas voltando à competição o leão e o tubarão foram sumariamente desclassificados da terceira prova e o pato, bateu suas asas e voando raso, ainda que um pouco desmantelado, ficou em segundo lugar.
Findo o torneio, iniciaram a contagem dos pontos e qual não foi a admiração de todos ao ouvirem que o título era do pato. Não foi o primeiro em nenhuma prova. Sujeito meio desingonçadão, distraído quase sempre e vez por outra ainda caindo “como um pato” nas armações de algum bicho velhaco. Não reunia habilidades excepcionais, levava a vida (male male, em bom Italianez).Cada competidor tinha uma habilidade exemplar a qual, executava prodigiosamente, porém não tinha aptidão para desenvolver outras. O nosso novo rei nunca havia experimentado o pódio. Não era o primeiro em coisa alguma, mas fazia o seu fazer da melhor maneira que conseguia e seguia em frente.
Nunca pensei até agorinha ouvindo o tal causo, que me daria por satisfeita na pele (ou pena) de pato. Nunca fora de fato o bicho pra mim mais atraente. Doravante vou levando a minha vida de pato tentando ajeitar meus desajeitos, buscando acertar meus passos pesados e oscilantes, meu bater de asas curto, meu nado nada tão gracioso, mas persistente, reunindo alguma competência. Depois descobri já me sentindo da família, que ele é um dos animais que conseguem dormir com metade do cérebro e manter a outra em alerta. Verdade? Não sei “Só sei que é assim (como escreveu Suassuna).
Adaptação de uma História que ouvi por aí e me encabulou.
Valéria Matos Escobar 22/03/19