Simplesmente Deixa o Barco
Por muito tempo acomodamos nosso ser em um semovente.
Navegamos por mares, adentramos em rios e em seus afluentes.
Até que chega um dia que não dá mais, o barco torna usado, obsoleto como embarcação para levar ao prazer e à satisfação. Vida a quem conduz.
Na roupa de um rei, de um mendigo, de um anfitrião de festas, provedor de paz, de palavras de conforto, de ouvinte, no que sabe, ou no papel de um idiota qualquer.
Chega o dia da despedida, do deixar de ser em um personagem.
Vai-se adiando a ida, vai-se enrolando no papel.
Vai ficando pesado demais representar, vai ficando pesado demais ser nele. No barco inútil para a satisfação.
Quando o ser se apruma, numa manhã qualquer, ou na noite sem lua, quando sai da navegação, decidido, não olha para traz. Sai.
Como resultado da escolha, vai embora sem as roupa, nu.
Ficam os passos na areia.