SONHOS DA MADRUGADA
Meu amor adorado: é madrugada... O céu ainda está escuro; há um perfume de orvalho no ar... Meus olhos te procuram... Dormes, certamente. Em uma cama que não é a nossa... Ao lado de uma mulher linda que te faz companhia!... Talvez teus braços apertem o seu belo corpo junto ao teu... talvez... a beijes com teus beijos doces, que um dia, por algum tempo, foram meus... Talvez a estejas amando como me amaste um dia... Meu coração sangra pela dor da ausência e da saudade... Sou um "pássaro ferido"... Somos "pássaros feridos?"... Ou apenas “eu o sou”?...
O perfume da noite entra pela minha janela... Com ele as lembranças de outros dias... Quando teu passo firme vinha rápido ao meu encontro... Não é ciúme, é a constatação de minha impotência diante de fatos que nem a força do meu amor pode alterar... Espero pacientemente... A Esperança não me abandona! No meio da noite surgem os fantasmas e as lembranças de outros dias... Tua voz vinha no vento, nas estrelas... Teus beijos recendiam à poesia... Nosso encontro era um encontro do verdadeiro amor, da completude, de nossas almas e corpos imersos em um só... Música suave se fazia ouvir e o tempo passava rápido demais... E tu ias... e voltavas!! Mil "desculpas" te traziam!...
Agora restam meus sonhos... E a vontade de viver, de reviver nossas lembranças, de lembrar um amor que nasceu tão “de mansinho”, quase imperceptível... E que, por estranhas forças do destino, hoje te afastou de mim... Não estás mais comigo!... Sofres... Acredito que sim!... Mas sinto que te afastas, que estás mais distante, mais formal quando, por necessidade ou acaso, nos encontramos... Eu represento perigo para tua segurança, apesar de nossa completude!... Mas tu estás certo: jamais te iria condenar! Porém é impossível esquecer os momentos vividos, tão ternos, com um sabor de infinito... Os momentos de amor quase divinos, que deixaram sempre um gosto de "quero mais..."
O “passado” se torna presente: vôo pela minha janela e te arrebato do teu leito e voamos juntos em busca das estrelas, das estrelas que brilhavam em nossas mãos, das luzes de arco-íris que me trazias em teus beijos e em teu olhar sorridente e macio, onde eu podia mergulhar confiante, em toda a minha nudez... Ofertando-te o "pouco que sou", mas te ofertando tudo, toda a minha vida, de modo pleno e total...
Hoje estou só... Mas tua lembrança constante está comigo! Minha cama, que um dia foi "nossa", é grande demais para mim... Os lençóis muito alvos... Tornam-se úmidos, não da umidade da entrega de nossos corpos em comunhão sagrada, mas pelas lágrimas que derramo na minha solidão... Eu te busco...e tu não estás comigo...
Preciso do travesseiro do teu braço e da ternura dos teus abraços, para dormir outra vez!!... Minha vida tem sede de tua voz sussurrando "eu te amo!" ao meu ouvido!!... Da tua voz, que me transportava ao tapete verde da relva, onde, em sonhos compartilhados, nos amávamos como ninguém antes amou... A natureza, em toda a sua exuberância, era nosso leito e o Céu nosso teto, salpicado de estrelas que buscavas e as depositavas com teus versos em minha mão!... Que saudade de ler tuas poesias impregnadas pelo amor mais puro, e que, ao mesmo tempo, era pureza e era paixão... Saudade do teu abraço firme e macio, aveludado como pétalas de rosa muito rubras e orvalhadas... Saudade da segurança que eu sentia em teus abraços!... E o tempo sempre correndo vertiginosamente, e com frieza e sarcasmo dizia: "É TARDE!!" E te afastava de mim... Mas eu ficava com a sensação de que "não ias", pois tua presença impregnava meu corpo e alma, e a "nossa casa" ficava “cheia de luz..." Meu perfume ia contigo, meu sorriso, meus beijos, minhas palavras de amor... "Eu" ia contigo...
Quanto tempo se passou?... Anos?... Meses?... Dias?... Não sei mais, faz tanto tempo, mas todos os mínimos detalhes estão bem vivos comigo... Eu te ajudava a vestir o casaco; arrumava, vaidosa, a gola de tua camisa, ajeitava tua gravata e dizia: "Quero que sempre estejas bonito, meu amor! Mais um beijo... Mais um beijo antes de abrires a porta!..." E tu satisfazias, com carinho e paciência, meu capricho, com um beijo de despedida, mas que, na realidade queria dizer: “Já volto!!..." E eu te esperava e tu voltavas... Um dia, eu lembro, chegaste cansado, e fiz uma longa massagem nos teus pés para que descansasses... Estavas tão lindo, parecias dormir...
Como era bom ficarmos abraçados, atravessados na cama, como dois adolescentes, a falar de amor entre beijos e carícias...
São muitas as lembranças porque muito grande é a saudade!... Faz tanto tempo... Quantos invernos e quantas primaveras já passaram...
