Kierkegaard, Shiva e Nietzsche: A Dança de Fé

A fé, dizia Kierkegaard, é um salto. Um instante de coragem que nos lança sobre o abismo, onde a razão hesita e a alma treme.

É no vazio que ele encontra o eterno, no desconhecido que descobre o divino. O salto é brusco, um rasgo no tempo. Mas será que basta saltar? Será que, ao atravessar o abismo, ficamos suspensos, imóveis, aguardando um desfecho que nunca vem?

E se a fé fosse mais do que um instante? E se, ao invés de um salto, fosse uma dança?

Shiva surge, os pés descalços tocando a terra com a leveza de quem conhece o cosmos. No Tandava, sua dança eterna, ele cria e destrói, ri e chora, começa e termina. Não há começo sem fim, nem fim sem começo — só o ritmo pulsante da vida, fluindo como o vento entre as folhas. Shiva não salta; ele gira, desliza, e com cada movimento, celebra o que é e o que será.

Dançar é mais do que mover-se. É ouvir o que não pode ser visto, sentir o que não pode ser tocado. É abandonar o medo de cair, porque o chão, como a fé, está sempre em transformação.

Nietzsche, do outro lado do palco, observa. "Eu não poderia acreditar em um Deus que não dançasse", ele diz, com um sorriso que ecoa pelo salão do tempo. Para ele, a vida é ritmo, caos, criação. Aqueles que dançam — ele avisa — serão vistos como insanos por quem não ouve a música. E que importa? Só quem dança sabe o que é ser livre.

A dança de fé não é um salto, nem um destino. É o movimento constante entre dúvida e confiança, entre o que somos e o que poderíamos ser. Não há final nem resposta — apenas o convite para continuar.

E assim, Shiva, Kierkegaard e Nietzsche dançam juntos. O salto se transforma em giro, e o abismo, em pista. A música é invisível, mas está lá, chamando-nos para o centro, para o eterno agora.