Em silêncio como deveria ser naquela ocasião
os nervos tremem mesmo depois de alguns goles de cachaça
o vento sopra por entre as frestas do portão
Lá dentro silêncio funesto
vela, ataúde no centro, sentinela
a imensa chaminé da fábrica onde um dia trabalhou o defunto lança fumaça na lona breu do céu
o corpo do desempregado jaz
A espera da última reza
os enlutados seguram o rosário;
fumo de tabaco suspenso no ar
Alguém pergunta: de que morreu este defunto?
- de desgosto, de cólera, de ódio, amargura. Não agüentou a pressão!
Da vida amarga que levava, das incertezas que em si carregava, dos desgostos que aos poucos foram lhe tomando, do desespero por achar ter desempenhado mal seu papel de homem, pela cachaça que engolia feito água, fuligem de tabaco aspirado que se alojou em suas reentrâncias, desejo de um dia ser o que nunca teve chance de ser
Falência múltipla da vida - suicídio!
Agora nos dê licença, Pai Nosso que está no céu, santificado seja... Ave Maria cheia de graça...
Sai dali embebido do ar funéreo
o cheiro das rosas ofertadas ao féretro penetram em suas narinas;
Leve brisa lhe leva não sabe aonde;
lembra de um trecho de um poema russo que sussurra ao vento:
" A infância dos tempos cessa.
verás. E o vento radiante,
O pó das torres supressas;
por tiros de longo alcance"