Um dia, tu não voltaste. Eu esperei, esperei e esperei...Acendi o fogo da lareira, preparei o licor que mais gostavas, coloquei o perfume que adoravas... Mas tu não vieste. A noite foi fria e foi imensa... Não vi quando as chamas deixaram de crepitar. Quando olhei, só vi as cinzas... Na cadeira que sentavas te esperei... Ouvi, ao longe, o uivo de um lobo muito só, que buscava talvez sua companheira... Mas os caçadores tiraram a vida de sua loba pela mesquinhez de ficarem com sua pele... E o lobo estava só... Porém, em sua dor (era o responsável pala matilha!) não podia chorar muito o seu luto... Tinha de retomar a vida...
O inverno terminou e chegou a primavera; folhas verdes bailavam nas árvores, a grama voltou ao chão e a neve se foi... Mas continuava a nevar no meu coração... As flores, em profusão, enfeitavam os campos, a relva era de um verde brilhante, convidativo para o amor... Mas eu estava só, imóvel, absorta... Para mim ainda era inverno...
O verão chegou. O sol dourado incendiava em sua alegria... Mas nos meus olhos só havia a saudade daquele inverno distante... Veio o outono. Com o outono eu fui até a janela e vi as folhas avermelhadas balançarem e, docemente, caírem até o chão, onde os transeuntes as pisavam descuidadamente... (Não percebiam eles que as folhas tinham sentimento? Não se davam conta que as folhas eram minhas lágrimas caindo pelo chão?... Insensíveis! Nem ao menos uma, observaram! Se as tivessem observado veriam que não eram apenas “folhas secas”, eram “folhas que tinham sido verdes!”, e agora eram minhas lágrimas que tombavam para o chão, de mansinho, de modo muito suave, sem alarde, como carregadas pelo vento, fazendo leves ondulações... Até irem para o nada...) e todas foram pisadas... grosseiramente... grotescamente...
Veio um novo inverno e se sucederam as estações... Eu sentia frio... Muito frio... Lembranças doces despertavam um frágil sorriso que logo se desvanecia... Longa espera...
De repente, um dia... te vi. Eternamente jovem, vinhas alegre e sorridente, de mãos dadas com uma linda mulher!... Tu não me viste, ou não me quiseste ver... Desciam uma ladeira, coberta de grama verde e tu a amparavas... E eu percebi o quanto eu estava só, tremendamente só...
Tirei meu luto. Este desfecho já era previsível. Eu me vesti de verde, cor da esperança, e fui atrás das esmeraldas escondidas no seio da terra... Mas não foi lá que as encontrei! Encontrei nas folhas verdes, nas folhas da Vida... E as lembranças voltaram e o sorriso brotou novamente, transformando tudo em verde, tudo em vida, tudo em cor! Tu não estás comigo, mas lembranças lindas me alimentam! Posso “re-viver”! Posso apagar as cenas tristes e substituí-las por todos os momentos bons... Dentro de mim pode ser eterna a primavera!...
Tua cadeira, aquela em que sentavas, continua vazia, te esperando... “Nossa” cama continua com lençóis de seda, muito branca, bordada a ouro e prata como os fios dos meus sonhos... E continua te esperando... Tu não vens. Mas tu estás sempre comigo!! Meus dias voltam a ter sol e o colorido reina ao meu redor! Vivo! E “re-vivo” na esperança! Não na esperança de que voltes, mas na certeza de que não me esqueces, porque nenhuma mulher te amou como eu te amei, e ninguém amou de um modo tão completo como nos amamos... Meus dias, agora, são tranqüilos, cheios de vida e sol...
Mas quando chega a noite... Percebo que estou sozinha em minha (“nossa”) cama... A cama é grande e eu me perco nela... Porque tu não estás... Mas sou feliz: tenho o que lembrar... E, tenho certeza de que nos teus sonhos, eu estou também contigo!
Do nosso breve período de convivência ficou esta saudade imensa, mas ficou também o encontro com a Felicidade, saber que esta existe e é possível... Pelo menos "por algum tempo..."
Tu "sempre estarás comigo", e eu contigo! Estamos "distantes”, pelas contingências da vida, “mas sempre perto!..."...e ao "re-viver" nossas lembranças, minha tristeza vai embora... Fica só a nostalgia... A nostalgia do "paraíso perdido..." Dos momentos mais lindos que já vivi!
Outro dia agora amanhece: não é mais hora de sonhar!... É hora de acordar para a vida que nos espera, com a realidade do “hoje”, com suas alegrias e/ou seus dissabores... O devaneio irá ceder seu lugar e aguardar até a outra madrugada... E aí, livre das amarras que nos prendem, irei aonde quer que estejas para te buscar, acompanhar e amar... E sei que tu, em sonhos, tu virás comigo, pois nenhuma mulher te amou como te amei...
Está lindo o amanhecer! O novo amanhecer de um novo dia...ao qual se seguirá uma nova noite, onde, liberta da realidade, eu poderei outra vez sonhar... E te buscar para junto de mim!... Nos meus sonhos, "para sempre!..."
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