Adágio
... não falavas, não sorrias, ressonavas com os olhos cerrados, teus olhos cerrados em mistério e luz, tua boca entreaberta em finos sopros de hálito quente, teu relevo na penumbra tremula dos meus olhos abertos, teu corpo tão feito de sol aquecia meus poros cristalizados de lua... eu via a lua por trás do teu corpo, eu via a noite lunar passando em teu rosto, entrando na casa dos nossos signos, minha ânfora ancorada no teu braço, o teu abraço guardando minhas noites claras... eu te disse que eu era noturna... te contei o sonho que me fez acordar, te contei dos corais nas minhas cordas e adormecias enquanto eu cantava... o meu adágio em teu corpo... e dormias tão cedo, dormias no início do meu segredo, dormias por mim e eu recolhia minhas mãos à boca arrastando o silêncio com meu suspiro, eu soprava o medo de te acordar e vigiava teu peito, teu jeito de respirar, eu respirava as horas suspensas no ar e aspirava o perfume lento que saía do teu corpo mudo em música e sonho recostado no corpo da noite que me faz companhia... eu te digo que sou noturna, que às vezes sou bruma, sentimento, que choro por dentro todo dia, que molho a chuva com minha lágrima seca e fecho os olhos na tua ausência...