FUGINDO DO CAMINHO
FUGINDO DO CAMINHO
Eu vi uma criança
Que ao nascer estava chorando
E tremendo de frio e de medo.
Medo de tudo.
Tudo novo, diferente,
Frio, feio, apavorante.
Eu vi a criança crescer agasalhada do frio,
Perdendo o medo,
Acostumando com tudo,
Querendo coisas novas,
Coisas quentes,
Coisas bonitas, atraentes.
Eu vi a criança
Progredir: engatinhar, caminhar,
Correr pela casa e pela vida,
Aprender a falar,
Antes aprendeu a sorrir,
Antes aprendera a chorar.
Eu vi a criança
Fazendo amigos, brigar com inimigos,
Aprender as letras,
Atirar pedras,
Jogar bola e a pegar carona.
Em fim fazer tudo que criança faz.
Eu vi a criança
Brincar de carrinho,
Fingindo ser, ( ou sendo?) piloto,
Dizendo que ia ser engenheiro
Afirmando que ia conhecer o mundo,
E construir prédios e pontes.
Eu vi a criança
Deixando de ser criança,
Cada dia indo mais longe
De casa e no saber.
Aprendendo tudo, nem tudo bom,
Aprendendo com todos, muitos maus.
Eu vi a criança,
Agora adolescente, bonito, alto, esguio,
A olhar sorrateiro
A mocinha passante,
Piscando-lhe um olho atrevidamente,
Com o desejo pulsando-lhe o corpo.
Eu vi a criança
Depois que depois tornou adulto, grande,
Enveredando caminhos tortos,
Fugindo aos anseios dos pais,
Fazendo muitas coisas erradas,
Coisas que gente de bem não faz.
Eu vi a criança
Agora adulto cheio de erros.
O mundo que lhe abriu os braços
Hoje lhe fecha as portas
Estreitando seus caminhos
E abrindo-lhe poucas esperanças.
Eu vi a criança
Agora crescida, grande,
Pelos cantos, agressiva, briguenta,
Esquecendo que fora criança,
Esquecendo de sonhar e o que sonhara
E que os sonhos de criança ainda a esperam.
Eu vi a criança
Que brincava de carrinho
Que “era” o piloto perfeito
Que hoje tromba os carros
E não somente os carros,
Mas também na sorte e na vida.
Eu vi a criança
Que seria engenheiro,
Que conquistaria o mundo.
Onde estão suas pontes?
E suas conquistas, onde estão?
Será que é o fracasso que o conquista?
Eu vi a criança,
Criança que cresceu muito
Que eu gostaria de fazer voltar.
Voltar a ser pequena e a sonhar,
Começar tudo de novo,
Já que seus sonhos não tiveram vida.
Eu vi a criança
Que crescera errando e se escondendo.
Sem AMIGOS que lhe queiriam,
Sem bons caminhos a seguir.
O corpo debilitando,
Os motivos para viver diminuindo.
Eu vi a criança
Agora adulto, jovem mas doente
Doente menos do corpo e mais da moral.
Vamos, abra os olhos, os braços, o coração!
Aceite o amor dos pais e da gente.
Principalmente de Deus que o quer.
Nota:
Fiz para um sobrinho, em 14 de junho de 1988.
Era dependente químico.
Poucos anos depois se enforcou.